SEQÜESTRO RELÂMPAGO

Tomei de assalto a noite e a seqüestrei,

como um marginal inconformado.

Não haveria acerto se amanhecesse o dia.

E o preço a pagar não seria pequeno.

Durante milênios ela ficara famosa como

rainha, deusa maior, origem.

Estava agora encurralada entre espasmos de luz,

sem tempo suficiente para eternizar os encantos

e perenizar as fraquezas.

Da necessária vida, bastava o cintilar distante das estrelas

e o perfume da flor dama, que deveria ter aprendido

a sobreviver como notívaga planta.

De marginal confesso, ouvindo suas lamúrias,

tornei-me um súdito complacente.

Senti que ela estava cansada de nascer e morrer.

Falou para mim, em tom angustiado, que não via assim

tanta inconsequência em meu ato.

Disse mais. Que no fundo, no fundo, até ansiava por isto.

Duvidei. Parecia expressar-se sem firmeza.

Parecia querer ganhar tempo, esperando o momento certo

para se livrar do meu jugo.

Ela fez o jogo certo.

Com seu encanto e poesia, minuto a minuto foi me aliciando.

Usou do perfume da dama da noite para me inebriar,

até que surgiu o dia.

Não sei por quanto tempo ela vai nascer e morrer.

Perdi o resgate.

Ela perdeu, de vez, o seu reino.