REIS E RAINHAS
"Palavras não têm paz. Que poetas são esses que as tranqüilizam?"
BENILTON CRUZ
Perdão, se minhas palavras desconstroem,
se elas cortam quando deveriam acariciar,
se elas matam quando deveriam erguer a vida;
perdão, se sou autêntico no meu Reino de flechas
e punhais abertos em presas de serpentes...
Perdão, por ser sincero fora de meu reino
em outros recantos de luas caiadas por noites,
por Passos de sombras aladas dos estranhos.
Perdão...
O meu arco de chumbo corre sobre túneis escavados
no quintal da esperança nas horas mais finas,
túneis escuros da cor dos olhos do vento:
quando a lua foge para gozar o padecimento de ter luz;
eu não tenho nada e mesmo o nada que penso ter
é incerto feito a certeza da cegueira que fere quem ama com palavras;
não sei amar assim — perdi-me fora das malícias deste engano,
no Reino das torres que se erguem para o interior da terra.
Perdão...
O meu coração de risos compridos e largos,
um coiote de névoa e luz o roubou, o levou
para as terras onde nem sequer há a convenção
da verdade... Onde rios são areias e o vento,
flechas envenenadas atiradas por mãos de pedras.
Dias perdidos nas costas das horas caminhantes,
terras ermas que fiz dos presentes santificados
que ousei deixá-los para encontrar o desconhecido...
Saudades daqueles dias que as imbaúbas davam sombra,
que as jurubebas me abraçavam com seus espinhos
sem que houvesse qualquer ferimento no meu corpo virgem,
sem que houvesse corpo, mágoa ou dor humanizada...
Hoje o que tenho afasta-se desta convencional humanidade;
sou fino, torto, calado: acabrunhado pelos outros
que se dizem Supremos Humanos — Deuses Senhores —
Reis e Rainhas de ouro e carmesim nos pés:
Ser gente é demais para mim!