OS CACHORROS...
Até o momento já fui dono de três cachorros. Creio que foram os três último, levando em conta que moramos em apartamento, seria muito inconveniente, para o animal claro, morar num espaço onde ele coma, durma e defeque simultaneamente.
A vizinha do lado tem um. Dizem que é operado para não latir. Lamento por ele. O coitado não late, ele chora. Mil vezes morar na rua e comer os peixes do chafariz da praça do milagre.
Meu primeiro cachorro foi o Maradona. Não sei se fora mera coincidência ou meu pai quis homenagear o Hermano Mão de Deus. Era totalmente de guarda. Animal sem contato com a família e dormia fora de casa e comia as sobras e os ratos que aparecessem. Aqui faço uma explicação para os jovens que porventura estão me lendo: antes dos animais serem antropomorfizados, eles eram animais e cumpriam a sua função de animal. A vaca dava leite, a ovelha lã e o cachorro, proteção. Essa era a função do Maradona.
Era feroz. Mordeu meu pai e minha irmã várias vezes. A mim nunca mordeu. Talvez eu já tivesse um senso de observação. Se mordeu meu pai e minha irmã, vai me morder também. Escapei ileso
O quintal à noite era dele. Como já disse, era feroz. Latia. Batia nas paredes com as patas, rosnava a ponto de babar de ira se alguém colocasse ao menos o chapéu por cima da cerca. Morreu nas mãos da Carrocinha.
Pouco tempo depois, meu pai e eu encontramos um cachorro de rua e, por incrível que pareça, era a cara de Maradona. Com certeza era de rua. O pelo todo cheio de nós. O medo de humanos me fez perceber que ele sofreu algumas experiências traumáticas. Não foi fácil pegá-lo. Aos protestos, minha mãe aceitou e para quem não queria ver as fuças de um novo animal, o chamou de Pluto, em homenagem ao cachorro do Pateta.
Pluto era dócil. Fujão que só ele. Numa dessas fugas, ele aproveitou que meu pai estava deitado na sala e mijou-lhe no rosto. Foi a despedida. Uma forma de agradecimento. Fugiu e nunca mais o vimos. Se bem que pai não fez muito esforço para encontrá-lo, meu velho morreu se lembrando dessa mijada.
O último foi o mais safado e “servegonho” animal já criado por Deus. Era um terço da minha canela. Mancava de uma perna e cego de um olho. A cegueira não era natural, foi culpa de uma menina de 10 anos que por perversidade furou o olho do animal com um palito de churrasco. Quando eu vi aquela crueldade já tracei o futuro daquela peste: vai ser casar com um presidiário, ter cinco filhos e todo dia vai levar uma pisar para pagar esse pecado. Dito e feito, de quebra virou quenga de outro presidiário. “Mas George, que praga foi essa?” Na verdade, ela só seguiu a carreira da mãe e das tias. Só constatei um fato.
Rex foi o meu melhor cachorro. Meu grande amigo. Nós o tratávamos como um cão, mas com amor. Esse já dormia dentro de casa, porque tinha medo de dormir no quintal. Os ratos eram maiores que ele. Era capaz de dois gabirus o matarem, acredito que apenas um não, mas dois, matava o bichinho na certa.
Já velho, caiu-lhe os dentes e saiu-lhe “a tripa do cú” como constatou mamãe, era um prolapso anal. Corre para o médico para fazer um “curínhio”, uma operação para arrochar as pregas do bichinho.
Perto de morrer apareceu uma cachorra buchuda falando que ele era o pai. Duvidamos da paternidade. Era supostamente impossível. Mas, como na vida tudo se tem um jeito, e toda dúvida foi sanada quando nos foi apresentado o vídeo da engatada. Era o pai! Nasceram os cachorrinhos. Eram a carinha do meu Rex. E todo mundo julgando que ele fosse um donzelão.
Um dia, recebi uma ligação da minha mãe. Rex havia morrido. Meu amigo de quase uma década, sem contar as décadas que ele já tinha antes de morar conosco, havia descansado. Até hoje tenho saudades dele.