Foi mãe que botou moral I

A casa que até agora mais tempo morei na vida foi a casa dos Ipês. Já falei sobre ela. Era a casa que o banheiro tinha um buraco que dava para ver a vida passar enquanto fazíamos o números dois. Deixa eu falar mais um pouco sobre ela.

Na década de 90, o nosso bairro ainda não era saneado. Isso significa que o esgoto corria a céu aberto. Todas as ruas do bairro tinha um rego por onde o esgoto escorria em frente a nossa casa, não era um rego propriamente dito, parecia mais o rio Solimões. Tinha quase dois metros de largura. A gente molhava os pés na água podre para poder entrar em casa. Mas isso não durou muito tempo. Não com a mãe que tenho.

Minha mãe é uma das mulheres mais caprichosas que eu já conheci na minha vida. Com o seu lema " A limpeza Deus amou" ela deu um jeito rapidinho naquela situação. Persistentemente, todos os dias ela ia moldando o esgoto. Com uma vassoura, aos poucos, ia afinando, modelando aquele córrego. Era uma guerreira. Aos poucos, o impossível estava feito. O que era um pântano, virou uma fina artéria por onde escorria uma água preta e má cheirosa.

As outras vizinhas vendo o que mamãe tinha feito resolveram modelar a frente de suas casas também. Em pouco tempo, onde escorria um fétido esgoto, havia uma rua onde era possível caminhar sem molhar os pés,e onde jogávamos bola sem corremos o risco de pegar "lepra".

O ruim era quando chovia. Pronto. Todos o trabalho era desfeito. Mas tempo era o que mamãe tinha para fazer tudo de novo. E, só bastava o sol dá a sua esfriadinha que já havia um batalhão de senhoras de vassouras nas mãos tomando conta da frente de suas casas.

Para a gente que era criança, tanto fazia ter o esgoto correndo na frente da nossa casa, no quintal ou debaixo da cama. Tudo era uma festa. Os risos corriam soltos quando um moleque se desequilibrada e mergulhava na podridão. O infeliz saia só com a bola dos olhos de branco. Tinha partes que era tão fundas que se eu fosse o prefeito colocaria salva vidas só por segurança.

Quer ver uma festa? Era quando papai pescava uns cascudos. A gente não os comia. Então, eu e alguns amigos os soltávamos no esgoto e saíamos correndo atrás. Como o esgoto corria para o mangue, não era algo tão cruel.

Mas foi mãe quem botou moral.