Tudo flui
Tudo flui. Escorre até pelas mãos mais largas, foge pelas brechas, contorna o que o faz permanecer, porque tudo simplesmente flui. E tudo aquilo que banha é levado, afundado ou encharcado, distanciado por uma correnteza infinita e em algum momento desaparece da vista de quem se salva na margem. E para quê se prender àquilo que um dia some no horizonte? Sentir falta daquilo que esteve dias à nossa frente, mas nunca esteve de verdade conosco? Tudo um dia se vai, um dia a gente perde, em dia nenhum o tivemos. E quem se arrisca a aventurar-se em busca de manter algo que flui constantemente, sempre se afoga. Mas flui em um único sentido, e nada chega à contra mão, nunca mais entraremos naquela mesma água, nunca mais seremos quem somos, nunca mais teremos o que temos nem veremos o que vemos. Porque seguir significa deixar algo para trás, significa, na verdade, deixar tudo para trás e encontrar coisas diferentes. Mas essa ideia de continuidade implica na ideia de perda, porque para que a vida siga seu fluxo, algo precisa acabar. Mas nesse grande rio nada volta, não tem refluxo, só uma única ida, só e somente deixas. Tudo flui, tudo muda, tudo acaba. Tudo um dia será aquilo que nunca foi.