As pálidas sereias

As pálidas sereias… aquelas de sorriso branco e pontiagudo. Aquelas de vestido vermelho e esvoaçante, de olhar demente e alegre, aquelas de entrega.

Aquelas de intriga.

Elas entram dançando, sempre dançando, e rindo muito alto. Gargalhando.

As pálidas sereias… elas cativam. Trazem-lhe para perto, mais que perto… e então arrancam seu coração com golpes de delicadeza. Devoram-no obscenamente.

Diante de você.

E eis que um dia você acorda e sente falta da música que costumava esvoaçar como mosca ao redor da sua cabeça. Elas sempre se vão, as pálidas e impiedosas sereias, levando consigo todos os seus sinais.

Você se senta à janela da frente por dias inteiros, esperando, antes de perceber que é inútil.

Depois, você passa a encarar sempre a mesma folha de papel em branco – a certa altura, já suja de café e cinza de cigarro – perguntando-se em que maldito canto estaria escondida sua arte, antes tão companheira e prestativa.

Só quando percebe que ela também se foi, com sua pálida, impiedosa e sorridente sereia, é que você percebe que restou nada, ou muito pouco.

Então, pobre alma, você se despe de todo o seu orgulho e de toda a sua dignidade, e vive a implorar a ela para que volte.

Mas elas, as pálidas e impiedosas sereias, nunca voltam.

Não por você.