ENTRE TRISTEZAS E LOUCURAS: Verão de 42"...
Há poucos dias alguém me questionou de forma muito cortes o porquê do meu "gosto" por filmes melancólicos com músicas tristes, a exemplos de alguns anteriormente apresentados por aqui. Sem retrucar, nem mesmo ousar debater conceitos e preferências, tão somente pensei: serei eu mais um "louco taciturno" atuando sem o devido registro no Conselho Regional dos Desatinados Macambúzios do Amazonas - CRDMAM? Bom, é melhor eu me registrar, senão a camisa de força e o sindicato podem vir pesado pra cima de mim.
Passado alguns dias, retorno aqui para apresentar mais um admirável filme, regido sob o signo de uma deleitosa e inebriante música, que por sinal, é uma uma obra de arte envolta de signos e sentimentos.
"Summer of 42", ou (VERÃO DE 42), é mais um daqueles longa-metragem de beleza simples e cativante, que nos remete a refletir sobre a rapidez da vida a partir das nuances e matizes da adolescência perdida. Este clássico, atemporal, enroupado de drama, romance e comédia, também traz em seu contexto um misto de momentos mágicos, como o despertar da sexualidade, os processos de amizade e amadurecimento, liberdade e gentileza sutil, retratados na voz (e no silencio) dos personagens de forma tão sublime e diversa. Ademais, o filme também descreve, veladamente, a dor e a perda causada pela Segunda Guerra Mundial, o amor platônico, e o lado cômico das angustias provocadas pelo fogo da inocência de uma época, cuja candura há muito esvaiu-se...
Lançado em 1971, o filme, dirigido por Robert Mulligan, recebeu no Brasil o título de “Houve uma vez um verão”, e bem lembro tê-lo assistido pela primeira vez na TV aberta em um daqueles programas exibidos nas madrugadas luzidas da fantástica década de 1980.
A história, doce e comovente, é protagonizada pela atuação marcante do jovem Hermie, (Gary Grimes), e Dorothy, personagem interpretada pela belíssima (Jennifer O’Neill), uma atriz brasileira radicada nos Estados Unidos. No quadro dos coadjuvantes, destacam-se o inquieto Oscy (Jerry Houser), e o introspectivo Beenjie (Oliver Conant), bem como as meninas Miriam (Cristhoper Harris) e Aggie (Katherine Allentuck), e claro, o farmacêutico (Lou Frizzell) juntamente com o noivo de Dorothy, o ator Walter Scott, cuja aparição é rápida, mas seu desaparecimento é simbolicamente profundo.
Embora provido de um elenco pequeno, a obra contém uma série de sequências marcantes e inesquecíveis, que ao meu ver (tão somente é a minha opinião), o torna uma joia de beleza radiante no conjunto que compõe o acervo de minhas predileções.
O filme, despretensioso e divertido, é também daqueles que desperta saudade e dialoga com o coração. Sua trilha sonora feita pelo francês, Michel Legrand - um dos maiores compositores do cinema, é, sem dubio, a grande cereja do bolo, a madrepérola do oceano, que completa a obra-prima; responsável, inclusive, por libertar as muitas lágrimas contidas no fundo do baú de guardados de nossas tortas e cinzas emoções.
De certo que aqui não contarei o enredo da história. Contudo, como um bom provocador, revelarei nele haver um gole de café, um livro proibido, um escurinho de cinema envolto a tentativas desacertadas e impudicas sob as cenas de um clássico estrelado por Bette Davis e Paul Henreidt, e, lógico, umas meninas da ilha. Também haverá, como pano de fundo, o sótão de uma casa simples no alto de uma pequena colina debruçada a beira-mar, logo, uma escada, uma cena desejada e pernas tremulas. Talvez, um beijo roubado, e umas tentativas malfadadas na compra de "coisas proibidas" em uma farmácia.
Sobre o tema - lembrou-me ainda o querido conterrâneo Raimundinho, poeta lá das barrancas de Fonte boa -, que poderá haver também, flores, gostos e cheiros, ou simplesmente uma vitrola que toca a velha e batida paixão de verão, um presente ofertado, uma noite de amor, uma carta de despedida fixada na parede, e um sonho acabado. Enfim, há relatos de que é um filme autobiográfico que revela a história, não só do autor, mas de milhões de pessoas em todo o planeta. Mas como eu sei apenas que nada sei, só posso dizer que é sempre muito divertido e prazeroso revê-lo.
Assim sigo nesta loucura tristonha, que nem tinha dado conta de que tanto me arrebata. Antes, porém, de escrever outra "boba crônica", vou dar uma passadinha na velha prateleira da estante, para buscar, assistir e me comprazer de dois outros grandes clássicos, isto é, os prodigiosos "Casa Blanca" e "Màlena", cujo pano de fundo se materializam sob os auspícios da Segunda Guerra, mas também no amor, na beleza e na rudez, na boa música, e porque não dizer, na melancolia inversa que desprende, canta e encanta.
Manaus/AM, 28 de agosto de 2024.