Essa maneira de ver acorda os poderes do espírito

Há alguns anos atrás encontrei esse texto na internet, quando pesquisava alguma coisa para uma monografia que estava elaborando sobre Sabedoria Perene. Fiquei encantado com a sabedoria e beleza do texto de Dugpa Rinpoché, um monge tibetano. Uma linguagem simples, direta e profunda que me propiciou muitas reflexões.

Abaixo transcrevo o maravilhoso texto que encontrei, cujo título é muito sugestivo para um buscador:

"Medita sobre os objetos mais usuais, para aprender o seu mistério. Essa mesa, sobre a qual te apóias, contém uma miríade de universos. Ela não tem solidez.

Bastar-te-á colar a lente de um microscópio sobre a madeira da mesa para compreender o mundo de outro modo. O olhar afunda-se até ao infinito, sem nunca encontrar o fim.

Aprende a conhecer os poderes do teu espírito, se quiseres conhecer os mistérios da vida e da morte.

Abre os teus olhos no interior. A chave está em ti.

O teu espírito propõe-te a liberdade infinita de criar. Torna-te de novo criador.

Observa o mundo de outro modo. Muda o teu olhar sobre as coisas.

A matéria está viva. Os micromundos existem. Há bolsas de realidade em todo o lado na espessura da matéria. Aprende a ver os outros mundos.

O infinitamente pequeno é tão vasto como o infinitamente grande. Aliás, não há fronteira entre eles. A única fronteira somos nós, a nossa maneira de sentir, de receber.

Nós vivemos num oceano de vibrações, de cores, de imagens. O mundo visível não é senão um aspecto, uma imagem, um instante do Movimento, como uma onda no mar, ou uma dobra na trama infinita de um fato. Não há mundo, mas uma multidão de mundos.

Aprende a ver o interior das coisas, com os olhos do espírito. Não aceites a realidade superficial das coisas. Essa parede não é uma parede... mas um conjunto de moléculas que rodopiam a uma velocidade louca, um mosaico de vibrações que mexem, giram, se modificam constantemente.

Utiliza as potencialidades das visualizações. A forma, a imagem sobre a qual meditas tornar-se-á realidade. Podes explorar as variações múltiplas do universo. Tudo dependerá do género de mundo que tu quiseres ver aparecer. É um jogo intenso, hipnótico, que nos faz viajar para longe, sem deixar o instante.

Se este mundo te aborrece, então muda de mundo.

Mudar de mundo, é mudar de consciência.

É preciso desaprender, e aprender de outro modo. No limite das tuas percepções vive uma multidão de formas de vida levando uma existência paralela à tua. Aceita o milagre dos outros mundos como uma realidade, tão verdadeira e tão fugitiva como a tua realidade quotidiana.

Temos uma multitude de corpos, e apenas temos consciência do corpo material.

Podes deslocar-te, passar de um corpo para outro. É como se habitasses num apartamento de um imóvel de cinqüenta andares, sem saber que é possível abrir uma porta, explorar as outras divisões, os outros andares. Retoma consciência de ti mesmo. Explora os teus sonhos, os teus desejos, as tuas sensações, até à vertigem.

Observa o mundo a partir do espírito, e vê-lo-ás abrir-se, multiplicar-se, enriquecer-se. A sua profundidade é infinita. Pousa sobre o mundo os olhos do mago e ele responder-te-á pelo encantamento dando-te amor.

Atrás da aparência das coisas, há estradas, passagens, que levam a outros mundos, outros universos - isto é outros planos de realidades. Podes entrar numa imagem ou numa música utilizando a meditação, isto é, a concentração do espírito.

Não oponhas o visível e o invisível, o mundo material e o mundo do espírito. Seria como afirmar que o gelo não é água.

Aprende que a forma não passa de uma ilusão. Nós isolamos as formas, podemos designá-las, nomeá-las, sem saber que elas são as seqüências de um ritmo eterno, como o movimento inconstante das ondas.

Tudo existe. A meditação abre a passagem, arranca vendas e mordaças, desbloqueia portas e janelas, mostra-nos as outras paisagens e diz-nos: «Estais lá. Deslocai-vos! Estais livres. Habitais todos os mundos!»

Existe um nível muito poderoso da meditação em que as diferenças e as distâncias se fundem numa mesma corrente. Em estado de amor, de união total, fervilham, dançam, vivem o resplendor dos universos, num só ritmo.

A nossa existência sobre a terra é rápida, ou lenta... Tudo depende do observador. Na escala do universo, já estamos mortos. Se ainda estamos presentes, é porque temos uma visão muito mais lenta do desenrolar das coisas.

Para acordar os poderes do espírito, compreende que não há nem passado nem futuro. O universo vive e exprime-se no presente eterno. É preciso um terceiro ouvido para o ouvir, ou uma terceira visão para o ver.

Treina o teu espírito para ver de modo diferente. A magnificência do universo ser-te-á dada e o sol nunca mais se apagará".

Dugpa Rinpoché seguiu S.S. Dalai Lama na sua fuga do Tibete, por altura da invasão chinesa, e, depois de ter estado em Dharamsala, escolheu viver em Nagarkot, Nepal, a três mil metros de altitude, à vista dos seus três cumes lendários: o Annapurna, o Melung Tse e a cordilheira do Everest, coroados de neve. Faleceu em Dharamsala, em 1989.