Comendo Mal Pra Burro
Outro dia estava conversando meu pai, e ele se referindo a minha alimentação, usou a expressão "comendo mal pra burro". Independente da minha não muito apropriada forma de alimentar, detive-me na expressão e nas repercurssões dela.
Pois o animal denominado "burro", uma derivação equina de cruzamentos de raças, costuma se referir aquele animal pronto para a labuta, encarregado de exercer funções que o cavalo selvagem, indomável aparentemente não sujeitaria sua natureza "liberta".
Também não equivale ao cavalo de exposição, onde são avaliados seu porte, além dos preparados para competições equestres, o que leva a identificar o Burro como um animal de uma "classe subalterna" no âmbito de um gênero que a tautologia humana qualifica, com certeza baseada em uma eugenia endêmica.
Sob tal perspectiva meu pai ao dizer "comendo mal pra burro", me coloca no mesmo patamar to proletário burrificado, que foi designado como de qualidade classificatória subordinada a um patrão ou dono. A má alimentação não é a preocupação com o bem-estar do sujeito, no caso o meu, mas em danificar sua condição de labutante.
O problema da má alimentação do burro é de o animal não mais poder efetuar o trabalho para o qual é designado, da mesma forma, nós, os sujeitos-burrificados, devemos ter alimentação para não prejudicar o rendimento produtivo, dentro de uma sistema que prima pelo produzido e não o trabalhador-producente, ou quando o faz, utiliza apenas em discurso para justificar sua possível "piedade" para com o prejudicado.
O sujeito prejudica-se ao fazer uma alimentação ruim, perde sua funcionalidade no sistema, causa o valor não-producente, além de gerar outro tipo de produção que abala esse tipo de estrutura, que é a "doença", onde o indivíduo é qualificado de "receber sem doar", pois é cercado de cuidados e não possui aptidão para cuidar como fazia são, fica a mercê da sociedade para sua manutenção total.
Logo, a frase "comer mal pra burro", remete a algo muito mais profundo que uma simples preocupação paterna imediata, mas a uma série de fatores nas relações engendradas que vão além da estrutura familiar, onde a preocupação é remetida mais ao sistema que está vigilante frente a possibilidade de desarticulação do processo produtivo, os próprios familiares agem como mantenedores, quase numa micro-fração de um panotipismo-foucaultiano, sofisticado com as sutilezas que as funções relacionais exercem.