Sobre Introduções, Prefácios e Prólogos
Lendo em certa ocasião, uma obra de Michel Foucault, “A História da Loucura”, me recordo do autor ter criado um prefácio em que negava esse próprio conceito pré-textual, terminando com uma ironia, pois o tempo todo dizendo que não criaria um, se vê, no final da exposição, diante daquilo que se negou a fazer.
A partir de questões colocadas pelo filósofo francês, venho através desse ensaio, expor a negação de tais “antecipações” textuais, tendo em vista que um prefácio, prólogo ou introdução, são textos em si, por mais que queiramos vinculá-los a um objeto maior que os serve de referencial.
A própria ideia de pré, já demonstra certo profetismo, não que tenha nesse caso, a pretensão oracular de antever fatos ainda não ocorridos, mas se faz de falastrão, como aquele que antecipa o final do filme aos ansiosos espectadores que aguardam o desenlace. Tira-se um pouco da expectativa do leitor nessa premissa, como também pode gerar vãs expectativas sobre o porvir.
Tais efeitos já se fazem nefastos, por usurpar da literatura aquela arte da surpresa, dizendo desde já o que virá, ou pelo menos, o considerado essencial no todo. Alguns críticos dirão, que tal propedêutica tem o intuito de esclarecer sobre o tema, além de lançar breves bases analíticas, sem contar a variedade literária de obras escritas na contemporaneidade que com tal critério, fornecem forma de averiguar se o tema gera interesse para prosseguir a leitura.
Podemos usar a expressão “julgar um livro pela capa”, com uma pequena alteração, “julgar um livro pelo prólogo”. O que mais uma vez, remete a inocente forma analítica, além de preguiça intelectual, já que se contenta com breve exposição para abranger o todo que a obra representa. Parecido com aquelas edições minúsculos, que ditam até o tempo de ser ler, “o pensamento de maquiavel em 60 minutos”. Fiz questão de abreviar o suposto título, pela ironia à alegoria, já que ler o resumo já se faz muito aquém do escrito na íntegra. Agora, ditar o tempo que deveremos ler, já creio ultrapassar o pedantismo.
O prefácio, talvez devesse chamar pré-fácil, pois muitos buscam ali suas receitas de bolo, mas não com toda a sofisticação gastronômica, mas com aqueles “diquinhas” que deixam o prato barato e de poucos atrativos gustativos. Não é coincidência, muitos leitores buscarem obras consagradas no meio literário, para depois fazerem releituras de prólogos, ainda se forem autores nacionais que tornam uma tradução mais palatável, aí sim, teremos um “prato cheio”, de vazios.
Muitos professores, adotam tais leituras introdutórias, como guias para adentrar o neófito estudante, nos campos de linhas de pensamento que nem mesmo o “mestre” compreende, vide a utilização de autores prefacistas nas suas palestras.
Eis que surge, o mais grave, apesar de já ter mencionado ao longo deste ensaio, a autoridade que o prólogo remete o leitor, pois não é apenas um resumo, algo que já presume que incapacidade do sujeito diante daquela obra, ou mesmo sua indisponibilidade de paciência para contemplá-la na íntegra. A introdução dita como devemos ler a obra, fala sobre o que vem de antemão, já adota uma forma, dizendo qual o caminho “certo” a ser percorrido, ditatorial, pois ela te dita.
O autor já remete o leitor às suas normas, ainda mais deplorável, é quando outros autores-tradutores, autores-comentadores, etc, resolvem te induzir ao entendimento deles acerca daquela contextualização, por mais que estejam bem intencionados. Diz um ditado popular que “de boas intenções o Inferno está cheio”, nesse outro ditado escrito, ainda que ocorram argumentações que é apenas uma visão, que você irá elaborar a suas como os mesmos desenvolveram as deles. Devemos admitir que a influência é inquestionável, já sendo remetido desde antes da obra a uma visão acerca da mesma, te fazendo refém de uma hermenêutica a priori.
Declaro aqui a destruição de introduções, prólogos e prefácios, mesmo que elas venham no corpo do texto, já que na contextualização pressupomos hipóteses, que não deixam de ser introdutórias. Mesmo os pesquisadores, como historiadores, que no corpo do texto façam seus apontamos e adendos, não relegando o sujeito a um prefácio e nem a um posfácio.
Por fim, existe a questão de não alterar a forma original do texto, onde os comentadores apontam a necessidade de tais apêndices anteriores ou posteriores, deixando a obra intacta. Não sejamos ingênuos. Quando nos pré-dispomos a traduzir uma obra, já adulteramos completamente, o próprio autor, ao expor suas idéias, no papel, já as torna alteradas e passivas de alterações, daí a necessidade de ser lida, cada olhar é uma nova ótica ou alteração. Deixemos as expectativas brotarem a medida que mergulhamos nesse mar literário, já pré-formatadas com nossas próprias impressões adquiridas, não nos deixemos cair nesse universo de parcas fragmentações, que torne a leitura um mero resumo, um pequeno, mesquinho rumo.