ALEVANTADO CALDO DE MOCOTÓ MALUCO
Ele estava mesmo no fim. Corpo trêmulo e suado, encolhido no colchão de capim seco que o cobertor ralo não conseguia cobrir. Até a parteira já viera vê-lo e não lhe dera nenhuma esperança. Monsando de Xangô também já se fizera presente com alguns passes. Sem resultado.
Foi então que foi chamada Nhá Chica, quase cem anos de idade, uma vida dedicada a fazer poções mágicas.
Ela olhou bem para o doente, examinou sua língua e descerrou suas pálpebras. Descobriu seu peito e ouviu seu coração. Então disse que ele estava com pega de carcará solto.
Mandou buscar dois bons mocotós de boi no armazém. Lavou, cortou e colocou em uma grande panela de ferro no fogão de lenha. Acrescentou cinco batatas graúdas, duas cenouras e um bom pedaço de mandioca. Cobriu tudo com água e temperou com sal grosso. Fogo alto, caldeirão a borbulhar por quase cinco horas.
Quando percebeu que estavam cozidos, tirou do fogo, jogou fora os ossos, e amassou com um garfo o que restou. Experimentou e gostou.
Já eram quase nove horas da noite quando fizeram o Zé sentar na cama. A custo abriram-lhe a boca, que ele teimava em manter cerrada. E, empurram-lhe garganta abaixo, colher a colher, dois pratos cheios daquele líquido espesso, quase fervendo.
Agora é esperar, falou Nhá Chica.
O doente só gemia. E revirou-se na cama a noite toda, colchão e cobertor molhados de suor. Só sossegou lá pelas três horas da madrugada, quando deixou de tremer e passou a dormir sossegado, roncando alto.
Às seis levantou e sentou na cama. Com os olhos arregalados disse: “Alevantado caldo de mocotó maluco. Não fosse por ele tinha morrido!” Falou que estava com fome e pediu comida. Comeu, bebeu e saiu para o trabalho que não era de ficar parado.
Nhá Chica não quis receber os cumprimentos.
- Quem curou, disse ela, foi o caldo de mocotó, que levanta tudo. Se faz velho de bengala virar menino e correr atrás das mocinhas, faz também qualquer homem levantar da cama.
- O que não pode, informou ela, é dar esse caldo pra mulher. Ele faz com que fiquem doidas e, se passarem defronte a quartel, não resistem: pulam dentro.