O Sussurro de Deus

Conheço uma pessoa interessantíssima. O fato é que a conheço desde criança e sei que ela é órfã. Mas, vez ou outra a ouço dizer: “falei com o pai”, “perguntei pro pai”, ou, o pai me falou...”

Quando pensamos em obter as benesses do Pai Maior, em alcançarmos uma graça, imaginamos logo estar tratando do imponderável, do surreal, como se fosse só por milagre!

E, nos quedamos descrentes, por acreditarmos que o extraordinário, os chamados fenômenos divinos, o maravilhoso, são, para os escolhidos, ou chamados iniciados, porque achamos que somente esses se encontram em condição de receber.

Até mesmo, quando precisamos simplesmente de uma inspiração... Pensamos em algo tão distante, como se fosse uma quimera.

Não nos sentimos merecedores e preferimos acreditar que a Deidade não tem tempo para perder com a humanidade caída, após tê-la expulso do jardim. Mas, o divino, o miraculoso, está acontecendo a todo momento à nossa volta, basta ter olhos para ver e ouvidos para ouvir. Se, nos sentimos órfãos, é simplesmente por escolha nossa. Como diz o místico Paulo Coelho: “O extraordinário reside no caminho do homem comum”.

Tempos atrás, uma minha parenta encontrava-se em situação muito difícil, sem renda alguma, incapacitada para o trabalho, e impossibilitada de se aposentar, por não preencher os requisitos exigidos para a aposentadoria. Queria tanto ajudá-la, mas não na forma de “dar o peixe”, como eu sempre fazia, ansiava por um meio de ensiná-la a pescar.

Passei dias matutando os prós e os contras, de se construir no quintal dela um viveiro para criação de aves ornamentais, mais precisamente periquitos. Coisa que lhe daria renda pequena, mas, o suficiente para o leite e pão. Algo, que ela pudesse exercer facilmente, sem grande esforço e sem sair de casa. Contudo, os contras me pareciam pesar mais que os prós, e eu me rendia assolada pelas dúvidas.

Um dia, antes de dormir tomei uma decisão: “amanhã cedo quando acordar, com a ajuda de Deus, decidirei o que fazer”.

Na manhã seguinte, acordei sem saber ainda se o negócio era ou não positivo. “Vou dar um tempo para Deus” – pensei.

Peguei a bicicleta e fui andando “ao encontro da resposta”. Tomei uma alameda recém aberta, num Bairro novo, que estava surgindo em um loteamento, que até bem pouco tempo era sítio, e fui pedalando, sem planejar, rumo à uma antiga Capelinha de São João.

Lá chegando, impressionou-me a sensação de sossego e paz do lugar. A capelinha estava como há muito tempo não via, pintada de novo, toda branca, tendo a entrada, todo o derredor, forrado por cascalhos claros. À sua volta, frondosas árvores deixavam filtrar por entre a ramagem exuberante, fachos de luz dourada. O sol luminoso por detrás dos ramos sondava a quietude...

Tive vontade de fazer uma prece. Ergui meus olhos para o Alto, quando, deparei-me com um espetáculo, no mínimo, lindo!

À porta de uma casinha de João-de-Barro, construída sobre um poste de luz elétrica, estava um casalzinho de periquitos verdes – tuins -, arrulhando em romântico namorico.

O quadro, divino por sua beleza e extraordinário pelo inusitado “periquito em casa de João-de-Barro”, foi para mim um diálogo divino, uma resposta viva.

Totalmente claro. Ao perceberem minha presença, os passarinhos se recolheram apressadamente, é claro, pois, tinham algo a proteger. Pelo comportamento do casalzinho, deduzi que estavam “Procriando” naquela casa de barro.

Conta-se, que certa vez, trouxeram um índio para conhecer a metrópole. No centro da cidade grande, em meio ao rumor do trânsito e toda confusão de ruídos, o índio gritou:

- Ouço um grilo!

- Impossível. – disseram.

O selvagem afinou os ouvidos e pôs-se a procurar. Não demorou a encontrá-lo e o exibiu contente entre os dedos.

- Como pode ouvir um grilo aqui? – perguntaram incrédulos.

O índio pegou uma moeda e a atirou ao chão. Não obstante os rumores ensurdecedores, um transeunte ouviu e logo se abaixou para pegá-la.

- É simples – disse o silvícola.

- Ouvimos aquilo que nossos ouvidos estão habituados a ouvir!

Daí, eu vir a concordar com o ditado: “Deus fala com as pessoas que estão habituadas a ouvi-LO”.

Maria Barreto
Enviado por Maria Barreto em 19/12/2010
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