HISTÓRIAS DE UM MUNDO DESCONHECIDO
HISTÓRIAS DE UM MUNDO DESCONHECIDO
Nelson Hoffmann
Para mim, pelo menos, é um mundo desconhecido. Figura no vale dos rios Araguaia e Tocantins e dele tive, por certo, vagas notícias em velhos tempos de escola. Depois, por certo ainda, foram-me passadas referências também vagas, aqui ou acolá. Tudo jamais atentado, pois que se falava de um mundo ignoto e não sabido.
É o mundo de Moura Lima.
Jorge Lima de Moura, o Moura Lima da literatura, nasceu na Fazenda Capim-Puba, hoje Heitoraí, no Município de Itaberaí, Goiás. Advogado e Agrimensor, é especializado em Direito Processual Civil e pós-graduado em Língua Portuguesa. Integrante do serviço público federal, executou projetos fundiários na região que hoje faz parte do Estado do Tocantins.
Como personalidade cultural, Moura Lima participa de academias, institutos e associações. É sócio fundador, é membro efetivo, é associado correspondente. Recebeu comendas, diplomas e prêmios, sendo referência em dicionários, enciclopédias e críticas literárias especializadas. É um nome literário que se impõe por seu valor.
A obra de Moura Lima espraia-se por vários gêneros: romance, conto, ensaio, poesia, teatro. Em todos, consolida-se em qualidade e quantidade. Sobressai-se, porém, no conto e no romance. Nestes, é ímpar.
Destaquem-se os romances e livros de contos, por ordem cronológica de publicação: “Serra dos Pilões” (romance) – 1995, “Veredão” (contos) – 1999, “Mucunã” (contos) – 2000 e “Chão das Carabinas” (romance) – 2002. Observe-se a compassada seqüência das publicações e tem-se o vislumbre de uma segura disciplina de realização. TEXTO EXTRAÍDO DO NOVO LIVRO DE NELSON HOFF.
Realização que é uma perquirição. Perquirição que é o aprofundamento de uma temática bem deline-ada. Este aprofundamento de uma temática, e seu detalhamento, torna-se ainda mais evidente quando se aten-ta para os subtítulos de cada um dos livros mencionados. Veja-se que “Serra dos Pilões” é sublinhado com “Jagunços e Tropeiros – Nos Sertões do Jalapão”; “Veredão” é clareado como sendo um livro de “Contos Regionais e Folclóricos”; “Mucunã” explica logo que o seu conteúdo é feito de “Contos e Lendas do Sertão”; por fim, “Chão das Carabinas” anuncia “Coronéis, Peões e Boiadas”.
O cenário das histórias de Moura Lima é o vale dos rios Araguaia e Tocantins, nos sertões do atual Estado do Tocantins. Em “Serra dos Pilões” temos uma espécie de apresentação, o panorama geral das paisa-gens e gentes que são/serão o tema da ficção de Moura Lima. O próprio “Serra dos Pilões” é palco e ação. Depois, com “Veredão”, em histórias bem urdidas, o desvelamento da alma popular da região, em comunhão com o seu habitat. Já em “Mucunã”, a par da alma popular tocantinense, o autor avança para as origens míti-cas que movem o homem e explicam a paisagem.
Esse conjunto de três livros já foi classificado como a “Trilogia Tocantinense” de Moura Lima. Pare-ce, no entanto, que o autor não parou por aí e está avançando. O seu recente “Chão das Carabinas” é um passo à frente. Com ele, o autor assume um novo enfoque, envereda por um detalhamento a mais na perquirição do conhecimento da terra e gente tocantinense. A história é verídica e relata a violência que está na formação de tantas e tantas comunas brasileiras. Em especial, nessa região do centro-oeste, onde o sertão é o mundo. Aos poucos, pelo que vejo em mim, no que estou rabiscando agora, esse mundo desconhecido já não me é mais tão desconhecido assim. Da leitura da obra ficcional de Moura Lima, ele brota vivo. E a gente mergulha nele, de corpo e alma, por força da própria escrita do autor.
Moura Lima é um escritor regionalista. Por temática e estilo.A temática é bem definida, aborda a re-gião do atual Estado do Tocantins. O estilo incorpora o linguajar do povo, recriando o mundo e a fala em nível de universalidade. É o retrato do ser humano, que é sempre o mesmo, quer na metrópole quer nas bre-nhas. Há influências, sim, e estas aparecem e distinguem, conforme o local; mas, o essencial é permanente: amor, ódio, doação, traição, ternura, violência...
Tudo isso é um pouco do mundo de Moura Lima.
De minha parte, preciso declarar, em profissão de verdade, que eu jamais ouvira falar de uns tais ser-tões do Jalapão. Também devo acrescentar que eu não tinha a mínima idéia de qualquer lenda, mito ou folclo-re do vale dos rios Araguaia e Tocantins. Até mesmo, eu desconhecia bandidagens e coronelismo por aquelas paragens. A paisagem era-me outra, a humanidade inexistia...
Reconheço, não há como fugir: esse mundo não me parece mais tão desconhecido quanto era. O con-trário, até. Era-me desconhecido, não é mais. Já o discuto, sobre ele rabisco. Familiar?
Não, não, tanto não. Mas, que o Moura Lima ajudou a decifrar esse mundo desconhecido, ah! isso ajudou. Não fossem as suas histórias...
*Texto extraído do livro “UMA OUTRA FACE DO POETA”,ONDE O AUTOR homenageia o escritor tocantinense Moura Lima.
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Autor de Eu Vivo Só Ternuras
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