Margem

Quando trabalhamos com a ideia de margem, podemos estar diante de um argumento crucial na tentativa de criar novas perspectivas acerca de uma relação. Se pensarmos no sentido geográfico, onde consideramos, no sentido hidrográfico, uma proximidade entre água e terra, levando em consideração, rios, lagos, mar, elucidaremos uma paisagem que interessa ao argumento aqui apresentado.

Uma margem surge do encontro entre partes distintas, formando assim uma linha de demarcação, que serviria de limite para as respectivas distinções. Mais do que demonstrar lados opostos, também cria uma relação entre as partes, criando uma espécie de simbiose, onde o deslocamento para uma das partes, favorece o predomínio de um estado em detrimento de outro. A linha que forma a borda, seria esse momento relacional, aparecendo como uma terceiro elemento ou objeto de transição. Ela que determina a partir de que ponto um e outro vão se sobrepor, respeitando a força das singularidades, ao mesmo tempo em que forma um ambiente relacional, que tenta se passar por neutro, embora tenha a força suprema das resistências, que é uma exigência do equilíbrio.

A linha aparece como atrito máximo, a ponto de criar uma fusão que aparece como fissura. Representa a extrema separação a partir de um objeto de união. Favorecendo enganos acerca desse conceito que é de um ativismo político essencial para compreensão das relações sociais. Muitas vezes a utilização do argumento, dizendo “à margem de”, faz com que se estipule um limite e a noção de quem faz parte ou não dele, como se determinasse que ele regularia qual dos dois lados seria o “correto” em uma conotação de poder, onde o domínio se exerce como forma de direcionamento, na dualidade entre dominante e dominado.

O ledo engano se forma a partir desse reducionismo de segregação. A margem demonstra mais do que um limite, já que abre um horizonte, que seria o entrecruzamento dos limites e o fornecimento dessa terceira via, onde uma amálgama escaparia das visões dominantes e se daria em um plano mútuo. Uma linha não surge como elemento posto sobre dois conflitantes, mas sim como resultado do extremo conflito. As laudas que não nos deixam mentir, criando a relação entre o que está escrito e o que foge do papel, o que faz com que possamos transportar essas janelas para diversas dimensões, a ponto de podermos nos observar sob essa perspectiva de moldura.

Imaginemos que um molde é a forma de territorializar e ao mesmo tempo desterritorializar a partir de suas linhas flutuantes. Se faz barreira quando nos aprisionamos em concepções de rígida alteridade, onde focamos a diferença e sustentamos a severidade do limite como imposição daquilo que escapa e consequentemente se torna estranho ou conflitante. A questão é não estar mais à margem e sim na margem. Como a linha do horizonte que se apresenta como pontos de fuga. A urgência desse objeto de fuga se faz inclusive na cartografia, onde marcos políticos, são cortados por linhas afiadas. Mas do que nos determos nas fatias, que exaltam a desfragmentação, é possível deslizar pelas linhas e buscar essa relação de não corte, onde se torna essencial a presença de qualquer uma das interfaces.

Volto a salientar que não se trata de uma relação parasita e sim de simbiose. Misturar-se é perder a própria referência, ambos expostos e dispostos, diluindo a segregação e fazendo com que as linhas se espalhem, mas de forma rizomática, espalhando-se a ponto de tornar o perímetro confuso, como se metamorfoseasse em malha, aumentando os focos relacionais, já que a falta de limites pode justamente ser uma limitação fundamentada, a ponto de não mais conseguir enxergar algo que lhe seja marginal. A problemática que envolve a própria linha, que se fragmenta em micro margens, em trocas vorazes entre reciprocidades, a ponto de criar um ambiente de fluxo. Teríamos como resultado, uma cartografia mais maleável, já que a fluidez tornaria suas demarcações instáveis.

Assim, como proposta de uma desterritorialização, proponho uma política de margens, ou seja, marginal. Fazendo com que as linhas possam escoar qualquer imposição demarcatória em um processo de transição. Cada dobra que uma ranhura promove, criaria o efeito “bola de papel”, em que o amassar e desamassar traumatizam, abrem fissuras que abrirão espaços novos, com zonas de transição mais abundantes, acompanhando as oscilações que o movimento impõe, saindo da zona de conforto e aventurando-se em uma cartografia de origami, onde o espaço possa dialogar de forma mais versátil com o homem.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 15/08/2014
Código do texto: T4924262
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