A fotossíntese das palavras - BVIW
Quem escreve é, antes de tudo, um leitor. De si, dos outros, da vida, do que não existe, do que as palavras às vezes suam para tentar definir. Um leitor é quem dá as mãos às palavras escritas ou faladas por outro e se lança, corajoso, das formas possíveis, para navegar em seus sentidos.
Sonhar com sapatos perdidos, sentir os cabelos sendo jogados de uma torre ou voar em um tapete faz a vida ser marcada por fatos bem estranhos a quem não lê. Afinal, não é fácil percorrer 20 mil léguas submarinas, dar A Volta ao mundo em 80 dias, passar Cem anos de solidão, tentar desatar os nós de Dom Casmurro ou confrontar-se com a exploração humana de Vida Secas.
Quando, como leitora e escritora, me vejo diante do questionamento “O leitor precisa de quê?”, percebo minha memória boiando em letras desde a infância. Eu tinha medo de injeção e ganhava livro, porque precisava de conhecimento para aprender a superar o medo. Na adolescência, precisava dos espelhos de vários diferentes personagens para moldar a pessoa em quem estava me transformando.
Hoje, adulta, preciso ler para manter as janelas abertas, para fazer deslizar as maçanetas das portas, para a mente e a alma saírem por elas. Às vezes juntas, às vezes separadas, para que eu sempre tenha coragem de abrir um livro com a impressão de que um tapete mágico vai trazer sapatos que nunca vi.
É assim que eu respiro o ar que só os contos, os romances e a poesia produzem nessa fotossíntese de sensações que os nossos olhos e ouvidos se integram ao transformar a energia das palavras.