Das Questões de Gosto

O que me leva a escrever este breve ensaio não é uma questão de gosto; mas de desgosto. E isto começo a abordar da seguinte forma: Quem gosta de acordar no frio? Quem gosta de trabalhar? Quem gosta de dizer “não”?

Claro que, como todas as regras – apesar de não se tratar de regra – teremos exceções. Afinal, todas estas questões dependem de motivação. Pois, não é um simples “gostar de algo”, mas do “tesão de se fazer este algo”. No caso do frio, pode existir um fator motivador para que alguém levante cheio de disposição, no pior dos invernos. Nas situações de trabalho, as diferentes atividades profissionais e suas condições de remuneração ou satisfação pessoal serão essenciais para tal resposta. E no caso do “não”, com certeza existem diversos momentos onde tal postura nos seria prazerosa.

No entanto, do que falo aqui é sobre os eventos mais comuns, mais óbvios, posicionados dentro da curva normal. E onde quero chegar é que, apesar de geralmente nada disso ser prazeroso, somos impelidos a fazê-lo – estes e outros tantos exemplos.

Muitos diriam “são obrigações”. Parece-me perto. Todavia, não o suficiente. Ninguém chega à sua cama e lhe puxa pelo cabelo para levantar no frio da manhã e ir trabalhar. Ninguém lhe obriga; ou ainda, alguém não lhe obriga a fazer isto.

A meu ver, trata-se, acima de tudo, de necessidade vital: caso não tomemos determinadas iniciativas desagradáveis, suas conseqüências serão ainda mais desagradáveis; e trocamos o maior pelo menor custo. Ou seja, não importa se gostemos ou não. Nem mesmo se nos vemos obrigados a fazê-lo. Porém, convém que o façamos por uma questão de sobrevivência; não por obrigação. Sentimos-nos, sim, pressionados por esta necessidade vital. Ainda que não se trate nem de gosto nem de obrigação.

Na verdade, a questão pela qual discorro desse tema é muito mais pontual do que geral. Pois, existe um exemplo deveras costumeiro de pessoas, principalmente jovens, que alardeiam não gostarem desse assunto específico: a política.

Ocasionalmente, ouço isso quando algum tema político é abordado. De fato, a ignorância é tanta que, muitas vezes, nem mesmo de política está se falando. Mas, de História.

Ora, o que se torna importante deixar claro é que não se discute ou se conversa ou se debate política por gosto, mas porque, se não o fizermos, estaremos expostos aos joguetes os quais não apenas beneficiam os políticos de má fé, como prejudicam todo o andamento – e, consequentemente, o futuro – de uma sociedade da qual, gostemos ou não, participamos com deveres e direitos; e obrigações também, sim senhor(a).

Contudo, o que é mais alienado e agravante, nesse tipo de comentário, é que quem o faz não tem – ou não quer ter – a menor idéia de que milhares de pessoas morreram – muitos hipócritas, eu sei; mas nem todos – para que o seu direito de expressão de opinião política fosse largamente exercido. Para que pudesse votar, exigir, comentar e ser respeitado (ainda que este último seja utópico) no exercício desta liberdade de expressão.

Outro aspecto alienantemente agressivo é que este feito – além do desrespeito àqueles (nossos antepassados, ainda que não diretamente) que morreram –, é protagonizado com um ar de superioridade, como se fosse uma grande frase de efeito, em seu ponto final implícito: “não gosto de política... paremos de tocar no assunto”.

Na última segunda-feira, tive a infelicidade de ouvir, mais uma vez, esta pérola infantil. Muito cômodo para quem nunca teve de enfrentar exércitos em seu exercício de invadir os lares alheios. Eu mesmo não tive esse desprazer. Mas, não se trata de ter vivido tal experiência. Trata-se de sermos conscientes e menos infantis, de termos uma visão mais ampla da vida, da História, do ser humano, e passarmos a refletir mais, ao invés de simplesmente estarmos voltados aos nossos umbigos bem saciados em baladas e bacanais pós-adolescentes.

(18.03.2009)