9 de março... Dia da Mulher... I

Alguém inventou o feminismo e pegou. Como uma moda, como uma Coca-cola, como uma peste. Feminismo de controvérsias e cobranças. Para sair e voltar do trabalho, bate o ponto. Mas não sabe fazer um ponto de costura, de ponto de cruz. Não escreve mais cartas, manda e-mail para quem o tem. Não tem tempo. O tempo que tem lhe rouba atitudes, lhe arranca sentimentos. Não sente saudade, não sente vontade. Come comida de self-service, fast-food. Não sabe colocar o feijão para cozinhar na panela de pressão. Mas trabalha sob pressão. Não tem filho. Tem cachorro, pois não precisa ligar para saber se está bem, não come papinha industrializada, não usa fralda, não cobra colo. Num porta-retrato, um auto-retrato. Uma amiga que fotografou nas últimas férias. Estuda inglês, matemática financeira na HP, direito constitucional mas não tem relação para discutir. Briga no trânsito. Não briga com o rolo para ter mais uma companhia para o cineminha do domingo. Tem relógio pequeno, quadrado, com pulseira para trocar mesmo seu tempo não se dividindo em horas. Já viu estatística, já viu programa de computador, já viu filtro e óleo de carro, já tem celular com câmera fotográfica e um controle remoto só seu mas não tem companhia para o chopp na sexta-feira. As horas não passam numa euforia. Se arrastam numa melancolia. Não lembra de flores que mereceria no seu dia, mas lembra as senhas do micro, das planilhas do excel, do banco, do outro banco, do sistema, do orkut, do msn. Suspira de cansaço, não de amor. Acorda cedo para o trabalho, chega tarde da academia mas tem o final de semana para dormir abraçada com a solidão até a hora que quiser. Tem fotos no perfil de quase todos na lista do celular para não esquecer seus rostos. Não encontra ninguém em dia nenhum. Usa maquiagem, faz escova, se arruma. Tem empregada para arrumar a casa. Tem pavor de barata mas não tem de trocar um pneu (se um dia precisar). Pelo menos diz que não. E tem que matar e trocar. Compra imóvel, compra carro, mas não compra um presente. Não ganha um presente romântico. Se presenteia com um anel, com uma bolsa estampa de onça, com flores para a mesa da sala, um jantar sem luz de vela em casa mesmo. Se tem companhia, essa não tem assunto para uma conversa mais longa. Se acha um par é casado. Se acha outro é enrolado. Quando encontra o homem da sua vida, percebe que seu destino é só a cama e pronto. Desiste, volta a trabalhar. Mulher hoje em dia tem é que trabalhar.

Liz Hardt
Enviado por Liz Hardt em 05/03/2008
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