MAIS UMA CONTAGEM

MAIS UMA CONTAGEM

(das velas do bolo às vielas desse "bololô")

No último outono,

eu contei a queda

de arbóreas clorofilas

no movimento

de eólicos braços,

percebi o desfolhar do tempo

nas folhas dos calendários:

da natureza das árvores,

como seus esmaltes verdes

a se desbotarem de seus dedos,

da natureza dos homens

como resina que empalidecia

suas folhas de papel

e caia das mãos das paredes.

Tudo na simetria

de uma nova translação,

na balé giratório

da terra com o sol

que ao

queimar a tez da face

da terra onde pisamos,

bronzear a nossa face,

encerra mais um ano

e nos compele

a trocar a pele.

E com isso

se faz dança

igualmente circular

dos ponteiros das horas,

que organizam o bailado

tão grande e di-minuto

nas voltas analógicas,

segundo e

seguindo

o desígnio

da órbita cronológica.

É um passar da vida,

como um ferro de passar,

que ao suprimir

os velhos vincos

das armaduras

da existência que nós usamos,

só fez imprimir

os novos vínculos

das dobraduras

das experiência que passamos,

nas dobradiças

das portas que entramos

dia a dia

à caminho da luz,

no fim do túnel do tempo

onde nós atravessamos.

E assim se faz cada

contagem,

nas areias inquietas das praias

e de outras ampulhetas.

Contamos o verde

da esperança,

esperando

o amadurecimento

do fruto,

contamos as frustrações,

as lágrimas, as dores, ...

a partida de quem

um dia também contou

e a saudade que nos legou.

Contabilizamos também

sorrisos, regressos,

realizações, ...

amores que se foram,

que ficaram

e que se vão,

nesse vão

repleto de flores a se

despetalarem

para que novas possam

despertarem

numa outra estação.

Contamos

tudo o que a travessia

nos ensina a contar

como aquele matemático,

beduíno

no deserto que andava

desde

menino

até

o homem que calculava.

Contamos,

calculamos,

contabilizamos,

inventariamos ...

não importa o verbo

que empresta

suas flexões

de tempo

no tempo

das reflexões,

na curva

cheia de inflexões.

Contamos porque

a despeito de tudo:

das guerras,

da fome,

da desesperança,

da pandemia com

o arrefecimento da calma,

do isolamento da alma

e do corpo,

na terapêutica

da solidão,

percebemos

um coração

num sanguíneo ciclo

de ir e vir,

cumprindo o horário

de existir

nos chamando

nesse pulsar

a celebrar

em silêncio

mais um aniversário

mais uma passagem,

um novo e necessário

exercício de contagem.

Leonardo do Eirado
Enviado por Leonardo do Eirado em 01/05/2021
Código do texto: T7245381
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