Entre as Cidades Mortas e o Vale do Café
Povos que não têm raiz e identidade, que não preservam a cultura de seus antepassados e sobretudo, desconhece sua história, sempre será povos e nunca, jamais, nação.
Embora ladeado pela montoeira de aparatos tecnológicos que o consumismo moderno impõe o uso e consequentemente, fator dissociativo do legado familiar / histórico, certamente, o leitor já ouviu falar como seus antepassados superaram as adversidades espinhosas, bem como, os obstáculos pedregulhosos nas estreitas trilhas do tempo.
Mesmo porque, na época dos "Homens Inoxidáveis", tempo que remonta o próprio tempo, tudo era sombrio, sofrido, trabalhoso; e não havia meio termo, muito menos, meio caminho andado: ou devoravam os "leões perigosos e famintos" encontrados nos caminhos e estradas, ou seriam devorados por eles.
Água, Objetos cortantes, Trilhas de terra batida, Tropas de Muares e uma ou várias Ermidas, exatamente nessa ordem, assim começava a história de um povo, de um vilarejo, de uma cidade.
Obrigatoriamente, não foi diferente com o Vale do Paraíba; região que geograficamente, inicia às "margens" do rio do Paraíba do Sul, que nasce em Jacareí, município de São Paulo e após percorrer, silenciosamente, vagarosamente, muitos quilômetros, desmontam suas águas, que já foram turbulentas e ruidosas, no Oceano Atlântico, Rio de Janeiro.
Ao longo do percurso citado, o primeiro povoado a ser formado, foi o atual município denominado Taubaté; palavra indígena que significa "aldeia assentada no alto".
Estrategicamente encravado, de um lado no sopé da serra da Mantiqueira e no lado oposto, pela serra que dá acesso ao litoral paulista, de Taubaté saíam os aventureiros bandeirantes à procura dos caminhos que os levassem às minas; prioritariamente, aos cafundós das Minas Gerais.
Atuais caminhos da Estrada Real, os aventureiros abriam à força, as estreitas trilhas que costuravam as matas fechadas das terras altas. Por qual motivo? Sobretudo, porque enriquecer era a palavra de ordem e para se chegar ao ápice da riqueza, os metais cobiçados eram o ouro, a prata e em último caso, os diamantes e outras pedras preciosas.
Enquanto os homens subiam as serras, o rio Paraíba permanecia avolumando-se suas águas com as muitas nascentes que emergiam das profundezas dos alcantilados e colinas da Mantiqueira; bem como, recebia as águas vindas dos rios Paraitinga e Paraibuna; afluentes que nasc(iam)em no lado oposto.
Semelhante ao rio, os povoados iam descendo as ribanceiras, esparramados pelas suas margens, sentido o litoral Sul. Para trás ficavam os pináculos da Mantiqueira; porém, o majestoso Paraíba seguia, literalmente, ladeado por elevados montículos e cocurutos montanhosos.
Caracterizado pelo império como Parque Nacional de Itatiaia, na unidade de conservação ambiental que guarda o maciço rochoso Pico das Agulhas negras, com mais de 2700m de altitude acima do nível do mar, também encontra-se o Marco dos três estados, ou seja, o marco limítrofe entre os estados paulista, mineiro e fluminense.
Portanto, a civilização exploratória, tanto econômica quanto ambiental, seguia a passos de gigante. Aliás, ratificando a tese, desde os tempos imemoriais, o homem sempre foi e continuará para todo o sempre, explorador de sua espécie; porém, nada se compara a exploração do homem à Natureza.
Nessa batalha inglória pela sobrevivência e acúmulo de bens materiais, os mansos não ganham nada; muito menos, herdam alguma coisa de outrem, que não pertença ao mesmo tipo sanguíneo.
O Brasil mudava, radicalmente; e por volta de meados do século XVIII, a capital do país mudara de quadrante, indo ancorar-se no Rio de Janeiro. Com a mudança, levou junto o pequeno porto que ficava em Paraty mirim; e dista(va), aproximadamente 10 km da atual cidade histórica Paraty, que em linguagem indígena significa, "rio de cardumes de peixes parati".
As minas dos diamantes, das pedras preciosas e as Minas Gerais do ouro, começavam 'fracassar', destarte, fazia-se necessário à Monarquia e investidores buscar outras maneiras de exploração da terra; afinal, toda riqueza era (de lá para cá, pouca coisa mudou) retirada do Meio Ambiente. Eis que entra em cena os barões explorando a terra para a cultura de café.
Embora não divulgada, a primeira lei do capitalismo recomenda que, onde não há retorno financeiro, não se deve colocar dinheiro; fator, plenamente acatado pelo obediente investidor. Minuciosamente estudado a questão, desde a climatologia regional, até o mercado consumidor, cobrindo grande extensão territorial, as primeiras mudas de café foram plantadas nos limites divisórios entre São Paulo e Rio de Janeiro; mais exatamente entre a serra da Bocaina em São Paulo e incluindo a Das Belezas, no conjunto de serras que dão acesso à chamada Baixada, ou Sul Fluminense.
Entre as Cidades Mortas e o Vale do Café, havia uma linha férrea, um rio e muitas trilhas que davam no porto de Paraty mirim; contudo, com a mudança da capital do império de endereço, uma maior que as demais, seria necessário.
As cidades mortas estão vivas e respiram por aparelhos. O vale do café sumiu e a linha férrea foi desfeita. A longa trilha alargou-se, alargou-se tanto, que virou rodovia. Sobrando o rio, que está quase...