Um corte de cabelo
Hoje cortei meus cabelos. Quem cortou foi um cabeleireiro chamado Wilson, um senhor calvo de rosto expressivo, calmo, óculos e bem trajado, observou-me e catou duas ou três sugestões minhas sobre o corte, e analisou e mandou ver, logo na metade do corte me disse:
Se você pentear seu cabelo ao lado contrario, vai ter menos problemas em arrumá-lo afinal o rede moinho natural de seu cabelo, tem o caimento a direita e não a esquerda.
Fiquei intrigado com aquilo, afinal, era eu que deveria saber disso, não é? Pois bem, era verdade, bastava pentear ao contrario que pronto, o cabelo estava arrumado. Vocês fazem idéia de quantos anos foram usando escova, gel, molhando, arrumando e ainda sim sair do espelho um pouco insatisfeito por um tufo de cabelo que ficava em pé contra a fabulosa lei de Newton. Tudo bem, me adapto fácil a novas situações, quem dirá a um penteado, ou caimento contrario no cabelo. Mas pensem bem, fazemos isso com toda nossa vida, e por vezes períodos mais longos que trinta e dois anos, nos vendo nos espelhos da vida, levando e empurrando tudo, usando as mesmas roupas, ouvindo as mesmas musicas, tendo as mesmas idéias, olhando aquele rosto seco e vazio, sem nada fazer, sem nenhuma atitude, sem nada, sem perceber que basta mexer em tão pouco para tudo mudar, tão nada, tão fácil e providencial, não, não enxergamos, deixamos o outro caminho ali, jogado ao lado contrario, com o tufo que incomoda, que fica no meio da estrada, que atrapalha tudo, que interrompe os caminhos certos, ou errados, quem saberá.
Quanto tempo, passei com a solução ali, em minha frente, neste caso acima de mim, e nada fiz, mas hoje, um novo dia, cortei meu cabelo, e nas palavras do homem que em minutos resolveu minha vida toda de trinta e dois, dali para frente, tudo ia ser diferente, tudo se encaixou melhor, tudo deu certo, tudo, tudo, agora, um homem novo, com o penteado ao contrario, decidi pegar os caminhos diferentes, sem tufo, nem nada, mais nada.