O Trenzinho Piuí
Charlles Nunes
"Piuí, piuí. Piuí a-ba-ca-xi." O trenzinho brincava com seus amigos no terreno da estação. Ele sonhava com o dia em que iria viajar e conhecer lugares novos.
Durante o dia, ele brincava até cansar. Mas antes de escurecer, corria pra casa, porque tinha medo do escuro. O medo era tanto, que ele dormia com a luz acesa.
Quando o trenzinho fez sete anos, ganhou de presente uma viagem. Ele acordou bem cedinho e olhou para os seus três vagões.
O vagão vermelho estava cheio de pessoas. O amarelo, de flores coloridas. Mas no vagão azul ele não viu nada, porque estava fechado. Ele não sabia o que tinha lá dentro.
"Prontos para a viagem?", disse o maquinista. E tocou o apito. 'Piuí, piuí... piuí a-ba-ca-xi!', fez o trenzinho. E começaram a viagem.
O trenzinho começou devagarinho. E foi acelerando aos poucos. "Que ventinho gostoso!", disse ele. Os passageiros gostaram do vento também.
Aos poucos, ele foi acelerando, porque queria chegar ao destino antes do anoitecer. (Sabe como é, né... ele tinha medo do escuro.) Ele correu tanto, mas tanto, que acabou errando o caminho. Quando o maquinista percebeu, puxou o freio com toda força.
Tsh-tsh-tshhh! Foi o maior barulhão. Os passageiros levaram um susto. O trenzinho voltou de ré até pegar o caminho certo.
Depois de pegar o caminho certo, foi acelerando devagar, pra não errar outra vez. Ele percebeu que a direção é mais importante do que a velocidade.
Chegando na primeira estação, o trenzinho parou. Umas pessoas desceram e abraçaram outras que estavam esperando. Mais pessoas entraram, e a viagem continuou.
"Na vida é assim também," pensou o trenzinho. "Uns chegam, outros se vão, e alguns seguem com a gente por toda a vida. No final, tudo fica bem."
Seguindo a viagem, o trenzinho sentiu o suor descendo na testa. Afinal, era quase meio-dia!
Chegando na segunda estação, foram esvaziar o vagão amarelo. As flores foram levadas uma a uma - até que o vagão ficou vazio.
O trenzinho viu que as flores foram levadas para a sombra. Que bom! Depois de tanto calor, iam poder descansar e beber água.
"Na vida é assim também", pensou o trenzinho. "Às vezes a gente tem que aguentar o calor até encontrar uma sombra. No final, tudo fica bem."
Seguindo a viagem, ele viu campos verdinhos, plantações imensas e montanhas bem altas.
Ele viu rios, riachos, cavalos pastando e patinhos nadando. Sentiu até o cheiro do café sendo torrado numa fábrica. E ouviu muitos passarinhos cantando também.
De repente, o tempo virou. Trovões e relâmpagos riscaram o céu, e começou a cair um temporal. E como já estava ficando tarde, ele começou a sentir medo. A noite ia chegar, e ele ainda tinha muito caminho pela frente.
O trenzinho olhou para um lado, olhou para o outro, não viu nenhum poste de luz. Lá na frente, ele viu um túnel. E ele nunca tinha passado por um túnel na vida.
"O túnel deve ser muito escuro", pensou. E começou a tremer de medo.
A chuva caindo, a noite chegando, o túnel se aproximando... nosso amigo não sabia o que fazer. Tudo era muito novo pra ele. Mas o maquinista estava tranquilo. Ele sabia o que fazer.
Antes de entrar no túnel, o trenzinho fechou os olhos. Não queria ficar no escuro. Foi aí que teve uma surpresa: o maquinista acendeu os faróis. O trenzinho abriu os olhos - um de cada vez - e viu que a sua própria luz iluminava o túnel.
Na saída do túnel, o trenzinho viu que já era noite. Mas como ele descobriu que tinha luz própria, seu medo foi diminuindo.
"Na vida é assim também," pensou o trenzinho. "Quando a gente descobre que tem luz própria, afasta a escuridão ao nosso redor. No final, tudo fica bem."
O trenzinho se animou de novo. Logo, logo, viu de longe a estação de destino. Ele foi parando devagarinho. E enquanto os passageiros desciam, o maquinista abriu o vagão azul.
Sabe o que tinha lá dentro? Caixas e mais caixas de livros. Elas foram levadas com cuidado - uma a uma, até que o vagão ficou vazio.
"Que viagem gostosa!", disse o trenzinho. E fechou os olhos pra descansar. Dessa vez, ele apagou as luzes - pois não sentia mais medo do escuro.
A viagem tinha sido muito boa mesmo.