As praias

Praias, estes emaranhados de areia e água salgada que nos servem de entrada para os mares – muitos deles internacionais. Essas praias guardam lembranças, é engraçado como me pego extenuado em recordar este fato, talvez por consequência de vir duma cidade litorânea. Mas, por mais exaurido que esteja de tanto remexer minha biblioteca de memórias, admito a minha admiração para com o mar. O mar guarda muitas histórias interessantes.

Creio que não falo só por mim quando cito as festanças de ano novo que ocorriam na Praia da Costa em Vila Velha (provável que ainda ocorram). Me maravilho ao lembrar das multidões e suas roupas brancas, dos estouros de champagne das diversas classes sociais, todas agradecendo por mais um ano nesta Terra que Deus nos deu. Embora as dificuldades nos entristeçam, no dia em que se celebra a virada do ano tudo é esquecido, tudo isso se foi.

E, como falar do ano novo e das praias sem citar as queimas de fogos de artifício, deliberadamente espalhando o esplendor ao céu do nosso Brasil em um dia específico em que todos festejam juntos! Certa vez, passei o ano novo na casa – para não dizer “mansão” – do patrão de meu pai. Não citarei nomes, mas foi uma experiência maravilhosa da qual guardo com muito carinho. Foi um dia cheio com direito a churrasco na beira da piscina. A casa possuía um portão no quintal que dava de frente para uma praia (de tão vazia, quase era particular). Naquele dia, eu e minha família observamos de camarote a queima de fogos. São estes belos momentos que tanto gostaríamos de reviver.

Também não deixo de lembrar de um antigo final de semana em Ponta da Fruta, ficamos eu e minha família em uma pousada junto dos pais de meu amigo - e meu amigo, claro. Foi um final de semana incrível. De dia, brincava com meu amigo e mais alguns que fizera na pousada, de noite ocorria uma festança nas ruas da redondeza. As barraquinhas de comida enfeitavam a rua, e a multidão cravejava a meiuca como brilhantes numa jóia. A pousada dava de frente para a praia, atravessando uma porta na parte de trás seus pés já encontravam a areia. Queria ter um pouco mais de idade naquela época, gostaria de admirar tal paisagem de noite, ver a Lua por lá enquanto meu pai tocaria uma viola juntamente do pai de meu amigo, e eu observaria tranquilamente a solitária paisagem do longínquo mar junto à penumbra da escuridão noturna. Parece um bom lugar para pensar.

Triste foi o momento da partida – como toda partida está fadada a ser mal recebida – esperneei, fui-me embora aos prantos com o desejo de ficar por mais um dia (meu amigo, sortudo como era, ficou por lá). Foram legítimos dias de glória.

Mas deixemos o ano novo para o fim de ano, ainda estamos em Junho, então falemos novamente das praias. Acredito que não seja o único a ter experiência com aquelas amizades passageiras que conhecemos sob os infinitos grãos de areia banhados ao sal do mar. É muito curiosa a quantidade de relatos que acomete esta coincidência. A coisa é tão comum que existem até as teorias que nos arrepiam a pele – dizia-se que eram pessoas afogadas que voltavam a praia; encobrem a simples verdade: a cidade é muito grande, a quantidade de pessoas mais ainda, sendo assim é muito natural que ocorra o desencontro. Isso tudo sem citar que a praia é um ponto turístico que recebe pessoas de todo o país, até estrangeiros.

Ao falar das praias também me lembro dos infortúnios que o mar vez ou outra nos resolve colocar. Os clássicos “caldos” são rotineiros para quem curte um bom mergulho, eu mesmo já tomei vários. O causo que mais me revolta foi o dia do óculos. Absurdo aquele dia. Eu era garoto novo, estava longe das ruas pela minha timidez, mais longe ainda do mar. Um amigo me acordou com um convite para curtir um dia de sol, e mal sabia o coitado Marcelo o que estava para se suceder. Depois de uma grandíssima caminhada até a Praia da Costa, e mais outra caminhada até um bom local na areia, resolvemos dar um bom mergulho. Aqui meu amigo leitor, você precisa ter em mente que sou míope, grandes sete graus de puro vidro têm de ficar em frente aos meus olhos, caso contrário fico cego, e por conta disso preferia me afastar do mar. Eu tinha um problema com o “tirar o óculos e ir mergulhar”, se eu escolhesse pelo caminho da cegueira, voltar para meus amigos na areia era impossível. Sem os óculos eu não reconheceria ninguém, me perderia num monte de borrões.

Mas o que acontece com quem resolve se arriscar? Bem, aqui eu digo o velho ditado: quem arrisca não petisca. Porém, é esquecido que o indivíduo que arrisca também pode ficar sem petiscar; foi o que me ocorreu. Lá estava eu ao mar, sequer sabia nadar. Estava com um total de zero confiança, principalmente depois de tanto tempo sem visitar uma praia. Cada onda me levantava, meus pés saíam do chão e aquela era uma sensação terrível. Foi quando uma onda maior ainda resolveu que iria me ensinar o conceito de gravidade zero. A coisa foi tão brusca que devo ter dado umas duas cambalhotas dentro do mar. Ao me recuperar do lindo caldo – digno de críticos profissionais que se encontravam na areia banhando-se ao sol com o direito de me julgarem pelas formosas manobras – percebi a estranheza que encarava. Perdi meu óculos! Os que estavam perto até tentaram me recuperar do prejuízo, mas infelizmente o óculos ficara para algum peixe míope que necessitava mais do que eu. Daquele dia em diante, decidi que não me colocaria ao banho no mar novamente, e sigo até hoje assim. Vou à praia para aproveitar o sol e a vista, de resto, o mar que fique com seus peixes e meu antigo óculos.

~ 15 de Junho de 2024

Marcelo Di Gabriel
Enviado por Marcelo Di Gabriel em 21/06/2024
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