Ritual
Sei que, em relação ao sagrado, vocês devem ter algum ritual para realizar essa busca. No meu caso, todos os domingos e terças-feiras vou à igreja em adoração ao meu Deus. Entretanto, no nosso cotidiano, existem algumas atividades que se transformam em verdadeiros rituais.
Ainda bem que, para a realização dos meus rituais, não preciso de nada demasiadamente caro.
Antigamente, na minha infância, quando eu morava no barracão da dona Ritinha, uma atividade tornou-se um verdadeiro ritual.
Durante a semana, minha mãe ficava direto na máquina de costura, era o meio que ela usava para complementar a renda lá de casa. Afinal, com sete bocas para alimentar, alguém tinha que se virar. Na nossa casa, era a dupla dinâmica que se virava nos trinta, rs. Como forma de compensação, aos domingos, minha mãe fazia frango com quiabo, com direito a um litro de Coca-Cola.
Esse momento, para mim, era algo sagrado. Eu amava tudo aquilo. Quando o almoço estava quase pronto, minha mãe mandava eu buscar, no bar do seu Abílio, um litro do divino líquido. Naquela época, tinha que levar o casco. Eu abraçava o mesmo, como se abraçasse uma dama, tamanha era a satisfação do meu ser. Pensando bem, domingo era dia de comer carne, mesmo que fosse uma galinhazinha.
Na hora do almoço, a divisão era feita, os adultos tinham prioridade nos melhores pedaços. Meu irmão mais velho sempre reclamava porque gostava da coxa e da sobrecoxa. Eu era mais conformado, qualquer pedaço me divertia, desde que eu sentisse o cheiro da galinha. Talvez esteja justificado por que gosto tanto de pé de galinha, rs. Pena que aquele sonho não durava dez minutos, e tudo escafedia. Agora, era contar os dias da semana para que novamente chegasse o domingo.
Esse ritual está impresso no meu livro digital: "Um conto de vida: a saga de um nordestino". Vocês encontram esse livro na plataforma da Amazon.
Conforme Heráclito, o mundo está em constante transformação. Ele é o autor da célebre frase: "Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio". O tempo passa, os rituais continuam, apenas trocam as suas embalagens.
Atualmente, moro em Mucuri, no estado da Bahia. A feira daqui de casa é realizada toda semana. E já temos algo que substituiu o frango com quiabo: a bola da vez é a uva BRS Vitória. O paradoxo está na sua procedência. Geralmente, quando o assunto é uvas, pensamos na região Sul; no entanto, essa foi produzida no Nordeste, na cidade de Petrolina–PE. Essa uva, além de ser doce como o mel, não tem caroço. Sempre quando minha esposa faz feira, ela compra uma caixa de uvas para degustarmos.
Minha esposa é mais voraz, acaba com elas num instante, contudo, vou degustando uma por uma para prorrogar a minha doçura, rs. Ah, esqueci de ressaltar uma diferença do nosso ritual: agora, somos apenas duas bocas. Como tudo na vida tem a eterna dualidade, sobra mais para mim, rs. Veremos, com o passar do tempo, qual será o meu próximo ritual.