As Datas e a História
Uma das características patentes ao estudo da História se refere às datas, tendo em vista a predominância desse fator numérico e sua relevância, aqui pretendo expor um breve ensaio a respeito.
Percebe-se que a data tornou-se o referencial na História enquanto ciência e que nos últimos tempos seu papel tem sido diferenciado, de acordo com novas perspectivas metodológicas. A data possibilita toda uma sistematização que é de suma importância sob uma perspectiva científica, criando condições para obter resultados através de parâmetros como duração e registro de desenvolvimento comparativo.
A data aparece como registro factual, encerrando em si um marco, facultando aos que se deparam com este ícone aritmético uma “convicção” a respeito de sua autenticidade, como se o número conferisse credibilidade por atestar um posicionamento temporal.
Quando datamos, estamos nos posicionando em relação ao tempo e espaço, por delimitarmos uma inserção verificável em uma ordem paramentada por um calendário cíclico, ao mesmo tempo ocupando dimensão espacial simbólica, que através da escrita ocupa seu espaço tanto em uma geografia literata, quanto em uma dimensão espacial no âmbito das mentalidades, por conferirmos ao imaginário a noção de “Para-Si”, favorecendo a compreensão de seu posicionamento frente à realidade, um “Estar-no-Mundo” e absorvendo essa inteligibilidade do fato.
Não se pode conhecer o fato, tendo em vista sua dimensão incomensurável, entretanto, podemos ser remetidos a ele por uma fração captada, servindo-nos de um ponto referencial para uma tentativa sócio-cultural construtiva de uma realidade histórica.
O ponto referencial demonstra seu valor ao fazer com que possamos ter uma referência de si, desde o nascimento ao registrarmos que passamos a existir, até as comemorações festivas de aniversário em que acrescemos números em uma lógica de desenvolvimento simétrica crescente (do nascer aos dias atuais) e decrescente (dos dias atuais ao registro de nascimento), levando em conta como fator referencial o Ser-Em-Si.
Também não nos esqueçamos da data enquanto ferramenta utilíssima em uma lógica de sociedade burocratizada, tendo em vista a necessidade de uma catalogação do status quo (oficial), tanto para legitimar uma sociedade-burocratizante, quanto para preservar uma memória a posteriori.
Entretanto, a data vem sendo questionada nos últimos tempos, desde o rigorismo positivista que a crítica tem se asseverado acerca de indagações que procurem abranger o limítrofe condicionamento a um fator isolado, como é o caso da data enquanto verdade.
A História em si sofreu a transformação, não sendo mais admitida enquanto mumificada, sendo necessária sua inserção à contemporaneidade de forma atuante, e a data segue o mesmo curso.Não observa-se mais a data enquanto escrita-morta, pois perderia sua funcionalidade, tendo em vista o fato de não mais existir e a data estar relegada a imobilidade cadavérica do texto.
A data aparece enquanto fator metodológico, além de assumir um caráter organizacional didático, tanto facilitando arregimentar fatores distintos em uma tentativa lógica-historicista, quanto ferramenta cognitiva de ligação entre fenômeno e fato.
Servir-se de uma data é instrumentalizar uma lógica horizontal de um processo histórico e ao mesmo tempo inserir-se em um contexto histórico ao registrar-se enquanto fato, afirmar-se na realidade social e predispor-se a uma observação a posteriori.
Quando datamos, registramos o que é, para que seja o que foi, naquilo que virá a ser. E quando este vir-a-ser tornar-se o que é, provavelmente outras datas estarão permutando estas posições espaço-temporais.
O fenômeno das datas aparenta uma necessidade do homem em perpetuar-se enquanto espécie, epifenômeno sócio-cultural que assegura uma lógica construtivista e conservadorista, além de uma abnegação em nome das gerações advindas.