O caso da Porquinha, Miqueia
O fulano estava com os documentos da Rural 69, atrasados a anos. Pneus carecas, lisos, feito testa de velho. A pintura descascando. Bancos retorcidos. Estofamento mofo. Motor ratiando; contudo, era a ferramenta de trabalho daquele pedreiro, jardineiro, leiteiro e boêmio Ricardão, gente boa das madrugadas.
Trafegando pela Rodovia dos Desvalidos, na altura do km 69, foi pêgo numa blitz. Após feita a vistoria prévia, o policial dirige-se ao fulano:
- documentos, senhor!
- quais?
- todos. Vamos!
- é o que tenho.
- todo esse tempo vencido?
- nem sabia...
- vou multá-lo; aí ficará sabendo.
- por favor, espere um minuto, eu imploro, senhor Guarda.
Foi até o porta-malas e após uma série de pancadas com a marreta de 2 quilos, conseguiu abri-lo e tirou de lá, um bichinho novo em folha.
- o que é isso, cidadão?
- uma porquinha adestrada, treinada para muitas finalidades. Seu nome é Miqueia.
- como assim?
- ser guia de cego, é uma das atividades.
- suborno, corrupcão, é?
- não senhor, longe disso. Sabe, se existe cão, por que não porco-guia de cego? A espécie animal não é tão importante, como os caminhos por quais ela caminha. Prazer, eu, você e a Miqueia, somos de mesma nacionalidade; ou brasileiros, por certo. Os entendidos ficam nessa latumia de direita, centro, esquerda, Bolsonaro, negro, azul, politicamente correto, branco, rosa, bulingue, Lula e outras patacoadas mais, mas somos família. Passar bem; nem me viu, amigo!
Pasmo, ao ver o fulano com seu carro fumaçando a atmosfera, longe de seu alcance, o policial confessou ao comandante: "quanta verdade ouvi do Caipira da porquinha, Miqueia, Comandante. Pediu que lhe entregasse como presente de natal, poderá lhe ser útil neste fim de ano.
- que isso? O que esse bicho tá fazendo, aqui?
- Só não gostei de ele não ter trazido uma para mim.
- por isso, não. É sua.