O poder da ignorância
 

Quanto mais reflito a respeito do comportamento de uma fatia considerável da humanidade, mais me convenço de que ela está se encaminhando para o fundo do poço – e esse processo vem se acelerando nos últimos tempos. A aterradora influência que a mídia exerce sobre os indivíduos me leva a crer que há uma carência de autocrítica acentuada em boa parte deles. Afinal, para que se questionar, não é mesmo? É mais fácil ficar atrelado à carrocinha da mediocridade e engolir tudo que lhe é empurrado goela abaixo pela televisão, pelo rádio, pela internet. Questionar-se é doloroso. Realmente, não deve ser muito agradável olhar para si mesmo e encarar seus próprios problemas, em vez de buscar refúgio na vida alheia e nas tendências que são ditadas por aí.
 
As condutas agressivas e ignorantes parecem ser intrínsecas a muitas pessoas. “Ok”, você diria, “Mas o que isso tem a ver com as idéias citadas anteriormente?”. Eu explico. A pressão e o poder midiático levam um sujeito a agredir o outro... por causa de uma opinião. E não uma opinião sobre religião, sobre sexualidade, algo “sério”. Uma opinião sobre música. Mais especificamente, sobre o adorável Michael Jackson.
 
Em uma comunidade do Orkut, eu inventei de me expressar sobre o que achava desse sujeito: que o considerava um homem sem talento e que não merecia o título de “rei” do que quer que seja. Tudo bem que pode soar absurdo para muitos, mas, por favor, não? Diversidade de opiniões! Eu não insultei a mãe de ninguém para ter recebido a enxurrada de insultos pessoais que vieram contra mim. Com o tempo, aprendi a não me ofender com esse tipo de atitude; porém, convenhamos que está faltando uma palavrinha no dicionário dessa gente: respeito.
 
Convenhamos também que as pessoas, em geral, são muito, muito hipócritas. Quem propicia que os shows da Madonna encham de gente quando vem ao Brasil? Quem faz o Roberto Carlos realizar mais de duas apresentações extras em Porto Alegre? Quem criou o espectro do “rei do pop”? A mídia. A mídia cria as legiões de fãs; a mídia manipula, distorce e divulga o que está de acordo com seus interesses. E a mesma mídia, semanas antes da morte de Michael Jackson, não cansava de chacotear a imagem do popstar, dando enfoque não a seus dotes musicais, mas a sua intrigante vida pessoal. Não está em jogo, para essa mídia, o talento (ou a falta dele), mas sim o quanto a pessoa é rentável, lucrativa – o que vale, para muitos que comparecem ao show do Roberto Carlos, por exemplo, é o status (me diga qual o “status” que se adquire com isso, por favor).
 
As pessoas têm o direito de pensar e sentir o que quiserem; só que, no momento em que alguém não sabe diferenciar o indivíduo da opinião dele, aí seria um caso de parar e se questionar. No momento em que alguém apela, mostra sua incapacidade de manter uma conversa civilizada sem se alterar – quem faz isso, muitas vezes, acaba trazendo suas questões particulares mal-resolvidas e as desconta em cima dos outros.
 
Um mundo em que reina a ignorância e a falta de respeito é um mundo de conflitos – étnicos, sociais, políticos, sexuais, econômicos, e por aí vai. Muitos se queixam de que a sociedade é decadente. Evidentemente que sim! Nossas próprias micro-relações são decadentes, pífias e grotescas. Não consigo imaginar um futuro de prosperidade sem que haja uma profunda mudança em cada indivíduo. Mas talvez seja apenas um devaneio de um idealista frustrado.