Nossa Dependência de Deus


 
Por João Calvino
 
O SENSO DE NOSSA DEPENDÊNCIA DE DEUS É O CAMINHO DA VITÓRIA
 
Todo aquele que se vê profundamente acabrunhado e consternado pela consciência de sua miséria, pobreza, nudez, ignomínia, tem assim avançado extraordinariamente no conhecimento de si próprio. Ora, não há perigo de que o homem prive a si mesmo excessivamente, desde que aprenda que se deve recobrar em Deus o que em si mesmo falta. Com efeito, na verdade nem pode o homem a si presumir um tantinho de nada além de seu direito, sem que não só se perca em vã confiança pessoal, mas ainda, transferindo a si a honra divina, se faça réu de monstruoso sacrilégio. Evidentemente, sempre que nos vem à mente essa ânsia de apetecer alguma coisa que nos pertença e não a Deus, temos de compreender que tal pensamento nos é inspirado pelo que induziu nossos primeiros pais a quererem ser semelhantes a Deus, conhecendo o bem e o mal (Gên 15].
 
Caso seja a palavra do Diabo que exalta o homem em si mesmo, não lhe demos lugar, a não ser que queiramos receber conselho do inimigo. Sem dúvida é grato possuir tanto de poder próprio que hajas de confiar em ti mesmo. Mas, para que não sejamos seduzidos a esta vã confiança pessoal, que sejamos atemorizados por tantas declarações graves da Escritura pelas quais somos severamente consternados, a saber: “Maldito é aquele que confia no homem e põe a carne por seu braço” (Jer 17.5); igualmente: “Deus não se deleita na força do cavalo e não lhe comprazem as pernas do homem, mas se afeiçoa nos que o temem, nos que se entregam à sua bondade” (Sl 147.10, 11); também: “É ele que dá alento ao cansado e ao sem forças aumenta o vigor, que faz com que os jovens se fatiguem e se abatam, os moços de exaustão tombem, porém os que só nele esperam renovem suas forças” (Is 40.29-31).
 
Todas estas referências conduzem a isto: que não nos apoiemos na convicção de nossa própria força, por mínima que seja tal convicção, se queremos que Deus nos seja propício, o qual resiste aos soberbos, porém dá graça aos humildes (Tg 4.6; 1Pe 5.5; Pv 3.34). Então, em seguida venham à memória estas promessas: “Derramarei água sobre o solo sedento, e rios sobre a terra seca” (Is 44.3); de igual modo: “Vinde às águas todos os que tendes sede” (Is 55.1), as quais atestam que, para receber as bênçãos de Deus, a ninguém se admite, senão os que se consomem sob o senso de sua pobreza. Com isso não se pretere promessa tal como esta de Isaías: “O sol já não ser-te-á para iluminar durante o dia, nem a lua para iluminar durante a noite; ao contrário, o Senhor ser-te-á por luz sempiterna” (Is 60.19). Certamente, o Senhor não subtrai de seus servos o fulgor do sol ou da lua; mas, visto que somente ele quer ser glorioso neles, afasta para longe deles a confiança mesmo posta naquelas coisas que em sua opinião são mui excelentes.

 
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João Calvino
Enviado por Silvio Dutra Alves em 16/08/2014
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