O NATAL MUDA DE COR
Fátima Irene Pinto
O Natal não tem a mesma cor, nem o mesmo sabor, nem o mesmo aroma, nem o mesmo espírito de forma linear e padronizada por toda a vida.
Aos 58 anos dou-me conta de que o natal veste roupas e matizes diferentes pelo menos a cada década.Vamos voltar no tempo?
Até aos dez anos de idade ele tinha o sabor incrível de uma festa inigualável.
Sentíamo-nos poderosos(as) ao lado de nossos pais. Nossa mãe preparando a ceia, nosso pai com uma cara feliz de mistério, ruas enfeitadas e luminosas e na sala, uma árvore que nos parecia celestial, pois sob ela seriam colocados os nossos presentes tão esperados. Bendita infância! Benditas canções natalinas!
Aos vinte anos estávamos com a cabeça a mil pensando que caminho seguir na vida, buscando nosso espaço no mercado de trabalho. Nesse tempo passamos muitos natais amando alguém e então o natal era lindo desde que estivéssemos na companhia do ser amado. Por outro lado também passamos muitos natais amargando uma dor de cotovelo danada que não havia presente ou ceia que dessem jeito na nossa maionese desandada.
A década dos trinta aos quarenta anos, para a maioria das pessoas, torna-se uma volta maravilhosa à infância através dos filhos pequenos e percebemos que a alegria que sentimos ultrapassa até mesmo a da infância. Fazemos por eles tudo que nossos pais fizeram por nós e muito mais. Reunimos a família que agora tem avôs, avós, sogros, sogras, mais um tio solteirão para se vestir de papai noel, mais um primo que se incumbe da iluminação e mais um sem par de amigos que trazem outros amigos, um violão e alguns cantores natalinos se a ceia for promissora. Lindos e inesquecíveis natais.
Dos quarenta aos cinquenta anos já perdemos muitos entes queridos. Quer queira quer não, está faltando um pé ou mais na nossa mesa. Ela está meio torta e meio desgastada. Mesmo assim entramos no clima ou nos esforçamos para entrar. Montamos a árvore quase que maquinalmente e ficamos aguardando um telefonema sobre quem vai na casa de quem.
Nossos filhos já estão crescidos e os encantos do mundo e das paqueras os conclamam. Eles ligam de algum lugar à meia noite e dizem eufóricos:
- Feliz natal ! Feliz Natal ! No dia seguinte se lembram de dar um abraço emocionado a depender do jeito que acordam e só então a gente entrega o presente (algumas vezes errado) a julgar pela fisionomia que assinala: acertou em cheio ou nada a ver comigo!
Dos cinquenta aos sessenta, para a maioria das pessoas, o natal é uma outra volta aos áureos natais ainda que faltem mais pés na mesa de sustentação. É que a maior parte das pessoas já têm netos. Dizem que ser avô e avó é ser pai e mãe duas vezes então o clima natalino se faz em dose dupla.
Estou falando de um modo geral. Evidentemente cada pessoa tem uma história própria para contar. Há as que ficam melancólicas nesta época, as que passam os natais sozinhas. Há as que estão divorciadas ou viúvas. Há as que constituíram uma segunda família, há as que nunca tiveram família, há as que são irremediavelmente natalinas e curtem a data não importa a circunstância. Cada vida é uma vida e cada pessoa tem uma história natalina muito particular.
Mas com certeza, o natal da infância tem a cor verde da esperança.
O natal da juventude tem a cor vermelha do desafio e da conquista.
O natal dos jovens pais tem a cor dourada da realização.
O natal dos cinquentões ou sessentões tem a cor prata do renascimento.
Não sei a cor do natal dos velhinhos pois ainda não cheguei lá. Só sei que fiz tudo para que o natal dos meus amados velhinhos não tivesse a cor cinza do abandono.
E sei também que a ausência deles deixou a minha mesa bem torta e a minha árvore com um quê de profunda nostalgia, afinal, ninguém nos amou mais do que eles!
Mas meus rapazes estão com quase vinte e quatro anos. Quem sabe não viverei ainda um natal multicor quando resolverem me dar netos?
Só uma coisa nunca, jamais, mudou nos meus natais: os momentos que sempre me reservei para ficar a sós com o Aniversariante e fazer uma prece silenciosa...e devo completar dizendo: por conta Dele, todos os meus natais tiveram algo de mágico, de especial, de profundamente espiritual e será assim até o fim de meus dias.
Na verdade eu estou no grupo dos "irremediavelmente natalinos".
Desejo para todos, independente da idade e das circunstâncias, um natal de humanas e merecidas alegrias mas, acima de tudo, desejo para todos um toque de alegria pura e transcedental, aquela que se constitui um alimento para o corpo e para a alma porque foi comemorada em um momento íntimo e particular do Advento, o aniversário de Jesus!
19.11.2011
Descalvado - SP