CRACHÁ

Não sei o que vocês acham, mas odeio usar crachá. Detesto, acho ridículo, incômodo, inútil. Por outro lado, reconheço que faz sentido por razões de segurança em determinadas empresas, assim como é bom para a identificação em congressos, seminários e eventos do tipo. Mas, assim mesmo, fica esdrúxulo aquele cartão de identidade no peito, como se a gente fosse animal de rebanho ou bebezinho em berçário. Festa em que se necessite usar crachá não pode ser grande coisa, embora, sem alguma identificação, talvez fique desastrosa. É preferível não comparecer. Há anos, quando ainda trabalhava, lá na minha instituição voltaram a insistir nessa coisa de estar sempre com o plástico pendurado, bem visível, pra exibir nossa reles condição de soldadinho de chumbo ou de ovelha no rebanho. Não importa a história, o real tamanho do serviço prestado pelo indivíduo, o salário que ganha, o cargo: a marca no couro do animal é prerrogativa do patrão, igualando o que a vida normal costuma desigualar, entre humanos. Resolvi resistir, não por vaidade, mas por absoluta desconformidade com a hipocrisia dos padrões organizacionais vigentes. E sei que tem sempre alguém liberado. Preferia o guarda-pó branco dos tempos escolares no interior. Acho que era um uniforme mais digno, compatível e democrático. Compulsando o "Aurélio", vejo que a palavra provém do termo francês "crachat" e significa, basicamente, "insígnia honorífica, comenda, emblema". Quem dera. Não é arrogância, garanto, é repulsa à pasteurização e às decisões arbitrárias, para dizer o mínimo. Feito o desabafo, a verdade é que passamos grande parte da vida usando algum tipo de crachá: o título acadêmico e pós-acadêmico, o endereço residencial, a grife da roupa, o carro do ano, os conhecidos importantes, o sorriso simpático, os agradecimentos e mesuras, o bumbum das "cachorras" e por aí afora. Todo mundo com um ou muitos crachás, em vez de uma melancia pendurada no pescoço - que talvez fosse modo mais honesto e singelo de chamar atenção.

José Pedro Mattos Conceição
Enviado por José Pedro Mattos Conceição em 15/01/2008
Reeditado em 15/03/2017
Código do texto: T818528
Classificação de conteúdo: seguro