A fé é um fenômeno associado equivocadamente, a apenas características teológicas. O homem é um sujeito que se baseia na fé, tendo em vista seu abstracionismo de ordem racional, que o faz enxergar sob a perspectiva do pensamento. Pensar, é criar uma perspectiva de realidade que se sobrepõe a algo que seria o que deduzimos real. Uma camada que se revela. Mas que longe de ser um conhecimento, parece se firmar feito um véu de Maia, que mais encobre do que elucida. Uma nova metafísica se revela, que não procura sobrevoar distantes pontos do chamado universo. Da superfície que se trata, com esse virtualismo criado pelo intelecto, que é a condição deste homo sapiens sapiens.

Os credos mudam, mas a crendice continua. A mente prossegue fazendo conexões, a ponto de proporcionar novas impressões, que não passam de planos abstratos que nem sobrepostos estão, já que nenhum deles existiu de fato. Sem qualquer base, vagam pelo imaginário ávido por dominar o mundo que o domina. Uma nova magia, já que a de outrora, visava oprimir a natureza, fazendo do mago, um atuante sobre os fenômenos naturais. Ainda que a natureza fosse respeitada, existia uma interação do magista, que o fazia possuir certo poder sobre aquelas leis. O homem contemporâneo continua bruxo, só que agora possui a alquimia científica, ou a cabal acadêmica, onde pode disseminar esse novo esoterismo.

Achamos graça do fiel que acredita em um deus, mas todos os dias, nos afirmamos homens, cidadãos, seres, além de outra série de adjetivos que possuem em comum sua falta de substancialidade. A crença na vogal “a”, parece algo tão medonho, quanto a de imaginar um Paraíso alá Adão e Eva. A diferença, para alguns, está em identificar o primeiro como símbolo e o segundo como fato consumado. Estabelecer um signo, dizer que isso não é, torna-se tão grave quanto dizer que é. Como saber o que é engodo, se nunca saímos dele? Fabricamos percepções para tentar desvendar a percepção fabricada que deduzimos percebida. Produzimos a fé da fé.

O elemento fé, é a ferramenta que o ser que se diz pensante, criou para sua sobrevivência. Desesperado pelo processo evolutivo que tende a suprimir a espécie, busca agarrar-se a esse mundo fabricado por si, fazendo-se de criador para deter o poder, sendo o único capaz de decidir sobre seu próprio destino. Esquece-se que o destino é fabricado pelo acaso. Ora a sorte o privilegia, ora o irá desfavorecer, já que a balança não pode permanecer pendendo para um mesmo lado, por perder sua funcionalidade, que é a do equilíbrio. Quanto mais pende para um ponto, maior a tensão exercida pela força que resiste e tenta voltar a manter uma paridade de tensões. A justiça, cega, prossegue nos bastidores, aguardando a gravidade agir, para que possa favorecer ambos os lados com imparcialidade de ausência.

Todo homem é possuidor de fé, fazendo com que isso o motive a criar, já que se projeta. A influência do que modela o pensamento, faz com que crie essa percepção de além de si, que é transferida para um simulacro mental. Visando ser ativo como aquilo que age sobre ele, inverte o processo, tentando criar por si, negando sua passividade diante do que o conduz, ao mesmo tempo, criando sua independência pela lacuna de contrariedade, é uma forma de resistência, diante daquilo que o envolve. Quanto mais nega, mais se envolve, já que só pode negar, reafirmando os laços que o manipulam. Como condutores psíquicos embalados pela música de um mundo que é soberano e faz de mundano tudo o que se relaciona com ele. O fim da fé é a morte do pensamento. Diria a Descartes, “Penso, logo, tenho fé.”

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 06/08/2012
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