A vida que muitos levam

Naquele tempo em que os nossos desejos eram outros, em que o nosso prazer era apenas brincarmos despreocupados com o amanhã e o que nos feria era o repentino fim de nossas brincadeiras. Quando não entendíamos dos problemas adultos e dizíamos no mais profundo silêncio que com toda certeza as nossas vidas seriam diferentes. Diante tantas pessoas rapidamente ficávamos unidos dançando sempre a mesma música que todos aos nossos olhos sabiam dançar.

Depois de um tempo descobrimos novos desejos, despertamos prazeres que nos deixaram com um pouco de dor. Através da insistência fomos levados ao completo paraíso e constantemente fugíamos para a floresta fazer amor em plena luz dia, é que naquela época ainda temíamos a amplitude da noite mesmo que fogueiras alegrassem os nossos pensamentos. Sentíamos paz e ao mesmo tempo eram os nossos pais que nos defendiam, que nos prendiam diante tanta rebeldia que exalávamos.

Chegou a juventude e muitos de nós ficamos dependentes dos pais e concluímos cursos universitários ou apenas éramos iniciados no mercado de trabalho. Começamos a sentir que o mundo parece injusto com o que apenas o jovem é capaz de enxergar. Tínhamos que ajudar os pais quando éramos pobres, tínhamos que encarar uma família sem mesmo a nossa infância interior ter terminado, tínhamos tantas coisas que entre tristezas e alegrias sempre nos restava um tempo para enlouquecermos, para aliviarmos aparentemente um pouco da tensão.

Chegou a tão sonhada vida adulta e nada mais era como um dia tinha sido. Restaram apenas lágrimas pelos pais que morreram, pelos avós que deixaram de contar historias e que nem tivemos de ouvi-las. A criança que brincava em nosso jardim cresceu e não quer mais nos tirar do sofá para brincar ao nosso lado, o jovem que sonhava dentro de nossos corações tão unidos por um ideal perdeu o bom ânimo diante das tantas dificuldades que a vida proporciona para quem se imagina realizado.

Um pouco mais de tempo teve que passar pela simples lógica do tempo e agora a face que vemos no espelho é apenas de velhos que perderam a juventude física. Se foram os prazeres que duravam noites inteiras, se foram as loucuras que não passavam aos nossos olhos de diversão, se foram os estudos que fazíamos para que fossemos alguém na vida. As canções parecem apenas doces lembranças para retirarem as nossas tantas amarguras, o mundo parece tão diferente que nem queremos mais ouvir o jovem com medo de destruirmos o império de valores ultrapassados que deixamos na sociedade.

É difícil ter que dizer a verdade para quem passou uma vida de mentiras, para quem foi um camelo carregando pesos desnecessários, para quem agora nem mais poderá ser um leão livre que luta pelo aquilo que ama. A criança que existia foi sufocada e continua sendo massacrada nas profundezas do coração de quem acredita na vida eterna e ignora todas as possibilidades que vem ao encontro dos simples mortais. Existem tantos abraços que ainda podem ser dados, tantas palavras positivas que podem ser ditas, tanto tempo para vivermos alegremente que não adianta reclamarmos, o mundo exterior que nunca mudou será imutável enquanto você não escolher transformar a própria realidade.

Escritor Joacir Dal Sotto​

Joacir Dal Sotto
Enviado por Joacir Dal Sotto em 14/04/2015
Código do texto: T5206585
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