Essas Coisas Devem Cessar
Charlles Nunes
A cada dia, nos deparamos com situações que fogem ao nosso controle. As pessoas fazem e dizem - intencionalmente ou não - coisas que vão na contramão do que pensamos e acreditamos. E muitas vezes, do que esperamos delas.
Quando você atravessa a rua e um motorista pára em cima da faixa, por exemplo, ele está usando um local que - naquele momento - deveria ser seu.
Quando você está dirigindo e um ciclista cruza na frente do carro, causando uma freada brusca, isso pode estragar o seu dia. E quando as pessoas conversam no meio da rua e você buzina pra chamar a atenção delas e elas te dão aquela olhada fulminante?
Haja paciência!
Sempre que duas pessoas se relacionam existe o risco de surgir uma discórdia. E nem sempre a gente se prepara pra isso.
Quando vivemos de forma desatenta, corremos o risco de deixar que outras pessoas decidam o nosso destino. Muitas pessoas estão nesse exato momento atrás das grades porque deixaram que a raiva as pegasse de surpresa. Perderam o controle e tomaram atitudes impensadas.
Embora nem toda ofensa leve o ofensor ou o ofendido para a prisão, um ato motivado pela raiva pode afastar por muito tempo pessoas que se amam. Pais e filhos. Irmãos e irmãs. Amigos de longa data. Todos conhecemos alguém que já viveu uma história assim.
Esse tipo de afastamento virou febre durante as eleições. Parecia uma guerra: parentes e amigos discutindo nas redes sociais com adjetivos não muito recomendáveis. Essa atitude abriu muitas feridas emocionais. E uma boa parte continua aberta até hoje.
O Senhor sabia muito bem que iríamos discordar em nossos pontos de vista - e que ficaríamos zangados uns com os outros. Ele sabia que a raiva poderia nos fazer perder o controle e que assim correríamos o risco de nos magoar mutuamente.
Por isso, ele nos deixou alguns conselhos. Em Efésios 4:26, lemos “Não se ponha o sol sobre a vossa ira.” Ou seja, não fiquem remoendo a sua raiva por tempo demais.
Em 3 Néfi, lemos: “Eis que esta não é minha doutrina, levar a cólera ao coração dos homens, uns contra os outros. Esta, porém, é minha doutrina: que estas coisas devem cessar.”
Existe algum método para aplacar nossa raiva o mais rápido possível? Ou uma maneira de arrancar as sementes da ira antes que germinem em nosso coração? Quem já viveu as consequências de uma discórdia sabe que esse período é um dos mais amargos da vida.
O que podemos fazer para que essas coisas cessem em nosso meio? Vou compartilhar três ideias a esse respeito. Mas antes, um alerta: como num videogame, sempre que você passar de fase, o desafio aumenta.
1: Orar
Desenvolva o hábito de orar com sinceridade. Procure um local silencioso e converse com o Pai Celestial sobre seus desafios e desejos justos. Pare para ouvir as respostas, que poderão vir através de um pensamento ou sentimento. Ou até mesmo um sonho. Isso vai te ajudar a sintonizar sua mente com seus objetivos. E vai acalmar seu coração.
Aos poucos, comece a incluir em suas orações as pessoas que você ama. Seus filhos, seus pais, seu cônjuge. Seus amigos, e todos aqueles que se relacionam com você no cotidiano.
Quando você já estiver fazendo disso um hábito, comece a orar pelas pessoas que te incomodam. Ore por uma de cada vez. As que te ofenderam de alguma forma. E aquelas das quais você quer distância mesmo!
Por experiência própria, posso te dizer que você vai começar a sentir uma mudança interna, e seu entendimento sobre os motivos e limitações do próximo vai aumentar.
2: Ouvir
Procure mais informações a fim de obter a perspectiva da outra pessoa. Às vezes, o ofensor não teve a mínima intenção de te ofender.
Eu sempre gostei do Hino Nacional Brasileiro. Já tive muitos bons sentimentos ouvindo sua melodia e pensando sobre sua letra. Mas o hino começou a me incomodar quando um vizinho resolveu tocá-lo diversas vezes por dia. Numa manhã, eu resolvi contar: ele tocou cinco vezes seguidas.
Como o som vinha de uma travessa atrás da nossa casa, eu não sabia de qual casa o som estava vindo. Mas senti vontade de bater de porta em porta e descobrir qual era a motivação do meu vizinho patriota.
Alguns meses depois, convidei um vizinho pra fazer algumas melhorias no nosso quintal. Papo vai, papo vem, comentei com ele sobre o hino. Pra minha surpresa, ele disse:
“O som vinha lá de casa. Era um jeito de acalmar meu filho adolescente. Ele é especial, e fica todo feliz quando ouve o Hino Nacional.”
Nem me lembro onde eu enfiei a cara, mas tive bastante vergonha do que eu havia sentido durante todo aquele tempo.
3: Refletir
Sempre que você perceber que está começando a sentir raiva, avalie seus motivos e desejos. Tente perceber o quanto envolvido emocionalmente você está na situação. Se possível, se afaste um pouco das pessoas que estiverem mais alteradas.
Aos sábados, eu jogo futebol com meus amigos todo sábado. E toda semana tem discussão. Num esporte de contato como esse, é comum haver conflito de opiniões.
Com o tempo percebi que quanto mais longe eu estiver de uma confusão, menos ela vai me afetar. Outro dia, o juiz marcou um pênalti a nosso favor. Na hora da cobrança, um jogador do outro time chutou a bola pra longe. Resultado? Foi expulso.
Como eu estava distante do lance, achei aquilo engraçado. O desejo do nosso time era fazer o gol. O deles, evitar o gol. Os dois times só queriam vencer partida.
Em poucos minutos, o jogo acabou. O resultado perdeu sua importância. Mas naquela hora do pênalti, parecia uma questão de vida ou morte!
Assim como toda criança precisa aprender que o brinquedo não vai evaporar se ficar na mão do coleguinha, precisamos aprender que a nossa verdade nunca é absoluta. Que existem outras formas de ver o mundo. E de viver a vida.
Então, vamos apreciar os lugares, as comidas, os talentos das pessoas. Vamos abraçar mais, rir mais, beijar mais. E vamos ficar atentos para que a raiva e a contenda não nos peguem de surpresa. Somente assim, seremos senhores das nossas emoções.
Em nome de Jesus Cristo. Amém.
Angra dos Reis-RJ, 30 de Junho de 2019