Comentário de Romanos 2.14
Por João Calvino
"Quando, pois, os gentios, que não têm lei, procedem, por natureza, de conformidade com a lei, não tendo lei, servem eles de lei para si mesmos." (Romanos 2.14)
“Porque, quando os gentios, que não têm lei, fazem naturalmente as coisas que são da lei”. Paulo agora repete a prova da primeira parte da sentença, porquanto não se satisfaz em nos condenar por mera afirmação e em pronunciar o justo juízo divino sobre nós, senão que diligencia por convencer-nos dele por meio de argumentos, a fim de despertar-nos um grande desejo e amor por Cristo. Ele mostra que a ignorância é apresentada pelos gentios como fútil justificativa, visto que declaram, por seus próprios feitos, que possuem alguma norma de justiça. Não existe nação tão oposta a tudo quanto é humano que não se mantenha dentro dos limites de algumas leis. Visto, pois, que todas as nações de dispõem a promulgar leis para si próprias, de seu próprio alvitre, e sem serem instruídas para agirem assim, é além de toda e qualquer dúvida que elas conservam certa noção de justiça e retidão, ao que os gregos se referem como prolhyeij, e que é implantado por natureza nos corações humanos. Eles, portanto, possuem uma lei, sem a Lei; porque, embora não possuam a lei escrita por Moisés, não são completamente destituídos de conhecimento da retidão e da justiça. De outra forma, não poderiam distinguir entre vício e virtude - restringem aquele com castigo, enquanto que a esta exaltam, mostrando-lhe sua aprovação e honrando-a com recompensas. Paulo contrasta a natureza com a lei escrita, significando que os gentios possuíam a luz natural da justiça, a qual supria o lugar da lei escrita, por meio da qual os judeus são instruídos, de modo a se tornarem lei para si próprios.
(Nota do Pr Silvio Dutra: Tomemos por assentado, que nesta dispensação da graça, que tem durado desde a morte e ressurreição de Jesus, que a nenhuma pessoa, e a nenhuma instituição tem sido dado por Deus, que em nome da religião, se faça acepção, ou injúria, maldição ou condenação de quem quer que seja, e muito menos que se use de violência seja ela moral ou física em nome de se defender a santidade e justiça de Deus. Ao contrário é ordenado aos que amam e conhecem a Deus em espírito, que amem a todos, inclusive a seus inimigos, e que perdoem e bendigam os que lhes amaldiçoam, injuriam ou perseguem.
Quando encontramos em comentários bíblicos o terrível destino que está reservado àqueles que se opuserem a Deus até o final de suas vidas, como vemos por exemplo não apenas nos comentários de Calvino, mas nos de todos aqueles que são fiéis à pregação e ensino da verdade revelada nas Escrituras, o que se tem em foco não é uma ameaça ou um aborrecimento declarado da parte de homens, senão um alerta misericordioso da parte do próprio Deus, que é quem o afirma, pela boca dos seus ministros o que há de suceder no dia do juízo final, de modo que pelo arrependimento, possam se converter e serem livrados da condenação.)