COMO II
Como ter sem saber que tenho.
Como ser sem saber que sou
verdadeiramente.
Como dar sem que a isso só me agarre.
Como gritar ao vento sem que uma
única voz se faça ouvir.
Como cão sem osso jogado no deserto.
Como amar sem ser amado.
Como longe na distância mas perto do
coração.
Como o silêncio ensurdecedor de quem
morre por dentro.
Como a ilusão nas mãos da razão.
Como a liberdade roubada a uma esquina.
Como a natureza em perfeita
sangria sendo malquista pelos poderosos.
Como a criança que cresceu depressa
demais.
Como a fobia e o vício nos olhos
de um adolescente.
Como o vinho para curar todas as dores,
de mais um dia de exploração no trabalho.
Como trabalhar de sol a sol sendo
espancado pelo patrão.
Como a mulher de mil sevicias se calando.
Como sendo violada e ultrajada ante
o seu bom nome.
Como o bebé que morreu prematuramente.
Como o choro e o grito dos que
há muito perderam o senso comum.
Como que explicar-me e ninguém me
entender.
Como morrer por asfixia na sobredosagem
da eterna solidão.
Como um jardim sem flores.
Como dizer bem alto NÃO ao passado.
Como sofrer as dores de quem não
se reconhece mais.
Como quem caminha sem saber qual
dos lados escolher.
Como apelar a todos os sentidos
para afastar os maus presságios.
Como ser o povo que luta diariamente
para se realizar.
Como ser a poesia esquecendo-me de mim.
Jorge Humberto
10/10/09