Um anjo me falou
Eu me lembro de estar muito cansado, naquela tarde.
Um desejo enorme de chegar em casa e relaxar.
O trânsito, insuportável, como sempre, não ajudava.
Entrei numa rua paralela, afim de sair da confusão.
Parei o carro no semáforo vermelho e, estranhamente, observei que não havia outros carros alí.
Me esforcei para alongar as costas no banco e olhei para o lado.
Uma garotinha, de sete ou oito anos me fitava.
Abaixei o vidro para observa-la com mais atenção.
Então ela se aproximou, como fazem tantas outras crianças pelas esquinas movimentadas da cidade.
Tinha o rostinho, quase todo escondido nos cabelos desarranjados.
Estendeu a pequena mão e pediu, com a voz quase sumida.
Agora podia ver os seus olhos castanhos e brilhantes.
- O senhor pode me dar algum dinheiro?
Busquei com o olhar, muito desconfiado, toda a volta e não vi mais ninguém.
Fiquei preocupado com ela e acentuei.
- Menina, aqui é perigoso pra você ! Cadê seus pais?
Com a ajuda de uma das mãos, afastou os cabelos, me olhando diretamente nos olhos, continuou.
- Eu sei pra quem posso pedir.
- E como você, sendo ainda tão criança, sabe em quem confiar?
- Porque meu pai me avisa.
- E cadê seu pai? Como ele pode saber em quem você pode confiar?
Agora, com um sorriso, ela continuou.
- Meu pai sabe tudo, porque ele é Deus.
- Como assim? Deus fica com você aqui na esquina e fala pra quem você pode pedir dinheiro.
- Claro que sim!
- E ELE está agora com você?
- Não! ELE está sentado do seu lado.
Me arrepiei inteiro.
Olhei para no banco ao lado e não vi nada.
- Menina, aqui não tem ninguém.
Peguei alguma nota qualquer e dei à ela.
Depois continuei.
- Agora vá para sua casa. Aqui não é lugar pra você ficar.
Ela colocou as mãozinhas na cintura, me olhou com sensura e continuou.
- Você não pode vê-Lo com os olhos. Tem que enxergar com o coração.
Levei um susto enorme, com a buzina do carro logo atrás, avisando do farol aberto.
As ruas estavam novamente quase intransitáveis
A mesma bagunça de minutos atrás.
Aínda aturdido, procurei pela menina.
Não a avistei mais.
Como eu poderia ter tido esta experiência?
Acho que foram apenas alguns segundos, mas aquele momento pareceu-me longos minutos.
E aquele anjinho, vestido de criança a me confortar a alma.
Voltei pra casa, como quem pisasse na nuvens.
Foi mais um presente, direto do céu.
Sandro R C Costa