Morrer de amor
©Sarah D.A. Lynch
Para começar, espero que você se lembre do filme "E o Vento Levou". Se não se lembra, não vai entender nada. Então:
Ninguém mais anda morrendo de amor por esses dias. Uma pena, em minha opinião. Tão romântico! Imagino-me sendo lentamente consumida de amor, como uma Catherine sem seu Heathcliff, em “O Morro dos Ventos Uivantes”...
Mas... Peraí! Catherine não se consumiu de amor. Ela se consumiu de pura maldade.
Então que tal Scarlett O´Hara, em “E o Vento Levou”? Mmm... Ela tampouco se consumiu de amor. Levantou-se e lutou como uma leoa, chorando por seu amor, sim, mas seu verdadeiro amor era Tara, sua fazenda. Ela terminou por se casar por dinheiro para salvar a terra, e o amor que se lixasse. E já havia se lixado, de qualquer jeito.
Putz... Será que isso quer dizer algo sobre mim? As heroínas que me vêm à mente não são lá muito românticas. Elas não se consumiram de amor coisa nenhuma. Só espero não começar a pensar em Mildred, a maléfica amante de Phillip Carey, o pobre artista de “Servidão Humana”, a quem ela infernizou.
Bom. Só sei que nunca consegui ficar sentada chorando de amor como qualquer pessoa normal. Entre muitas lágrimas e diversos poemas, sempre me levantei em fúria, e acabei com a raça do bastardo que ousou me quebrar o coração. Alguns são meus amigos até hoje. Outros desapareceram no esquecimento, ou morreram. Sozinhos, diga-se de passagem.
Foi só recentemente que aprendi algo mais. Aprendi a ter compaixão.
Estranha palavra, essa. Compaixão – com-paixão. Devia ser “pós-paixão”. Aquilo que você sente depois de acabar com o desgraçado que lhe quebrou o coração – porque acabar com ele é imprescindível. Daí vem uma espécie de amor que é totalmente desinteressado. O que não leva a coisa alguma, é claro, a não ser a uma enorme perda de tempo, ou a mais lágrimas e quebra de coração. Afinal, se o sujeito ainda estiver em pé, vai estar espumando de raiva de você.
Algumas pessoas dizem que isso – essa pós-paixão – é o que vem a ser o verdadeiro amor. Se é não sei, mas ainda penso que o melhor seria virar as costas e ir cuidar da terra, como Scarlett O´Hara. Há muita terra por aí pela qual lutar. E sempre há um Rhett Butler disposto a lhe dar uma mão.
Mas acho que no meu caso não adianta mais. Desenvolvi alguma espécie de consciência com o passar do tempo – ou talvez seja algum idiótico desejo vitimista de morrer de amor. Só pode. Deve ser a idade.
Então: já que meu romantismo é tipo Scarlett O´Hara, melhor pensar nos preparativos para minha próxima viagem, e deixar para morrer de amor outra hora. Afinal, sempre há Israel.*
* Já que ninguém até agora entendeu esse fim... A última cena de E o Vento Levou é Scarlett vendo Rhett partir, sentada na escada e chorando. Ela então sacode a cabeça, levanta o queixo, limpa as lágrimas e diz: "Afinal, sempre há Tara!" - The End.
©Sarah D.A. Lynch
Para começar, espero que você se lembre do filme "E o Vento Levou". Se não se lembra, não vai entender nada. Então:
Ninguém mais anda morrendo de amor por esses dias. Uma pena, em minha opinião. Tão romântico! Imagino-me sendo lentamente consumida de amor, como uma Catherine sem seu Heathcliff, em “O Morro dos Ventos Uivantes”...
Mas... Peraí! Catherine não se consumiu de amor. Ela se consumiu de pura maldade.
Então que tal Scarlett O´Hara, em “E o Vento Levou”? Mmm... Ela tampouco se consumiu de amor. Levantou-se e lutou como uma leoa, chorando por seu amor, sim, mas seu verdadeiro amor era Tara, sua fazenda. Ela terminou por se casar por dinheiro para salvar a terra, e o amor que se lixasse. E já havia se lixado, de qualquer jeito.
Putz... Será que isso quer dizer algo sobre mim? As heroínas que me vêm à mente não são lá muito românticas. Elas não se consumiram de amor coisa nenhuma. Só espero não começar a pensar em Mildred, a maléfica amante de Phillip Carey, o pobre artista de “Servidão Humana”, a quem ela infernizou.
Bom. Só sei que nunca consegui ficar sentada chorando de amor como qualquer pessoa normal. Entre muitas lágrimas e diversos poemas, sempre me levantei em fúria, e acabei com a raça do bastardo que ousou me quebrar o coração. Alguns são meus amigos até hoje. Outros desapareceram no esquecimento, ou morreram. Sozinhos, diga-se de passagem.
Foi só recentemente que aprendi algo mais. Aprendi a ter compaixão.
Estranha palavra, essa. Compaixão – com-paixão. Devia ser “pós-paixão”. Aquilo que você sente depois de acabar com o desgraçado que lhe quebrou o coração – porque acabar com ele é imprescindível. Daí vem uma espécie de amor que é totalmente desinteressado. O que não leva a coisa alguma, é claro, a não ser a uma enorme perda de tempo, ou a mais lágrimas e quebra de coração. Afinal, se o sujeito ainda estiver em pé, vai estar espumando de raiva de você.
Algumas pessoas dizem que isso – essa pós-paixão – é o que vem a ser o verdadeiro amor. Se é não sei, mas ainda penso que o melhor seria virar as costas e ir cuidar da terra, como Scarlett O´Hara. Há muita terra por aí pela qual lutar. E sempre há um Rhett Butler disposto a lhe dar uma mão.
Mas acho que no meu caso não adianta mais. Desenvolvi alguma espécie de consciência com o passar do tempo – ou talvez seja algum idiótico desejo vitimista de morrer de amor. Só pode. Deve ser a idade.
Então: já que meu romantismo é tipo Scarlett O´Hara, melhor pensar nos preparativos para minha próxima viagem, e deixar para morrer de amor outra hora. Afinal, sempre há Israel.*
* Já que ninguém até agora entendeu esse fim... A última cena de E o Vento Levou é Scarlett vendo Rhett partir, sentada na escada e chorando. Ela então sacode a cabeça, levanta o queixo, limpa as lágrimas e diz: "Afinal, sempre há Tara!" - The End.