ENTREVISTA COM O ESCRITOR MOURA LIMA

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ENTREVISTA COM O ESCRITOR MOURA LIMA

(Transcrita do Jornal Folha da Cidade, Gurupi-TO, Edição n.248,Setembro de 2001.)

“...polissemia e universalidade é que vão

determinar a grandeza de uma obra literária e,

conseqüentemente, a sua permanência diante do

tempo.”

F.C. – MOURA LIMA, ao ser abordado por nossa reportagem quando recebia essa honrosa premiação, isto é, o prêmio “Malba Tahan” de Literatura /2000, da UBE/RJ, assim se expressou:

– Vou receber a premiação com grande emoção e em nome do Tocantins, de Gurupi, e de todos os segmentos culturais do Estado.

F.C. – O seu reconhecimento literário, por sinal bem merecido, pela grandeza da sua obra literária, fora e dentro do Tocantins, não tem provocado ciumeiras e inveja?

– Creio que não, pois o nosso trabalho é independente e regional. E tem um só objetivo: resgatar e contribuir para a independência cultural do Tocantins, em relação aos outros estados. Mas é prudente lembrar o escritor GIUSEPPI FUMAGALLI, que, na sua obra Chil’há detto, cita a frase de Ugo Foscolo, que assim definiu os apedeutas literários: – “Não há animal mais invejoso do que o falso literato”. E parafraseando o escritor Francisco Virgílio, acrescentaríamos: – se o pretenso literato não tiver uma boa formação cultural, não passará de uma gralha empavonada e, lamentavelmente, integrará a turma do foguete.

F.C. – Qual a sua visão da literatura tocantinense?

– É bastante otimista. Embora estejamos no pórtico do umbral para a luz, isto é, na fase embrionária. Mas devemos proclamar de viva voz: o Estado do Tocantins é um imenso laboratório que aguarda ansioso os pesquisadores, estudiosos de todos os campos do saber. No fundo, o Tocantins foi feito com suas belezas naturais para acabar num belo livro. É só aguardar.

F.C. – É gratificante ser imortal, em termos de ingresso em uma Academia de Letras?

– A questão da imortalidade é relativa, como o eternizar-se na memória dos homens. A ânsia de imortalidade é um desejo oculto ou inconsciente do coração humano. Eu, pessoalmente, não a desejo, a não ser para a minha obra. Mas é de bom alvitre ouvirmos Schopenhauer: – “O número dos livros escritos numa língua pode estar para aqueles que se tornarão parte de sua literatura verdadeira e duradoura, mais ou menos na proporção de cem mil para um”. Assim sendo, a relatividade está presente, e o livro é o passaporte único para a imortalidade. Imortalidade sem livro é imortalidade sepultada. E uma Academia de Letras, quer sim, quer não, é uma elite cultural.

Portanto, bater nas portas de uma Academia de Letras em busca da imortalidade, sem livro publicado, é como mendigo a pedir esmola. E, por último, eu direi: todo escritor é um imortal mortal!

F.C. – Fale um pouco mais sobre a técnica e o mundo do regionalismo e suas variantes.

– O regionalismo brasileiro é marcado pelo amor à terra, edificado no homem, sua organização social; é também historicista, memorialista e profundamente cheio de reminiscência do paraíso perdido de uma época e determinadas ações, de elevação, do construir e reconstruir da vida. É a leitura do horizonte particular em relação ao universal, mas sempre marcado pelas raízes populares.

F.C. – O escritor regionalista, pelo que se percebe, tem uma liberdade gramatical enorme, até mesma inovadora, o que de certa forma irrita os clássicos, os gramatiqueiros. É verdade esse posicionamento?

– É verdade. Os clássicos, os ortodoxos da gramática correm do regionalismo como o diabo ,da cruz! Mas vamos buscar a resposta na opinião abalizada da escritora, filóloga e crítica literária, de renome nacional, a professora Nelly Alves de Almeida, que assevera na sua monumental obra, Estudos Sobre Quatro Regionalistas: – “Outra face interessante no escritor regionalista é o personalismo evidente que revela e que não o prende ao formalismo gramatical. A filologia, modernamente, situa a língua falada acima da língua escrita”. Por isso é que se conclui que um dos melhores métodos de se estudar português arcaico é enveredar-se nos rumos ditados pelo regionalismo. E, na obra Caatingas e Chapadões, de 1913, vamos encontrar o escritor Assis Iglesias andando no lombo de burro, pelos altos sertões do Piauí, registrando o falar sertanejo e comparando-o ao português arcaico, herança do colonizador, como, por exemplo, a palavra “esprito”, que vamos encontrar desta forma, grafada em Camões. E para se entender em profundidade o regionalismo, é necessário voltar-se aos cânones da língua, ou seja, o português deixado pelo colonizador na memória do mato.

F.C. – Temos conhecimento que você possui a melhor biblioteca do Tocantins, especialmente em livros raros sobre a nossa região, e como fica o empréstimo destas obras?

– Realmente possuímos obras raras, que nos custaram 20 anos de procura, no Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia, Maranhão e Piauí. Agora, quanto ao empréstimo, fico com a opinião do Marquês de Maricá: – “No Brasil não se podem emprestar livros: os que os recebem, consideram-nos dados e não emprestados”.

F.C. – Qual a sua opinião sobre os livros editados, na atualidade, no Brasil e no Tocantins?

– No momento podemos dividi-los em duas classes: os passageiros e os permanentes. Os primeiros são escritos pelos praticantes da literatice, da vaidade pessoal. E o próprio tempo se encarrega de sepultá-los na cova do anonimato. Os segundos são escritos com alma, seriedade e amor à cultura. E têm um destino certo: a posteridade!

F.C. – E o que vem a ser na acepção da palavra o escritor?

– Recorrendo a Maximo Gorki, que é considerado o maior escritor do século XX, eu diria: – o escritor é o porta-voz emocional de seu país e de sua classe; é seu ouvido, seu olho e seu coração: é a voz de sua época. Deve saber tanto quanto seja possível, e quanto melhor conheça o passado melhor entenderá seu próprio tempo, com mais força e profundidade entenderá universalmente o caráter da nossa época.

F.C. – O que é necessário para que uma obra literária seja considerada boa, do ponto de visita do leitor e da crítica literária?

– De acordo com os estudiosos, dois pontos são fundamentais na elaboração de um texto literário: a universalidade e a multissignificação. Portanto, o leitor munido de sua bagagem cultural pode mergulhar nos espaços ocultos do texto e colher as emoções análogas às que habitam o seu mundo psicológico. Resumindo: polissemia e universalidade é que vão determinar a grandeza de uma obra literária e, conseqüentemente, a sua permanência diante do temempo.

MOURA LIMA
Enviado por MOURA LIMA em 21/04/2007
Reeditado em 21/04/2021
Código do texto: T458288
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