Sonho de Ângelo Écaro
O grandioso sonho de Anjo (simplificação de Ângelo) de ser milionário foi menor que o labor dispendido para tal finalidade. As más línguas dizem que não conseguiu superar os fortes ventos dos lugares por quais voava em sonhos; e na debicada quase fatal, aterrissou de cabeça em solo pedregulhoso - por sorte, o local não era reservatório de água - quebrando as asas.
Hoje é Ângelo de pernas e asas (não é conveniente engessar costela) engessadas. Logo irei visitá-lo no hospital de animais, almas e aves penosas.
Por enquanto, boa recuperação; e por favor, voltando à normalidade, quando as asas estiverem perfeitas, novamente, voe rasante ao chão e sonhe menos com às alturas, amigo Anjo.
Às vezes, querer além do necessário, buscar o que está fora do alcance das asas e pernas, riqueza demais é miragem, ou pesadelo de uma mente fóbica por enriquecimento através do mínimo esforço; o que é possível através de herança, somente.
Há sim, assado!
Contando os segundos para o semáforo abrir para pedestres, a dona Vaca destarrachou os chifres e o rabo, colocou-os na bolsa e de lá, retirou os fones, colocou-os com cuidado nos ouvidos, ajustou a rádio na frequência exata e numa espécie de transe transcendental, dançou samba-rock. Transeuntes perplexos.
O verso de Fernando Pessoa cita "tudo vale a pena, se a alma não é pequena." Como passei lá no momento que a dona Vaca publicava ser pé de valsa, admito que o poeta português está certíssimo; pois Eu e a dona Vaca possuímos almas e corações imensos; e não vê quem não tem olhos sensíveis para isso ou a quilo. Assim, assado!
Aliás, o "há sim, assado" é o latido em forma de fala (antropomorfismo?) dos cães com os corpos arriados sobre as patas no piso frio, babando ao ver o cheiro dos galetos girando nos espetos nas máquinas de assar.
-huuum, deliciosos! E lambe os beiços.
Mais uma vez Pessoa, até para os cães sarnentos tomba-latas de rua, tudo vale a pena. Porém, no caso dos cães de rua, tudo vale a pena se a fome não é pequena.
Um dia quem sabe, os cães colocarão coleiras em seus donos e darão para Eles, o mesmo tratamento que recebem. Imagino os homens caminhando à gatinhas. Sabe Pessoa, cada espécie animal com seu sonho, que nada mais é, sentimento de vida.
Finalizando, Eu e os demais protagonistas desta estória transformada em pequena missiva, concordamos que enquanto fazem da vida, velório, o cemitério de covardes, vitimistas e mentirosos, é o fracasso.
Esses, essas, aqueles e aquelas compõem a minha sociedade. Sociedade a qual pertenço, contudo, garanto-lhe que não sou sócio participante dela. E essas estórias cotidianas servem-me de inspiração, afinal se uma Vaca dança, por quê minha pena, sem pena, não pode devanear em cima de folhas de papel em branco?
P.S : desculpe-me Pessoa, mas confesso-te que dialogar, dar voz para certas mentes, é mais que gastar saliva, inutilmente, é desperdício de anos, décadas de conhecimento vivencial.
O conteúdo experimental entrará nos ouvidos e sairá soprado pelo ânus.