Coisas Que Só Acontecem Comigo - XXIV. O fantasma da república

Eu já contei (Coisas Que Só Acontecem Comigo - XVIII) aqui de um caso acontecido quando morei e trabalhei em Santa Inês do Maranhão. Quando baixou um “santo“ nada amistoso, num ensaio de macumba que fizemos. Como foi dito, eu e outros funcionários do Exército brasileiro morávamos numa “república” no centro da cidade e aquele não fora o único evento misterioso lá acontecido. Antes acontecera o que posso a contar agora.

Uma coisa que nos chateava demais era que muitos de nossos colegas de trabalho, indo tomar suas cervejas nos bares, acabavam entrando em nossa casa para “tirar a água do joelho”. Os banheiros dos bares nem sempre eram asseados, devidamente cuidados. Isso nós entendíamos, mas não tinha a menor graça, vermos nossa casa invadida por muitos que já chegavam arriando as calças. Aquilo tinha que acabar, mas o problema era que não queríamos ser deselegantes, mandando-os que fossem mijar noutra freguesia.

Bolamos um plano para espalhar que a casa era mal assombrada. Sabíamos que boatos por boatos, não vingariam. Eu sabia alguns rudimentos de truques e ilusionismos, mas isso também não tardaria a ser desmentido e descoberto. Precisaríamos de algo robusto, de exemplos fortes, incontestáveis e isso não estava fácil conciliar.

A casa tinha no máximo cinco metros de frente, o suficiente para um janelão e uma porta convencional. Com essas medidas, o construtor não teve outras opções arquitetônicas que não fosse colocar todos os quartos e salas de um lado só e o outro um corredor imenso, de forma que, estando a porta aberta, quem passasse na rua veria o fundo da casa. Não tinha laje nem forro, assim o telhado ficava aparente.

Estávamos tentando colocar as ideias no papel, quando um dos moradores que era bombeiro hidráulico apresentou uma solução. A caixa de descarga da bacia sanitária era daquelas fixada à parede, que se puxava na cordinha. Com uma linha de naylon dessas de pescar, ele amarrou uma das pontas à boia da descarga e a outra ponta subindo pela parede, passando entre as ripas e caibros do telhado, descia na primeira sala, próxima da rua. Assim, de lá se poderia acionar a descarga sem que ninguém notasse. Fizemos os testes e nenhum falhou, agora era só espalhar o boato do “fantasma do banheiro”.

Claro que ninguém acreditou nisso, por dois motivos: primeiro, como continuávamos morando lá? Segundo, aparecera assim de repente, sem prévio aviso? Só que o tempo estava a nosso favor. As primeiras vítimas saíram de lá apavorados. Deixávamos que adentrassem ao banheiro, e dávamos a descarga e ainda desligávamos e ligávamos o contador de energia rapidamente. O fato era realmente impressionante porque o visitante via a descarga acionar-se sozinha, num fato inexplicável. Em pouco tempo tornou-se o fato conhecido na cidade e ninguém ia mais se desaperriar em nossa casa, então desativamos o fantasma.

Uma noite em que estávamos jogando conversa fora na frente da casa, faltou energia na cidade no exato momento em que meu amigo Chico se encontrava no banheiro. Pensei comigo mesmo: agora eu pego aquele fila da mãe. Entrei em casa tateando as paredes do corredor e me posicionei no canto da sala, quando ele passasse eu sopraria dentro de seu ouvido. Ora, não deu outra, quando ele vinha se aproximando, numa coincidência improvável pela escuridão carbono, assoprei forte na sua orelha. Ele deu um grito de terror e num movimento impensado e brusco, virando-se no sentido horário, acertou-me uma baita cotovelada no queixo, ao tempo em que saiu às quedas de corredor afora... já na rua os amigos perguntaram os motivos do grito.

- Não sei, o fantasma assoprou dentro de meu ouvido, mas desta vez ele se lascou, pois lhe acertei uma porrada que com certeza ele está mortinho da silva lá na sala.

Quando consegui sair, estavam todos me esperando se acabando de rir...

Essa doeu!

Um Piauí Armengador de Versos
Enviado por Um Piauí Armengador de Versos em 21/04/2017
Reeditado em 08/11/2019
Código do texto: T5977582
Classificação de conteúdo: seguro