Garoto
Tão garoto... Olha pra mim, depois de muito insistir, aclamar, pedir sem relutância, seus olhos profundos e forçados, pedindo uma gotinha de pena, esperando por uma desistência. Esperando convencer meus olhos de seguir os seus. Mas é tão esperto...
- Vamos, Garoto, vamos jogar cartinhas. Quer levar esse jogo? Então espera, vou te levantar e você pega. Pula, no três, um, dois... Calma! Só no três... e já.
Sai correndo, vamos lá para baixo, vem gente, o garoto tá chamando...
Chega lá embaixo, joga o jogo, joga as cartas, trapaceia um pouco e, quando passam-se dez minutos, surge novamente o olhar tedioso e pidão.
- Gigi, vamos subir?
- Mas já? Ah, Garoto, agora espera, acabamos de descer.
- Quero fazer xixi.
- Faz ai na plantinha.
- Mas depois quero ver tevêlizão.
Claro que ele queria subir.
- Eu não vi hoje ainda.
O argumento fajuto não convence ninguém, mas o bombardeio de olhares e caras e bocas e sombrancelhas e testas enrrugadiças convencem qualquer um a abandonar a batalha.
- Vai e grita que horas são pra mim.
- Vem comigo!
- Não, vai lá e me diz.
Subindo correndo, depois de perguntar à moça que trabalha dentro da casa, grita que são onze e trinta e cinco. Com um pouco de dificuldade, ele ainda embola um pouco a língua.
- Tô com fome! Muita fome!
Está bem, garoto, já subo.
Vinte minutos esquentando a comida e fritando as batatas foram o suficiente para ele, sentado na mesa, devorar a batata, deixar a comida de lado e vir sentar no meu colo, olhando fundo nos meus olhos, com o som da TV lá atrás.