Protegidos no Meio da Fornalha

No verso 10 do capítulo 18º de I Samuel, que estaremos comentando, é dito que Saul começou a profetizar no meio da casa quando um espírito maligno da parte de Deus se apossou dele.

Em outras versões, em vez de “começou a profetizar no meio da casa é dito que ele “teve uma crise de raiva em casa”.

A par de ter sido isso realmente o efeito da ação do espírito imundo nele, pois tentou encravar a Davi com sua lança na parede, o original hebraico traz a palavra nabe, que significa profetizar.

Não estava profetizando pelo Espírito Santo, como lhe fora permitido na ocasião em que foi ungido por Samuel, e nem como o viria a fazer depois, como se relata em I Sm 19.23,24.

Mas aqui, ele estava profetizando pelo espírito maligno, e isto indica o quanto estava debaixo da influência daquele espírito, a ponto deste falar por intermédio dele.

Certamente o teor daquelas palavras que o espírito maligno falou através dele não era nenhuma bênção, senão blasfêmias e mentiras, como é comum ocorrer com aqueles que são possessos de espíritos malignos.

É importante que fiquemos com a tradução do original, que diz que profetizava pelo espírito maligno, e não simplesmente o efeito disso, que foi o seu acesso de raiva, porque isto indica de um modo bastante claro, que a par de todo o lugar que Saul dava ao maligno, era o próprio espírito imundo que estava tentando dar cabo da vida de Davi, não apenas porque este o expulsava de Saul, quando dedilhava a sua harpa e louvava a Deus, como também pelo fato de tentar impedir que Deus viesse a fazer tudo o que faria para o progresso do Seu reino, através da vida de Davi.

Aqueles que servem a Deus do modo fiel como Davi o serviu, devem estar preparados para estes ataques que o diabo desferirá contra eles, na tentativa de interromper a obra que o Senhor estiver fazendo através deles.

O modo usual de Deus proteger o Seu povo é em meio à fornalha, assim como se deu com Sadraque, Mesaque e Abdnego, e como também bem o exemplifica a vida de Davi.

Os servos de Deus devem estar preparados para lutarem contra todo tipo de dificuldades, e em vez disto ser motivo de tristeza, deve ser de grande alegria, conforme o dizer do apóstolo Tiago.

A Igreja deve ser devidamente instruída quanto a isto, porque a proteção de Deus não significa ser mantido por Ele, longe de todas as tribulações e problemas.

Ao contrário traz muita glória e ações de graças ao Seu santo nome os livramentos que Ele opera.

Como poderiam existir tais livramentos se não tivéssemos problemas que enfrentar, e que por meio da Sua graça e pela fé nEle os possamos vencer a todos, sendo livrados de todas as nossas tribulações?

Deus prepara um banquete espiritual para os Seus filhos, mas comumente o faz na presença dos seus inimigos (Sl 23.5).

O problema não é se estamos em meio a uma tempestade, mas sim, se Jesus não está no nosso barco.

Davi é protegido de Deus mas será encontrado muitas vezes se desviando dos golpes de lança que Saul desferia contra ele.

A sua luta não era contra a carne e o sangue, e de igual modo a luta do cristão também não é.

O diabo e todos os espíritos das trevas que ele governa, sempre se levantarão contra a alma do justo e tentarão impedir a sua caminhada para que o nome de Deus não seja glorificado.

E sabedor disto, o cristão deve sempre se levantar do seu abatimento, e confiar inteiramente no Senhor, enquanto estiver sendo submetido às fornalhas desta vida, sabendo que poderá fazê-lo, enquanto permanece na prática do bem, atendendo à exortação do apóstolo Pedro neste sentido: “Portanto os que sofrem segundo a vontade de Deus confiem as suas almas ao fiel Criador, praticando o bem.” (I Pe 4.19).

Ficar portanto, esperando por uma felicidade que signifique ausência de problemas e dificuldades na vida, é puro romantismo e isto nada tem a ver com a realidade do viver, pois este é lutar, e a tudo vencer por meio dAquele que somos mais do que vencedores.

Há uma armadura espiritual que Davi conhecia e que usava constantemente, não apenas no combate contra Golias e na defesa dos ataques de Saul, mas em todas as circunstâncias da vida.

Esta armadura espiritual tem os seus componentes descritos por Paulo no sexto capítulo de Efésios.

Devemos fazer uso constante dela para que possamos prevalecer diante de Deus e dos homens, nas batalhas que temos que empreender contra os poderes das trevas.

A Bíblia ensina que o bom ânimo é prometido por Deus àqueles que se disponham a lutar pela causa da verdade, o bom combate da fé na pregação do evangelho, estando dispostos a perseverarem em meio a toda sorte de tribulações e provações, porque o Senhor tem prometido livrar o justo de todas as suas tribulações.

Assim como fizera em relação a Davi, que enquanto permanecia na casa de Saul, caiu em graça aos olhos do seu filho Jônatas, que o amou como a si mesmo.

Este amor de Jônatas por Davi procedia de Deus, porque foi o Senhor que inclinou o seu coração a isto, para que pudesse ser um amparo para Davi, enquanto este estivesse não somente na presença de Saul e até mesmo quando fosse obrigado a fugir dele.

De igual modo, Deus levantará pessoas para serem bênçãos na vida de todos os Seus servos fiéis.

Vale a pena servir a Deus. O nosso trabalho nEle não é vão. Porque com isto temos a garantia de ter sempre a Sua proteção, ainda que como falamos, e a Bíblia o revela claramente, em meio a muitas tribulações.

É isto que nós vamos encontrar exemplificado em Davi.

Ele fala das angústias da sua alma, mas sempre afirma a sua esperança, que o Senhor tornaria a alegrá-lo.

Ele nunca se permitiu vencer pelos seus problemas e sofrimentos, pois sabia que Deus é maior do que tudo e pode salvar perfeitamente os de espírito oprimido (Sl 34.17, 18).

Até que recebamos a coroa da vida teremos que esperar e enfrentar muitas dificuldades e oposições, sabendo que para isto mesmo fomos chamados pelo Senhor.

“confirmando as almas dos discípulos, exortando-os a perseverarem na fé, dizendo que por muitas tribulações nos é necessário entrar no reino de Deus.” (At 14.22).

Assim, Deus estava preparando Davi para reger o seu povo, pelo seu aprendizado da obediência debaixo das circunstâncias mais adversas.

Ele foi obediente a seu pai, e agora estava sendo obediente a Saul.

Aqueles que irão governar devem primeiro aprender a obedecer.

Porque aqueles que são bons numa relação serão bons também na que lhe seja oposta. Daí se dizer que um bom filho virá a ser um bom pai.

Foi este espírito audaz e ao mesmo tempo submisso, forte e ao mesmo tempo doce, guerreiro e ao mesmo tempo gentil que fazia de Davi uma pessoa agradável aos seus semelhantes.

O modo como se houve perante Saul e Golias encheu a alma de Jônatas de uma grande admiração por ele, porque no próprio Jônatas habitavam muitas das qualidades que existiam em Davi.

Ambos tinham um caráter reto, mas Jônatas deveria renunciar, inclusive à coroa que lhe pertenceria por direito hereditário porque aprouve a Deus exaltar e honrar a Davi.

Por isso até mesmo no campo de batalha o Espírito do Senhor não veio sobre Jônatas para que enfrentasse Golias, e ele, valente que era poderia ter sido disposto a isto, mas deveria ficar parado porque aquela honra de vencer o gigante havia sido reservada por Deus a Davi.

Os grandes atos de Deus não podem ser portanto interpretados, como muitos costumam fazer, como mera obra do acaso ou da mera iniciativa dos homens.

Desde o dia que Davi venceu Golias, Saul o reteve consigo e não permitiu que retornasse à casa de Jessé, seu pai (v. 2).

E quando Saul pôs a Davi sobre tropas do seu exército, Jônatas, para ajudá-lo, lhe deu o seu próprio equipamento de guerra, a saber, a capa que vestia, sua armadura, e até mesmo a sua espada, o seu arco e o seu cinto (v. 4,5).

Como seria de se esperar, Davi era bem sucedido em todos os seus empreendimentos militares, e todo o povo de Israel estava muito satisfeito com ele, a ponto de as mulheres de todas as cidades de Israel terem cantado diante de Saul, quando Davi tinha sido bem sucedido numa batalha contra os filisteus, que Saul havia ferido a seus milhares, mas Davi a seus dez milhares.

Só que este elogio, em vez de fazer com que Saul se sentisse honrado por ter nas fileiras do exército de Israel a tão valoroso soldado, ele, como era de se esperar, conforme era da sua natureza, foi tomado de grande espírito de inveja, e desde aquele dia passou a ver Davi com suspeita, desconfiando que estava se esforçando daquele modo com a única intenção de lhe tomar o reino (v. 6 a 9).

Já no dia seguinte, em razão desta inveja e raiva de Saul, o espírito maligno que o atormentava encontrou facilidades para se apoderar dele, em razão de todo aquele seu descontrole, e ainda que Davi dedilhasse a sua harpa tentando afastar o espírito, Saul tentou matá-lo fazendo dois arremessos de lança contra ele, e caso Davi não tivesse se desviado dos golpes teria sido morto (v. 9-11).

Saul sabia que Deus era com Davi por tudo o que ele era e fazia, e também sabia que o Senhor lhe havia abandonado definitivamente (v. 12), e usando de uma estratégia política afastou Davi da sua presença, não permitindo que estivesse em sua casa, mas o manteve como capitão sobre mil homens do seu exército, e assim o teria sob o seu controle, debaixo de suas vistas, e poderia continuar se beneficiando do fato de Deus ser com Davi, ao mesmo tempo que não produziria nenhuma insatisfação no povo, o que ocorreria sem nenhuma sombra de dúvida caso o banisse completamente, e tudo o que se diz nos versículos restantes deste capitulo (14 a 30) consiste no estratagema político de Saul, para se livrar de Davi ao mesmo tempo em que disfarçava estar sendo favorável a ele.

Enquanto isto, ele ganharia tempo para formular uma teoria de que Davi era um traidor em potencial que queria lhe arrebatar a coroa, e assim poderia empreender uma perseguição direta a ele, como realmente o faria posteriormente.

Enquanto Saul conspirava contra a vida de Davi nós lemos o seguinte no verso 14:

“E Davi era bem sucedido em todos os seus caminhos; e o Senhor era com ele.”.

Tal como ocorria com a Igreja no seu início, que tinha paz, que vinha da parte de Deus, enquanto sofria dura perseguição dos judeus:

“Assim, pois, a Igreja em toda a Judeia, Galileia e Samaria, tinha paz, sendo edificada, e andando no temor do Senhor; e, pelo auxílio do Espírito Santo, se multiplicava.” (At 9.31).

Não importa quais sejam os inimigos do povo de Deus e da Sua causa, pois o Senhor sempre os conduzirá em triunfo, assim como fez com Davi, a par de todas as maquinações sórdidas de Saul.

O temor que se diz neste capitulo, que Saul tinha de Davi (v. 12, 15, 29), tem a ver com o fato de perder o reino para ele, em razão da grande afeição que o povo lhe devotava.

Agir diretamente contra ele seria portanto agir contra a sua própria popularidade, e isto fez com que não tivesse agido diretamente contra a vida de Davi no início.

Saul não havia cumprido, e provavelmente nem cumpriria a promessa que fez de dar ao homem que vencesse a Golias uma de suas filhas por esposa.

Saul não honrava sequer a própria palavra dele, e como poderia honrar a Palavra de Deus?

Tendo prometido dar a Davi a sua filha mais velha chamada Merabe por esposa, ele estava pensando em usá-la como uma isca, para que Davi morresse nas mãos dos filisteus, e não para cumprir a promessa que havia feito a respeito de quem vencesse Golias.

O plano seria o mesmo que usou para dar Mical, sua filha mais nova a Davi, pois exigiria que lhe trouxesse cem prepúcios de filisteus, contando que ele seria morto na batalha.

Entretanto, antes do prazo de colocar o seu plano diabólico em prática, Saul deu Merabe por esposa a outro homem, chamado Adriel (v. 17-19).

Mas como lhe contaram que sua filha Mical amava a Davi, decidiu levar o seu plano adiante, e usando de falsidade, pediu que dissessem a Davi que ele tinha afeição por ele e que todos os seus servos o amavam, e que gostaria que consentisse em ser o seu genro (v. 22).

Mais uma vez Davi se mostrou humilde, dizendo que era homem pobre e de humilde condição para ser genro do rei (v. 18, 21).

Como foi esta a sua resposta, que indicava que consentiria em se casar com Mical, Saul mandou lhe dizer que não queria nenhum dote pelo casamento, senão somente que Davi lhe trouxesse cem prepúcios de filisteus (v. 25).

Caso Davi não morresse nas mãos dos filisteus Saul ainda teria a vantagem, porque ao dar a ele a mão se sua filha Mical em casamento, dissimularia diante de todo Israel que não tinha nada contra Davi, e assim a sua teoria de conspiração teria muito mais chances de ser aceita pelo povo, em face da suposta afeição que ele tinha demonstrado, dando a sua própria filha para ser esposa de Davi.

Davi, juntamente com seus homens conseguiu não cem, mas duzentos prepúcios, e Saul lhe deu a Mical por esposa, e nisto ele reconheceu que o Senhor era de fato com Davi, e isto fez com que temesse ainda mais que Davi viesse a reinar em seu lugar, e se diz também no verso 29 que ele foi continuamente inimigo de Davi.

Como a fama de Davi ia crescendo cada vez mais, porque era quem lograva mais êxito nas batalhas contra os filisteus, tendo o seu nome se tornado muito estimado em Israel (v. 30), Saul decidiria partir, em desespero de causa, para o ataque direto, e viria a ordenar como veremos no início do capitulo seguinte que Davi fosse morto.

“1 Ora, acabando Davi de falar com Saul, a alma de Jônatas ligou-se com a alma de Davi; e Jônatas o amou como à sua própria alma.

2 E desde aquele dia Saul o reteve, não lhe permitindo voltar para a casa de seu pai.

3 Então Jônatas fez um pacto com Davi, porque o amava como à sua própria vida.

4 E Jônatas se despojou da capa que vestia, e a deu a Davi, como também a sua armadura, e até mesmo a sua espada, o seu arco e o seu cinto.

5 E saía Davi aonde quer que Saul o enviasse, e era sempre bem sucedido; e Saul o pôs sobre a gente de guerra, e isso pareceu bem aos olhos de todo o povo, e até aos olhos dos servos de Saul.

6 Sucedeu porém que, retornando eles, quando Davi voltava de ferir os filisteus, as mulheres de todas as cidades de Israel saíram ao encontro do rei Saul, cantando e dançando alegremente, com tamboris, e com instrumentos de música.

7 E as mulheres, dançando, cantavam umas para as outras, dizendo: Saul feriu os seus milhares, porém Davi os seus dez milhares.

8 Então Saul se indignou muito, pois aquela palavra pareceu mal aos seus olhos, e disse: Dez milhares atribuíram a Davi, e a mim somente milhares; que lhe falta, senão só o reino?

9 Daquele dia em diante, Saul trazia Davi sob suspeita.

10 No dia seguinte o espírito maligno da parte de Deus se apoderou de Saul, que começou a profetizar no meio da casa; e Davi tocava a harpa, como nos outros dias. Saul tinha na mão uma lança.

11 E Saul arremessou a lança, dizendo consigo: Encravarei a Davi na parede. Davi, porém, desviou-se dele por duas vezes.

12 Saul, pois, temia a Davi, porque o Senhor era com Davi e se tinha retirado dele.

13 Pelo que Saul o afastou de si, e o fez comandante de mil; e ele saía e entrava diante do povo.

14 E Davi era bem sucedido em todos os seus caminhos; e o Senhor era com ele.

15 Vendo, então, Saul que ele era tão bem sucedido, tinha receio dele.

16 Mas todo o Israel e Judá amavam a Davi, porquanto saía e entrava diante deles.

17 Pelo que Saul disse a Davi: Eis que Merabe, minha filha mais velha, te darei por mulher, contanto que me sejas filho valoroso, e guerreies as guerras do Senhor. Pois Saul dizia consigo: Não seja contra ele a minha mão, mas sim a dos filisteus.

18 Mas Davi disse a Saul: Quem sou eu, e qual é a minha vida e a família de meu pai em Israel, para eu vir a ser genro do rei?

19 Sucedeu, porém, que ao tempo em que Merabe, filha de Saul, devia ser dada a Davi, foi dada por mulher a Adriel, meolatita.

20 Mas Mical, a outra filha de Saul, amava a Davi; sendo isto anunciado a Saul, pareceu bem aos seus olhos.

21 E Saul disse: Eu lha darei, para que ela lhe sirva de laço, e para que a mão dos filisteus venha a ser contra ele. Pelo que Saul disse a Davi: com a outra serás hoje meu genro.

22 Saul, pois, deu ordem aos seus servos: Falai em segredo a Davi, dizendo: Eis que o rei se agrada de ti, e todos os seus servos te querem bem; agora, pois, consente em ser genro do rei.

23 Assim os servos de Saul falaram todas estas palavras aos ouvidos de Davi. Então disse Davi: Parece-vos pouca coisa ser genro do rei, sendo eu homem pobre e de condição humilde?

24 E os servos de Saul lhe anunciaram isto, dizendo: Assim e assim falou Davi.

25 Então disse Saul: Assim direis a Davi: O rei não deseja dote, senão cem prepúcios de filisteus, para que seja vingado dos seus inimigos. Porquanto Saul tentava fazer Davi cair pela mão dos filisteus.

26 Tendo os servos de Saul anunciado estas palavras a Davi, pareceu bem aos seus olhos tornar-se genro do rei. Ora, ainda os dias não se haviam cumprido,

27 quando Davi se levantou, partiu com os seus homens, e matou dentre os filisteus duzentos homens; e Davi trouxe os prepúcios deles, e os entregou, bem contados, ao rei, para que fosse seu genro. Então Saul lhe deu por mulher sua filha Mical.

28 Mas quando Saul viu e compreendeu que o Senhor era com Davi e que todo o Israel o amava,

29 temeu muito mais a Davi; e Saul se tornava cada vez mais seu inimigo.

30 Então saíram os chefes dos filisteus à campanha; e sempre que eles saíam, Davi era mais bem sucedido do que todos os servos de Saul, pelo que o seu nome era mui estimado.” (I Sm 18.1-30)

Silvio Dutra Alves
Enviado por Silvio Dutra Alves em 27/12/2014
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