A mãe como indivíduo
Nesse tempo em que várias mães sofrem diante filhos ingratos, em que o amor tornou-se algo raro, em que a religião prega apenas uma religação com o amanhã, em que o conhecimento transformou-se em uma meta, em que a vida perdeu o sentido aos tolos. Os anos passam e os filhos são criados pelo ódio da sociedade, e o amor de mãe parece não mais proteger quem já é adulto. Não é o fim dos tempos, talvez seja apenas o início dos valores exalados por quem é capaz de sentir todas as belezas que estão em poucos corações que fazem o corpo de seu dono dançarem ao redor das infinitas fogueiras.
Sinto-me triste sem deixar de sorrir, não tenho compaixão daqueles que sofrem pelo que eles mesmos provocaram, sinto compaixão é da diminuição do ser humano diante da moral pregada por bárbaros, do medo, da guerra. Várias famílias são mantidas por mães que se unem aos seus filhos pelo simples fato de muitas vezes não conseguirem explicar tanta loucura. Uma mãe mata para proteger os seus filhos e em sua fé protege o mais bárbaro dos homens.
Fico na dúvida se a mãe deve ser aplaudida pela sociedade repleta de bárbaros ou simplesmente precisa ser levada nos braços por seus filhos em um gesto de amor. É que uma mãe cria seus filhos e para ser compensada precisa perceber que quando envelhece precisa se fortalecer interiormente. Fazemos sempre uma mistura de ódio com prostituição, de amor com ilusão, o problema é que o espelho da sociedade é o espelho da alma do mundo.
O filho é um indivíduo criado por outros indivíduos e a diferença é que não existem diferenças entre aqueles que naturalmente cresceram separados, o que é raro de nada importa para quem consegue se encontrar, o que está no amanhã é uma praga que precisa ser eliminada pelo bem das novas gerações que já nascem carregadas de informações, diante metas do conhecimento é melhor queimarmos livros para que os estudantes possam refletir sem pressa, o sentido da vida está no agora e todos morrem sendo que apenas os que dançam entram triunfantes no abismo. Cada um por si mesmo e quem é pelos outros cria deficientes emocionais, e quem é pelos outros fica doente para pedir ajuda após ter negado o próprio ego em nome de uma falsa moral. Quando começou a humanidade diziam que chegaria o final dos tempos e realmente foram os primeiros que morreram, agora temos tantas belezas que não podemos cometer o erro de deixar a vida passar para que então sejamos salvos por uma promessa de que teremos vaga no paraíso ou está certa a nossa estadia no inferno.
Em minhas lágrimas existe muita ironia da mesma maneira que em meu riso está toda a loucura dos que não conseguem se alegrar com nada diante tanto ceticismo que pregaram diante das batalhas em que estavam despreparados, se acreditam que sou a verdade e a vida serão peças que farei sofrer por eu não acreditar no potencial dos rebanhos. Matar por amor não é o caminho, o caminho é viver por amor e o problema é que poucos conseguem fazer a caverna em meio da multidão e mesmo assim dizem precisar da multidão por não ser o caminho viverem isolados na montanha. A definição de mãe é amor, a definição de ser humano é que todos são diferentes e algumas vezes partir é a saída para que o filho seja salvo da própria ignorância que vem além do amor.
Talvez a mãe precise lutar para sufocar o preconceito moral sem ser mais uma preconceituosa que nunca soube dizer um além de eu te amo para que seu filho não fosse um bárbaro, talvez a mãe precise subir a montanha com os mesmos valores que usava no vilarejo. A mãe vira osso e se o seu amor é apenas pelos filhos sem pertencer ao seu próprio corpo ainda tão jovem com toda certeza será a mãe mais um obstáculo que prejudica os filhos já adultos. Todos tem culpa pelas tragédias do mundo, todos são uma única peça, todos podem sair de uma realidade para entrarem em outra, agora peço desculpas aos fracos, é que sem fé e amor, sem saber e persistência, sem mergulho no novo, o que existe é apenas o lado mais maldito da condição humana de ressentimento e esperança.
Escritor Joacir Dal Sotto​