Telefones Eróticos

De uns tempos para cá os telefones públicos da cidade de São Paulo se transformaram em verdadeiras vitrines de oferta de sexo farto e variado, atendendo aos mais exigentes apreciadores do salutar esporte.

Até algum tempo atrás, coisa de uns três anos, ou pouco mais, tal fenômeno somente se verificava nos telefones localizados no centro da cidade, principalmente na Praça da Sé, Praça João Mendes, Rua Barão de Itapetininga e outros poucos lugares.

Agora não. Qualquer rua do centro exibe seus orelhões fartamente ornamentados com os pequenos adesivos brancos, onde estão escritas as mais curiosas, bizarras e variadas ofertas do corpo.

Suzie Loirinha promete que faz de tudo, desde sexo oral até o fim, e anal. Até o fim do quê? Perguntam os menos experientes, e daí até ligarem para Suzie Loirinha, curiosos em saber que fim é esse, ela já conseguiu parte do seu objetivo que é o primeiro contato. Feita a primeira ligação, na maioria das vezes o indivíduo é persuadido por ela a ir conhecê-la que ela terá prazer em mostrar-lhe pessoalmente o que ele quer saber.

Por outro lado, Akemy Mestiça não fica muito atrás de Suzie Loirinha, pois alardeia ser possuidora de um bumbum grande, anal profundo, oral até gozar e adora chupar e ser chupada e, para finalizar suas ofertas, manda gozar duas vezes e informa que sua taxa é de R$10,00.

Ah! Ia me esquecendo. No seu currículo consta também que oferece um magnífico BBC. Se algum incauto e inocente leitor imagina que esse BBC refere-se a tradicional e quase centenária emissora de rádio britânica, a British Broadcasting Corporation, está muito enganado. O BBC a que se referem as meninas da famosa e difícil vida fácil é bem outro de significado totalmente diferente.

Tati Apertadinha, procurando superar as demais, diz que é ninfeta apertadinha, oferece banho de língua e beijo molhado.

Dora Afrodite convida você a aprender sexo com ela, donde se conclui, portanto que deve ser um verdadeiro compêndio de sacanagens.

Julia Casada, ao mesmo tempo em que já dá o preço – R$10,00 – diz que rebola gostoso, chupa até gozar no rosto, é gulosa e lhe convida a conferir.

Natasha Gatinha Sex, é ativa com fantasia e, veja só, prega o suicídio, pois lhe convida a morrer de tesão com ela.

Bida Coroa, usando de sinceridade, se denomina coroa e promete oral sem camizinha (a camisinha dela é com ‘z’ mesmo), senta e rebóla (o rebola dela tem acento no ‘o’) no anal. Essa pelo menos não diz que é nova no ramo nem na idade. Mas com certeza é nova no idioma pátrio. Agora, daí até saber que idade ela tem é que mora o perigo.

Uma outra, Carol Sex, declara que tem cabelos longos, seios e o bumbum GG, pratica o oral até o fim, faz anal de 4 e, depois disso tudo, anuncia que beija na boca. Aught.

Roberta, logo de saída, estampa no seu breve currículo, que é travesti, tem 19 anos, sendo iniciante e é conhecido – ou conhecida? – como Miss Bumbum.

É isso mesmo meu amigo, ele, ou ela, é gay. Enfim, como tem gosto para tudo nessa vida, dizem os mais modernos que estes são os mais procurados.

Dentre as mais extravagantes e atípicas ofertas, selecionamos para apresentar, por último, a que se apresenta como Dupla Lésbica e que em seu pacote de ofertas, diz que, “nós se transa se chupa e deda, com você e para você”. Isso não é mais um pacote de ofertas, é sim, um pacotaço.

Assim sendo, dentro de suas possibilidades, cada uma oferece aquilo que tem de melhor.

Meus amigos, o rol de ofertas é dos mais vastos e para todos os gostos. Se numa é o bumbum que é firme, na outra é a vagina de chupetinha e noutra é a boquinha que beija molhado e tudo – como disse no início – até o fim.

Basta você se aproximar de um orelhão para utilizar-se do telefone público e logo terá sua atenção despertada para as pequenas etiquetas coladas em todos os lugares.

Umas brancas, outras azuis, algumas amarelas, uma quantidade razoável verde, enfim, é um verdadeiro festival de cores a tentar despertar a curiosidade do freguês.

Há poucos dias o doutor Antenor caiu numa esparrela dessas.

Para os que não o conhecem, informamos que se trata de advogado militante no foro de São Paulo, tanto na área cível, como na criminal e trabalhista, entretanto, apesar de fazer a chamada clinica geral, a sua preferência recai sobre a primeira, de forma que o Fórum João Mendes é o seu principal campo de ação.

Sua carteira de clientes fixos é quase que inexistente, mas, devido à boa qualidade do trabalho que efetua, bem como pela maneira educada, correta e honesta com que trata a todos, é constantemente recomendado por ex-clientes a algum parente ou amigo, de forma que tem sempre um numero razoável de processos em andamento.

Está atualmente com 50 anos de idade e é casado há mais de 20 anos, bem casado, frise-se, com D. Cleide, sua namorada desde os tempos de rapazinho lá no bairro onde moravam, em Santana.

Tem um casal de filhos, ambos já na faculdade e, segundo ele proclama, graças a Deus nenhum dos dois quis fazer direito.

Assim é que Luciana, a mais velha, está no terceiro ano de engenharia da USP, enquanto Rodrigo, o caçula, mais novo que ela apenas um ano, está no segundo ano de Odontologia, também na USP.

Esse é o doutor Antenor, advogado, um homem probo, honesto e correto tanto na sua vida profissional como na sua vida privada.

Mas, se acumulava em sua carreira muitas vitórias, também as derrotas não foram poucas e se as primeiras não o entusiasmavam, pois as considerava – como costumava dizer – apenas uma obrigação, algumas derrotas, no entanto, o deixaram abatido.

Há pouco tempo, e é por esse motivo que nos referimos no início aos telefones eróticos, este ilustre causídico tomou uma lambada para valer, quando numa causa em que levava muita fé, o juiz, ainda na audiência deu a sentença totalmente contrária a ele.

Saiu arrasado do fórum e dirigiu-se a um telefone público ali mesmo em frente, pois pretendia avisar no escritório de que não voltaria naquela tarde já que se sentia abatido com essa inesperada derrota.

Quando lá chegou, cabeça baixa, deprimido pela derrota humilhante, ao ver o quadro de ofertas das meninas colado no aparelho, decidiu que iria afogar a magoa da derrota, nos braços de uma daquelas meninas, aproveitando a oportunidade para afogar também, o ganso.

Era a primeira vez na vida, depois de mais de 20 anos de casado, que iria agir dessa maneira, de forma que estava se sentindo um verdadeiro estranho no ninho, portanto, pensou, tinha que ser coisa de primeira.

Olhou bem as ofertas, leu e releu as qualidades de cada uma e concluiu por procurar a tal de Tati Apertadinha, que se dizia ninfeta apertadinha, além de outras vantagens. Seu currículo não era dos mais extensos, mas era interessante.

Pegou o numero do telefone, ligou e esperou atenderam. Do outro lado, uma voz sensual, meio rouca atendeu e já foi dando o nome.

- Alô! É a Tati quem esta falando, boa tarde.

- Alô Tati, estou ligando, porque vi o seu nome e o que você se prontifica a fazer, num orelhão aqui na Praça João Mendes e, como estou precisando me distrair um pouco, resolvi telefonar.

- E fez muito bem amoreco. A sua Tati vai lhe atender com muito carinho e lhe dar muita alegria.

- Pois é. Só falta você me dizer quanto cobra e me dar o endereço para que possa ir até aí agora. Você está disponível não está?

- Claro meu amor e se não estivesse, gostei tanto da sua voz, que iria dar um jeito de me desimpedir.

- Então, quanto é e onde fica?

- Normalmente eu cobro R$30,00, mas como disse, simpatizei muito com sua voz meu querido e vou cobrar apenas R$20,00, tá bom assim?

- Está bom sim. Mas me diga onde é o seu endereço?

Depois que a Tati deu o endereço, que não era longe donde ele estava, despediu-se dizendo que o mais rapidamente possível estaria chegando.

Quando chegou no número fornecido, viu que se tratava de um prédio velho, de quatro andares, sem porteiro nem elevador.

Ao chegar próximo ao apartamento, situado no segundo andar, num corredor mal iluminado e meio sujo, pensou um pouco antes de bater na porta. Por fim, depois de alguns segundos de dúvida resolveu bater. Afinal já havia ido até ali e, segundo imaginava, tratava-se de jovem em início de carreira e que, com certeza, ainda não tinha freguesia para sustentar um apartamento mais condizente. Ouviu o barulho de uma chave na fechadura e logo em seguida o ranger da porta se abrindo.

Do lado de dentro do apartamento apareceu uma pessoa, ou melhor dizendo, uma figura por demais estranha.

Era loura, ou pelo menos queria ser a se concluir pelos cabelos excessivamente amarelados, quase brancos até. Vestia uma calça comprida de pano fino, toda desenhada de flores e pássaros no mais puro estilo tropicalista da década de 60. À primeira vista poderia dizer-se que aquela figura com certeza à época daquele movimento, era fã incondicional de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e outros integrantes daquele interessante movimento musical.

A blusa, contrastando totalmente, era de cores e desenhos de figuras geométricas variadas e entrecortadas, lembrando a pintura cubista de Picasso, de Braque e outros. Calçava uma pantufa de lã com a cara de um gatinho.

Enfim. Era uma figura, no mínimo excêntrica, pelo menos na forma de vestir.

Sua aparência era a de uma mulher de cerca de uns trinta a trinta e cinco anos, anos estes bastante vividos, pois estava bem gasta, por sinal.

Antenor rapidamente pensou com seus botões. Deve ser a cafetina ou a mãe, quem sabe? As coisas hoje mudaram tanto que até as mães estão se tornando empresárias das filhas bonitas, aproveitando enquanto essas ainda estão jovens. É o sinal dos tempos, a união familiar, pois a família que trabalha unida permanece unida.

- É o apartamento da Tati? Perguntou.

- Sim, e o senhor é o Sr. Antenor? Ouviu como resposta.

- Sim, sou eu mesmo. Ela está?

- Pois não, queira entrar por gentileza?

Antenor já de começo se impressionou com a educação demonstrada pela coroa tratando-o de senhor, mandando que entrasse por gentileza.

Ao entrar foi convidado a sentar-se, sendo-lhe indicado um velho sofá reformado, colocado ao lado na sala, desses de plástico brilhante, de um verde gritante e horroroso e ainda por cima, salpicado de pontinhos dourados, parecendo um céu estrelado. Evidente que se tratava de uma peça de extremo mau gosto, mas pelo menos aparentava estar limpo, pensou enquanto sentava.

Numa rápida olhada constatou que as paredes eram pintadas de um azulão anil demonstrando uma acentuada falta de gosto, no que era acompanhado pelo único móvel existente, este um armário de fórmica mais adequado a ser colocado em uma cozinha do que em uma sala.

Havia também uma mesa com tampo de fórmica, cor de rosa igual ao armário, pés de ferro e quatro cadeiras com os assentos de plástico já bastante castigado pelo excesso de uso.

Cobria o chão o que um dia foi um carpete, agora de cor indefinida, sendo em alguns locais – nos cantos da sala – cinza mais escuro enquanto que em outros – locais de circulação das pessoas – apresentava-se meio amarelado em alguns pontos e bastante sujo noutros. Em qualquer local que se olhasse, no entanto, percebia-se que tinha mais furos do que sola de sapato de pobre.

Enfim, a impressão que teve foi a pior possível, mas agora, impossível retroceder, pois já estava amarrado ao pé da fogueira, restava-lhe apenas a esperança que o material do qual ele iria se utilizar fosse de boa qualidade.

- Um minutinho só. Não pensei que o senhor viesse tão rápido.

Dizendo isso, a mulher que o recebeu na entrada encaminhou-se para um pequeno corredor e entrou numa das duas portas existentes no que parecia ser o único quarto do apartamento.

Uma outra essa na própria sala, a separava da cozinha, segundo Antenor estava enxergando, enquanto que a outra porta existente no corredor e que estava trancada, devia ser a do banheiro, deduziu ele.

Um pressentimento assaltou Antenor de imediato. Se só tem um quarto, e a mulher que me atendeu entrou nele e se trancou, logo...

Não! Recuso-me a acreditar no que me passou pela cabeça. Não pode ser.

Após apurar o ouvido, raciocinou. Não estou ouvindo nenhum barulho de conversa lá dentro, nem percebo que haja alguém no banheiro assim como na cozinha, tudo me levando a crer que só existe uma pessoa dentro de casa, alem de mim, é claro.

Sobressaltou-se. Chegou à conclusão que o pensamento que o assaltara segundos atrás estava correto. Era uma realidade e não – segundo pensou – apenas um princípio de pesadelo.

Meu Deus! Será que é o que pensei? Murmurou. Não. Não pode ser. Deus não me pregaria uma peça dessas logo depois de levar aquela porrada que levei daquele juiz. Não acredito, portanto, vamos ficar calmos Antenor que o melhor, com certeza absoluta, haverá de acontecer.

Procurava ser otimista. Mas era isso mesmo que ele havia pensado no início. Aquela era a Tati que após uma pequena reforma na sua aparência, surgia agora glamourosa, coquete e resplandecente na porta do quarto.

- Tati em pessoa, meu amor, apresentou-se ela.

Antenor estava desorientado sem saber que tipo de atitude tomar. Tinha que raciocinar rapidamente sobre o que fazer, definir com urgência um posicionamento diante dessa nova situação.

Não poderia aprontar nada que ofendesse a cidadã, pois isso fatalmente poderia extrapolar daquele apartamento e, claro, iria afetar a sua imagem de homem correto, trabalhador, sério e bem casado. Minha Nossa Senhora Aparecida, que fria eu entrei! Pensou.

Mais do que depressa se levantou daquele sofá duro e de um mau gosto chocante, meteu a mão no bolso do paletó e puxou a pequena etiqueta que havia arrancado do telefone público em frente ao Fórum, lendo-a num piscar de olhos.

- Mas aqui esta dizendo que você só tem 22 aninhos? O que significa isso? 22 aninhos de experiência ou...

- Meu benzinho, cortou a mulher. Realmente só tenho 22 anos de idade e isso posso comprovar, mas acontece que nessa profissão em que fui jogada pelo acaso da vida, a gente envelhece muito cedo, muito rapidamente.

- Queira me desculpar eu...

- Meu bem, voltou a interrompê-lo a mulher. Você sabe o que é passar o dia inteiro deitada numa cama com um homem em cima de você? Todos parecendo umas bestas humanas, só querendo saber de saciar a sua sede de sexo?

Antenor procurou impedi-la de continuar falando.

- Moça, eu...

Novamente era ela quem tomava a palavra.

- Cada um quer que eu dê o melhor de mim para satisfazê-lo e a todos eu tenho que enganar fingindo que estou sentindo prazer com aquele brutamontes em cima de mim.

- Mas eu não tenho nada... tentou argumentar ele.

- São gordos, magros, baixos, altos, brancos mulatos pretos, chineses, brasileiros, jovens e velhos, enfim, uma infinidade de tipos e, muitas vezes, um atrás do outro, mal dando tempo para que eu me refaça entre uma função e outra.

- Mas minha filha...

- O senhor sabe que alguns só gozam me dando porrada? Sabe quantos tapas já levei na cara sem poder reagir? Quantos abortos já fiz, o senhor sabe?

- Mas meu benzinho... tentava argumentar Antenor.

- Sabe da insegurança que é ir para a cama com um homem que você nunca viu e não sabe se ele tem ou não alguma doença contagiosa, inclusive AIDS?

O ambiente naquela pequena sala tornou-se pesado, mais deprimente ainda do que normalmente já era.

- Isso aqui é uma pocilga, eu sei, mas é o que eu posso pagar, disse-lhe Tati. Com o que tiro daqui é que sustento meu pai e minha mãe lá em Marília.

- Moça! A senhora já falou bastante. Agora permita que eu diga alguma coisa, pode ser?

Ela sentou-se no sofá, e logo em seguida cruzou as pernas onde apareciam claramente algumas manchas roxas ao lado de enormes placas de celulite, de forma desafiadora, disposta a ouvir o que seu ex-futuro parceiro de cama tinha para dizer.

- Muito bem minha jovem, se acreditarmos no que você asseverou quanto a sua idade, você...

- Posso lhe mostrar os meus documentos para lhe provar se você quiser.

- Vai ou não vai me deixar continuar falando? Bradou ele.

Silêncio.

- Então, como eu ia dizendo, se alguém aqui tem o direito de estar frustrado, esse alguém sou eu.

Tati tentou argumentar, mas ele ignorou e continuou.

- Afinal me dispus em vir até aqui para pagar pela contraprestação de um serviço e, no entanto, saio sem ter sido atendido nas minhas expectativas que, diga-se, a se deduzir pela propaganda pregada no telefone público que utilizei, eram das melhores.

- Mas eu estou a sua disposição, paizinho, disse ela.

- Não se trata de estar ou não estar a minha disposição, meu bem. Este é um caso típico de propaganda enganosa prevista no Código de Defesa do Consumidor e, assim sendo, não me vejo na obrigação de utilizar-me da mercadoria e, muito menos pagar por ela, pelos motivos já exaustivamente expostos.

- Quer dizer que tomou o meu tempo e vai me passar o porrete é velho?

Tati começava a engrossar o caldo.

- Velho não, reagiu Antenor.

- Velho sim e babaca que é capaz de nem ter tesão pra enfrentar uma mulher do meu tope.

- Olhe aqui mocinha, disse Antenor. Respeito é bom e eu exijo. Ouviu bem.

- Já entendi tudo, respondeu a mulher, você ou é broxa ou é bicha. Um dos dois.

O advogado ao ouvir isso, perdeu completamente o domínio de si e resolveu, como se costuma dizer corriqueiramente, apelar para a ignorância.

- Não sei onde estou com a cabeça que não lhe dou umas porradas aqui mesmo.

- Caia na asneira de tocar num fio de cabelo meu, seu velho filho de uma puta.

- E é para já, disse ele, partindo em direção a ela.

Ao chegar perto a ela e levantar a mão para agredi-la, ela encolheu-se toda, sem apresentar nenhuma outra reação. Parecia uma fera acuada, sem defesa, que já havia passado por tal situação muitas e muitas vezes anteriormente.

Numa fração de segundos, o velho advogado raciocinou rapidamente. Ele jamais havia levantado a mão para uma mulher, quanto mais para chegar a ponto de esbofeteá-la. Por que estaria ele fazendo isso agora? Será que mereço descer até esse ponto? Meu Deus, o que estou fazendo aqui neste lugar horroroso? Eram perguntas que lhe passaram pela mente naqueles poucos segundos em que esteve prestes a agredir aquela mulher.

Permaneceu com a mão parada no ar o tempo suficiente para que a mulher sentisse que ele havia fraquejado e, nesse momento, assenhoreando-se da situação, afastou-se do alcance da sua mão. Em seguida, apanhou o primeiro objeto que estava em cima da mesa de fórmica, e sentindo que era uma faca, avançou sobre ele determinada a utilizar-se da mesma sem dó nem piedade.

Ao vê-la avançando sobre ele de forma ameaçadora empunhando uma faca, Antenor, desviou-se para o lado numa rapidez que nem ele mesmo imaginava possuir e sentiu o vento dela passando ao lado dele em direção à porta da rua.

A velocidade e a força que imprimira ao seu braço eram tão grandes que ela somente parou quando encontrou pela frente a porta da rua e nela enfiou a faca com toda força. Sendo a porta como era, oca e de péssima qualidade, a faca traspassou-a com facilidade e nela ficou presa.

Quando percebeu isso, Antenor, novamente numa rapidez de fazer inveja a um garoto de quinze anos, levantou-se do sofá onde havia caído sentado, passou a mão na sua pasta que estava sobre a mesa, fez um rápido levantamento da situação, e num salto estava junto à porta com a mão na maçaneta tentando abri-la.

Enquanto isso, ao seu lado, a mulher tentava a todo custo, arrancar a faca encravada na porta.

Quando Antenor finalmente conseguiu girar a maçaneta, abriu a porta num só tranco lançando a mulher para trás, estatelada no chão.

Ganhando o corredor, ele pôs-se a percorrê-lo em desabalada carreira sem sequer olhar para trás, e assim continuou escada abaixo, até que se viu repentinamente na calçada da rua.

Suando bastante e com a respiração ofegante, sentiu que precisava urgentemente beber um pouco de água. A sensação que tinha era a de que os pulmões estavam próximos a sair-lhe pela boca a qualquer instante.

Viu um bar do outro lado da rua e pensou em atravessá-la para, no bar, beber um pouco de água, sentar-se para descansar um pouco. Mas, subitamente, veio-lhe a cabeça a imagem daquela mulher enfurecida com a faca na mão, encaminhando-se em sua direção.

Tal pensamento fez com que desistisse por alguns instantes daquela idéia e, mais apressado do que pobre quando passa em frente a shopping center, sinalizou para um táxi que passava por ali e embarcando, mandou o motorista dirigir-se a Praça João Mendes.

Quando lá chegou, após pagar a corrida e antes de fazer qualquer outra coisa, dirigiu-se até o telefone público mais próximo e, localizando uma propaganda de Tati, raspou-a com a unha, até sentir que não restou o mais leve vestígio daquela etiqueta e só então se deu por satisfeito e, o que é melhor, sem o menor sentimento de culpa.

Após isso, sentiu-se em condições de dirigir-se até um bar próximo, pedir uma garrafinha de água mineral e sorvê-la quase que de um gole só.

S B Braga
Enviado por S B Braga em 27/05/2011
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