UM MISTÉRIO TERRIFICANTE
UM MISTÉRIO TERRIFICANTE
Rangel Alves da Costa*
Havia estado numa biblioteca com um amigo quase a tarde inteira. Tinham ido até o local para ver se terminavam uma pesquisa sobre os crimes mais intrigantes da história. Estavam escrevendo uma tese sobre isso.
Cansado, chegou em casa por volta das oito da noite e se jogou no sofá. Meia hora após o telefone começa a tocar insistentemente. Pensou em não atender, até desligar, mas não resistiu a mais um toque e se pôs a atender.
No outro lado o amigo estava aflito, numa indescritível agonia. Com a voz entrecortada de medo e aflição, pedia socorro ao colega e dizia que alguém havia saído de um livro e o estava perseguindo para matar.
Desligou no mesmo instante, sem ao menos dizer nada. Só poderia ser brincadeira de mau gosto e àquela hora não estava pra suportar esse tipo de coisa. Mas o telefone começou a tocar muitas outras vezes.
Era o mesmo amigo, sabia pelo número mostrado na ligação. Atendeu apenas para lhe dizer uns desaforos, falar que deixasse e brincadeira e fosse procurar o que fazer. Contudo, não disse uma palavra sequer depois de ouvir gritos do colega afirmando que o bandido saído do livro já estava ali para lhe matar. Que ele o socorresse, pelo amor de Deus!
Em seguida ouviu o telefone cair e emudecer. Mas antes de silenciar ainda conseguiu ouvir gritos pedindo socorro, socorro e mais socorro. Recostou o telefone na banquinha e se virou de lado, pensando no que fazer amanhã.
A primeira coisa era telefonar para o colega e dizer que não suportava aquilo tipo de brincadeira, que ele não fizesse mais isso sob pena de a amizade ficar abalada. Afinal, telefone é coisa séria, só deve ser usado na necessidade, e não pra estar se agourando, dizendo que o estão perseguindo, querem lhe matar ou coisa parecida.
Depois das duas horas da manhã o telefone tocou novamente. Olhou no visor e não havia qualquer número indicando de onde partira a chamada. Resolveu não atender e o colocou no local. Novos toques, agora mais persistentemente.
Resolveu atender. Bem poderia ser uma namorada solitária àquela hora. Mas não, era seu colega dizendo tranquilamente que o bandido saído do livro tinha conseguido lhe acertar e agora ele estava morto. E o pior: se quisesse vê-lo ele estaria na rua defronte à janela do seu apartamento.
Não disse nada, apenas correu em direção à janela e pôde ver, entre o espanto e o medo, uma cena terrível: um corpo estendido no chão, iluminado pela luz do poste, com as mesmas características do colega. Com sangue espalhado pela calçada, a pessoa estava com a mesma roupa usada pelo amigo horas atrás.
Mas pensou que aquilo não passava de mais uma brincadeira macabra e de mau gosto do amigo. Não podia ser, não havia como um bandido de outros tempos sair de um livro para perseguir e matar uma pessoa somente porque ele estava pesquisando um crime cometido pelo mesmo. Nem Agatha Christie ou Dashiell Hammet acreditariam.
Fechou a janela, colocou o cortinado sobre ela e se encaminhou para o centro da sala. Já estava sem sono, não havia mais como tentar dormir. Mais tarde, se pudesse, iria direto pra cama. E ouviu o telefone tocar novamente. Já não sabia o que fazer mesmo nem acreditar mais em nada, tratou de atender a chamada.
Era o amigo e dizia que estava morto mesmo, como ele havia percebido no corpo lá na calçada, mas o bandido do livro já o havia tirado de lá e agora estava na sua porta de entrada. Bastava abrir um pouquinho e encontrar o corpo deixado lá. Meu Deus, isso não é possível, devo estar enlouquecendo!
Correu novamente para janela e olhou. Restavam apenas as marcas de sangue, porém o corpo já havia sumido. Ainda virado para a rua ouviu uma batida na porta, mais uma e outra. Alguém estava ali fora e queria entrar.
Mas logo imaginou: se é o corpo dele que está lá fora, então não poderia estar batendo na porta, afinal estava morto. Então, quem seria? E uma ideia surpreendente, desesperada, lhe veio à mente.
Correu até a estante e pegou outro exemplar do livro que contava a história daquele bandido. Abriu bem nas páginas, dobrou-as e foi em direção à porta, cuidadosamente. Mais um toque e resolveu abri-la logo de uma vez.
Quase cai pra trás quando o bandido de outros tempos foi logo empurrando a porta e entrando, como se vivo estivesse. Com olhos fantasmagóricos, fixou seus olhos de uma profundidade esquisita no olhar do rapaz e disse: Prometa que contará a história verdadeira e seu amigo retornará ao mundo dos vivos. Sou inocente, procure saber e reconte minha história.
Então rapidamente o rapaz abriu a página no capítulo inicial sobre a história dele e onde estava escrito Billy Bad, o Sanguinário, riscou por cima com uma caneta e abaixo escreveu Billy Bad, o Inocente.
Ia mostrar ao homem do outro mundo, porém o mesmo desapareceu assim que percebeu o reparo feito. Em seguida ouviu uma voz conhecida dizendo que o ajudasse a levantar dali porque parecia que havia bebido demais.
Poeta e cronista
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