ATÉ QUANDO TEREMOS LEIS QUE DESCARTAM CONCEITOS CONSUETUDINÁRIOS E MALTRATAM SEU PRÓPRIO SEU POVO?

ATÉ QUANDO TEREMOS LEIS QUE DESCARTAM CONCEITOS CONSUETUDINÁRIOS E MALTRATAM SEU PRÓPRIO SEU POVO?
 
Imaginemos uma situação em que estejamos em um vilarejo que cresce rapidamente à margem de uma estrada sem asfalto ou qualquer tipo de beneficiamento, como poderemos perceber em muitos locais do imenso interior do nosso País continente, que é o Brasil.

Nesse local imaginário, nós teremos poucas unidades escolares, quando não apenas uma. Mas é bom frisar que essa escola precisa estar edificada em um determinado local do vilarejo, o qual se vê cortado pela necessária estrada, já que é por ela que podemos entrar e sair, buscar e levar suprimentos ou tudo que se industrialize ou comercialize.

Mas o corpo discente e docente daquela nossa escola imaginária precisa se deslocar cotidianamente, dos seus lares para a escola e vice-versa. E nem todos esses participes estarão morando no mesmo lado do vilarejo, onde estará edificada a unidade escolar.

E nós precisaremos, eventualmente atravessar essa estrada, que não é pavimentada, mas apenas beneficiada com cascalho ou outros tipos de material rochoso granulado, que não facilita que a mesma seja adequadamente sinalizada, como preceitua a Lei de Transito em vigor.

Como poderemos impor regras ou exercer direitos sociais, necessários para o gozo do direito de ir e vir, tão decantado em nossa constituição federal, numa localidade que prescinde de estrutura urbana condizente com as suas necessidades? Como ter faixa de transito para pedestres, se nem mesmo temos a via asfaltada, a qual também é uma via rural, que por mero acaso ou presunção de quem a planejou, também serve a todos os cidadãos, mesmo aqueles que não moram naquele vilarejo, pois propicia o trafego de veículos e pedestres os mais variados, sejam bicicletas, motocicletas, ônibus, vans, tratores, carretas, caminhões, cavalos, carroças e também os seres humanos, mesmo aqueles que necessitem de apoio para se locomover, como são os cadeirantes ou os que usam muletas.

Vejamos como o mundo convive perfis sociais e de estágio sócio econômico bem diferentes, mesmo aqui no Brasil. O sertão nordestino ou a grande floresta equatorial têm perfis demográficos e sociais que demandam um ritmo de vida bem diferente das área litorâneas. Em alguns bolsões do nosso grande País, temos expectativa de vida que não chega a 60 anos, quando já se fala que, no geral, o brasileiro já está num patamar de 73 a 78 anos, nessa segunda década do século XXI.

E como ficam as leis, que tentam criar padrões nacionais sem buscar entender toda essa mescla social, que na sua capilaridade multifacetada de culturas, ainda sofre com um sistema econômico que só tende à concentração de renda, como se fossemos um rio que unicamente só joga suas águas para o oceano, sem dar suporte a nenhum outro rio, riacho, igarapé ou sistema de irrigação, sem produzir energia, sem ter barragens, sem servir para o abastecimento de água potável dos locais urbanizados que margeia.

Nossas leis são rígidas demais, muito embora elas também são feitas cheias de escapes ou com as tais das regulamentações, que foram instrumentos criados para beneficiar a poucos, principalmente para quem é detentor do poder político e econômico, deixando de fora dos benefícios da lei os menos abastados, tanto de dinheiro, como de estudo, fazendo com que o brasileiro, em sua maioria de baixa escolaridade e malícia, tenha que se aceitar conhecedor na integra de tudo que legalmente é publicado, como se isso fosse fácil ou prático.

Parece até piada, mas sempre nos foi divulgado de que Lei publicada em diário oficial não é dado o direito de desconhecer, num país de tantos códigos e artigos, de tantas normas e pareceres, que nem mesmo os mais letrados podem se dizer conhecedores de tudo.

As Leis de transito sofrem mudando quase todos os dias, deixando os condutores cada vez mais reféns do desconhecimento do que pode ou não praticar. E os órgãos policiais continuam com os estigmas de militarismo, quando deviam ter um vinculo muito maior com as comunidades, sendo suas parceiras e não inimigas. Orientando e ensinando o povo de como se deve praticar a cidadania traz muito melhores resultados do que o mecanicismo punitivo, sem se buscar o necessário papel preventivo e educativo.

Olhemos exemplos de locais em rodovias sinalizadas que, eventualmente tiveram desativadas ou ativadas unidades comerciais ou industriais às suas margens. O que percebemos é que os órgãos responsáveis pela manutenção ou patrulhamento policial de certos locais não são ágeis o suficiente para readequar esses locais, fazendo as modificações necessárias para manter ou aprimorar a segurança pública ou veicular, mas teimam em realizar fiscalizações punitivas como se valessem apenas o que está no visual, banalizando a realidade em prol de uma suposta legalidade.

Do mesmo jeito que Otto Adolf Eichmann, o nazista que compactuou com o holocausto judeu, agiu, nós parecemos que estamos agindo, sob a égide da "banalidade do mal", pois estamos apenas criando leis e as buscando cumprir, sem ao menos as questionarmos, já que o nosso sistema político e jurídico fazem leis não plebicitárias, ao largo do saber ou acompanhar da maioria da população brasileira.

E o que vemos é essa mesma população não ser preparada ou instruída de como cumprir tais leis ou até mesmo se ela concorda com tais leis. Afinal, o que são o legislativo, o executivo e o judiciário, senão servos do povo? Quando será que realmente teremos leis que sejam para o benefício geral da nação, já que o que percebemos são congressistas que só votam seus próprios interesses?

Mas não parece que é assim que as coisas acontecem, pois temos boa parte desses ditos servidores públicos, os quais se acham vestidos em capas ou mascaras de super heróis, e que não devem explicações ou contrapartida a ninguém. E assim, cumprem as leis sem esse olhar consuetudinário. Sem olhar o quanto de força se deve colocar no martelo para fixar um prego, pois se batermos muito forte, talvez a madeira não suporte e lasque. Pois o elástico que se estica demais um dia perde a sua elasticidade e não segura mais nada.

Imaginemos um lugar em que todos vivam sem energia elétrica, internet, água e esgoto tratado, casas com certificação do CREA, sem escolas, sem botijões de gás e também sem estradas construídas com padrões legais, exercendo o direito de ir vir apenas por vicinais maltratadas ou caminhos, cheios de atoleiros ou espinhos, como na região amazônica ou em locais ermos da caatinga nordestina. É bem provável que nesses locais a Lei constitucional brasileira nem exista, de fato.

Mas, num certo dia, acordam todos vendo viaturas e funcionários governamentais chegarem e lhes cobrarem tudo, desde o pequeno pássaro na gaiola, ao uso do fogão à lenha, que gerou desmatamento, ao título da terra, ao licenciamento da motocicleta que foi comprada a tempos idos e que tem seu combustível fornecido por aventureiros que passam por ali, ao retirar da água do rio para irrigação sem autorização do órgão ambiental, buscando os tíquetes de votação da última eleição, os CPF e RG atualizados ou cobrando que os jovens estejam matriculados regularmente em escola pública, a qual ali não existe. E tudo isso, vindo de alguns servidores públicos que eventualmente ganham gratificações ilegais, como os famosos auxilio moradia ou auxílio paletó, ou até ganham acima do teto constitucional.

Como entender o escarnio daqueles que ali chegam, se sabem que o Estado ali não esteve antes? Como cobrar algo que não demos a mínima condição para cumprir? O que esperar do brasileiro pobre e comum, negro, índio ou mestiço e não europeizado, que descende de quem também não teve chance alguma de romper a supostamente extinta escravidão que perdurou no Brasil até 1888, se não lhes dermos o apoio necessário para romperem os elos e correntes desse passado tenebroso?

O que vimos realmente, foi os escravos serem libertados para se verem à própria sorte, saindo das senzalas com uma mão na frente e outra atrás, como diz um ditado popular. E mais que isso, sem instrução alguma, todos analfabetos, todos sem assistência à saúde ou sem um lugar para morar, uma cama para descansar. Todos sem destino, sem qualquer apoio ou indenização para o recomeço, que traz suas consequências até os dias de hoje, nesse Brasil de favelas e palafitas, que não aterrou o fosso que separa a pequena elite dos demais brasileiros, mas que ainda se vê com setores sociais que não foram escravizados a reclamar ferozmente contra todo e qualquer benefício que vá para os pobres e ex escravos, sejam esses pela via dos pais ou dos antepassados.

Estamos num País que paga mau e cobra caro, e os impostos bitributam a tudo. Onde salário é considerado renda e sofre imposto. Onde um cidadão comum tem que trabalhar toda uma vida se quiser comprar um carro ou uma casinha, morrendo à mingua, sem saúde pública, sem educação de qualidade, e vivendo como ratos nos esgotos, sobrevivendo das migalhas ou do lixo que é descartado sem o devido tratamento, pela elite consumista e perdulária que assola e suga o sangue do País, como se vampiros fossem.

Algo me diz que estamos sentados numa bomba relógio, mas só não sabemos para quando ela está programada para explodir. Espero em Deus, que todos aqueles que se julguem cidadãos de bem, mas que o sejam com exemplos de vida, estejam buscando fazer desse País um local mais justo para vivermos, evitando que essa bomba não seja uma mina em que pisamos e que nos impede de nos locomovermos, sob a pena dela explodir e nos levar juntos, como um furação leva tudo que acha pela frente.

Publicado no Facebook em 02/07/2018