Herança Paterna
Isaias Alves da Cruz, da área de solda, natural de Assú/RN, filho de Francisco Belo Alves da Cruz e dona Maria Alves da Cruz; naturais de Itajá/RN, mas residentes em Assú há meio século, é o entrevistado deste mês para o Perfil do Trabalhador.
Por influência paterna, vendo seu pai tocando gaita (vialejo, no nordeste) nos eventos da região, adquiriu o gosto pela música instrumental desde cedo. Seu pai tinha fama na região, mas levava uma vida desregrada influenciado, talvez, pelo próprio ambiente da noite nos bales (sic); animados por triângulo, gaita e zabumba. Era uma farra só e era disso que ele gostava... Seu estilo preferido era o chorinho e o forró pé-de-serra.
Comentava com sua mãe o interesse em aprender a tocar algum tipo de instrumento e ela, apesar da preocupação em vê-lo seguindo os passos do pai; dominado pela bebida em sua juventude; comprou-lhe uma flauta doce. Mas ele não se identificou com o instrumento. Este, porém, aproximou-o de um vizinho que tocava violão. Aquele instrumento, sim, começou a interessá-lo. Não que o violeiro tocasse bem, mas era um som que lhe agradava.
E como em terra de cego quem tem um olho é rei, passou a ser seu referencial, seu ponto de partida. O outro, vendo o seu interesse, intermediou uma negociação para que ele pudesse ter seu próprio instrumento. Não foi uma boa aquisição, pois o violão estava empenado.
Mas foi nele que praticou, ajudado por José Natanael; outro vizinho seu e o melhor seresteiro da região, nas palavras de Isaias. Natanel, como é conhecido e prefere ser chamado, foi seu mestre na arte de dominar o instrumento e o palco. Tanto que o liberou para apresentação pública somente quando constatou que ele estava realmente preparado.
A vontade de aprender era tão grande que, após o expediente na Cerâmica; de onde tirava seu sustento, suas noites (tirando o período reservado para dormir) eram exclusivamente dedicadas ao violão. Pelo menos duas ou três vezes por semana era comum tocar até as três da manhã quando teria que levantar às cinco horas para trabalhar; outro motivo de preocupação e censura da mãe que via nisso um vício incontrolável.
Só não ficava todas as noites nesse ritmo porque seu corpo não agüentava, mas o desejo era grande.Dominou finalmente o instrumento aos vinte anos de idade, após três anos de intensa dedicação. E o violão, mesmo empenado, dava o recado direitinho; devido, é claro, à manha adquirida no seu uso. Ninguém percebia, mas só ele sabia que tirava leite de pedra.
Seu primeiro teste de fogo foi com Cabral nos anos noventa. Músico experiente e vocalista da banda Circuito Musical - no auge dela, deu seu aval ao novo instrumentista. Cabral ainda canta nos bares de Assú e os dois são agora colegas de profissão.
Começava, a partir daí, uma nova etapa na vida de Isaias. Vencida a fase da preparação, Natanael passou a ser seu parceiro fiel como vocalista. Desde então, eles vêm se apresentando como profissionais no gênero MPB, juntamente com Nonato.
Em 2000 participou de um concurso em São Paulo e, entre trezentos violonistas, classificou-se em quinto lugar. Em 2002 gravou um CD em parceria com Pequeno Cavadão do grupo Concha Acústica.
A frente da casa de Natanael, na rua João Pessoa, nº 1152, é considerada a calçada da fama de Assú, por ser um ponto de encontro dos artistas da cidade: vocalistas, instrumentistas, poetas; geralmente nas noites de sexta-feira e no sábado durante o dia.
Isaias faz questão de frisar que, apesar de freqüentar as noites de braços dados com seu companheiro inseparável; um novo violão (presenteado por Wilde, filho de Dinard Diniz), nunca aderiu à bebida. Sua mãe, portanto, pode ficar tranqüila por não ter estrangulado o dom do seu filho; a melhor herança do pai!
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Publicado no Jornal TERMONOTÍCIAS; edição nº 14, referente ao mês maio/2007 (informativo da obra Termoaçu, no município Alto do Rodrigues/RN; iniciativa da Construtora Camargo Corrêa)