Sinônimo

Uma das teorias em voga, dentro da nossa gramática, consiste na classificação de “sinônimos”, a dado grupo de palavras consideradas idênticas ou semelhantes.

Este ensaio visa expor uma outra perspectiva que nega tal taxonomia, explicitando a inveracidade de tal ordem, tendo em vista a pluralidade gramatical.

Visto que dentro da semântica, cada palavra, ou mesmo se pensarmos em nível de carácter ou letra, contemplaremos singularidades lexicais, fonéticas. Enfim, a grafia é polissêmica.

O sinônimo reduz propriedades distintas a uma mesmo sentido, desejando aproximar conteúdos díspares, com intuito de forçar uma simetria. O argumento muitas vezes utilizado seria de apresentar um contexto fluídico, menos enfadonho.

Mas servir-se de termos aparentemente semelhantes, não exclui a tautologia, apenas a reforça, caindo em uma redundância ainda mais nefasta, por apresentar um falso simulacro, por este ser não reflexivo ao objeto apresentado, mas antes um substituto.

Sinônimos não resolvem o problema do exagero da repetição, apenas procuram negá-lo com um embuste, onde aparece uma outra persona, que serve de máscara para uma representação de um outro apresentado.

Caímos no problema apresentado por Derrida ao expor o phármakon do texto platônico, temos um fora que deseja ser representante de um dentro inacessível a ele, acaba criando um outro dentro, um duplo fora que nega mais uma vez o princípio que se pressupunha reafirmar.

Reafirmar-se negando, na mais exuberante dialética hegeliana, fazendo de antítese. Só que não desejamos cair aqui nessa vã epistemologia.

As conexões, ou antes, os não-conectivos, jamais poderiam seguir essa cadeia estruturalizante que a cadeia de sinônimos deseja impor. Pois a variabilidade entre espécies-gramaticais segue um ritmo muito além dessa amálgama simplória, não se rende a clones, fazendo-se mutável, dentro de uma meta-morfose.

Grosso modo exemplificando, é como se o sujeito "José" pudesse ser substituído por outros homônimos, quem sabe o ato substitutivo fosse engendrado por outros valores, aproximações anatômicas, gostos musicais, caindo em uma padronização que reduz a uma globalização pasteurizada, aquele que é tudo não sendo nada.

Muitas palavras dita sinônimas, apresentam uma estruturação tão diferenciada, que chegam a não pertencerem nem mesmo a uma raiz comum etimológica, abismos que desejam ser transpostos com pontes oníricas.

Dizer que isso pode ser dito por aquilo é deveras ridículo, pois se assim é, porque não se diz aquilo em vez de isso ou mantém-se o isso pelo desnecessário complemento do aquilo?

O jogo de sinônimos faz uso de metáforas que eclipsam o objeto contextualizado, revelando apenas falsas representações, criando sentidos variados que não ajudam a elucidar o objetivado, antes tornam-no ainda mais obscurecido.

Fica a questão do que fazer em caráter reduzido, ou seja em carácter? Já que a repetição de pronomes, conjunções, preposições se faz ipsis litteris. Se reduzirmos ainda mais, chegaremos a vogais e consoantes. Deveríamos começar a empregar caracteres de língua estrangeira como sinônimo dos nossos?

A busca ávida pela semelhança apenas reforça a dessemelhança, criando na hermenêutica uma ruptura inevitável, deformando-a, por falsos comparativos que alienam o sentido do possível representante. Temos uma repetição de significantes sem significados, para o desespero saussureano.

Ainda que se evoque o argumento de sinônimos serem semelhantes ao invés de idênticos, fica o questionamento acerca de quais atributos de semelhança estarão sendo julgados na composição dessa analogia.

Pois, dizer que um possui características próximas ao outro, faz com que, dependendo da perspectiva analítica, possamos encontrar semelhanças entre todos os tipos, valendo mais o poder de retórica que evidencia um convencimento. Ficando a critério do literato a composição gráfica dessa cartografia da gramática, traçando caminhos com intuito que venha atender suas aspirações, algo muito mais subjetivo do que se propõe a funcionalidade de sinônimos.

Persistir na atribuição de repetição do objeto através de meios diferenciais de sua própria lógica, seria criar no máximo um pseudo-objeto, algo que finge de forma incompetente, tentando convencer que se faz de prolongamento.

Esse jogo de sinônimos apenas satisfaz a incapacidade tanto do literato em agregar as múltiplas formas contextuais, quanto ao leitor que também demonstra redução interpretativa.

Outro grave aspecto é a deformação da escritura, que apenas podemos utilizar com prolixia que remete a repetições e pseudo-objetos, pela incapacidade de síntese. Quiséramos ter na sexta arte, ou seja na literatura, o poder reducionista e ao mesmo tempo tão abrangente que a primeira arte expressa, ou seja, a música.

Mas a arte literária carece dessa potência de expressão, fazendo-se ressonância que ecoa num abismo que de muito perdera o som que ocasionou tal efeito.

Por tais deficiências, ou uma ciência em déficit, está tentada a utilizar estratagemas fúteis, cínicos subterfúgios que buscam mistificar sua frágil perspectiva. Tornando o sinônimo, um tanto quanto parecido com nosso apêndice, órgão já sem utilidade aparente, que apenas lembramos por causa de patologia.

O sinônimo é apendicite, necessitando ser extirpado, numa cirurgia que envolve cortes precisos, rompendo tais “vícios de linguagem”, talvez melhor expressos como “incompetência linguística”.

Devemos ter uma gramática não clonada, mas transgênica. Um pluralismo que cause decadência ao reducionismo, excluindo o sinônimo, deixando a repetição em seu sentido menos rígido às interjeições e onomatopéias.

Deixemos os poetas brincarem, porque se a linguagem deixar de ser farra, estaremos encerrados num sério ordenamento positivista, quiçá utilitarista, com as temerosas sombras de outros “istas”, não esqueçamos os fascistas.