Quem é o brasileiro que não lê quase nada?
"A primeira vez que Rick Hautala, outro calouro de Inglês, viu seu novo colega de turma, Steve estava na fila do bandejão na hora do almoço com a cara enfiada em um livro barato. “Ele estava lendo o tipo de porcaria que eu gostava de ler”, disse Hautala. “Na hora do jantar ele estaria de novo na fila, mas com outro livro. Acho que ele lia três livros por dia, já que a cada refeição ele parecia estar lendo um livro diferente."
Amigo e amiga leitores, sejam bem-vindo à minha escrivaninha. Sendo a primeira vez ou um frequentador mais entusiasta dos meus texto, sintam-se à vontade que vamos falar de um dos assunto que mais gosto: leitura.
Hoje, vi dois vídeos no Youtube falando do mesmo e batido assunto que já estamos careca de ouvir: o brasileiro lê pouco ou quase nada. Que novidade há nisso? É mais velho do que a gostosa posição de obrar. Mas, parece que é bom ficar relembrando as nossas mazelas, agora não sei se é para não esquecer ou para reafirmá-las...
Pois bem, pesquisas apontam que por estas bandas do Atlântico se lêem menos de 5 livros por ano. E esses menos de 5 são lidos por pouco mais de 50% de nossa gente e a cada ano diminuindo. Os senhores(as) dos cálculos estatísticos dizem que se considera leitor quem leu pelo menos 1 livro, independente da modalidade, nos últimos 3 meses. E pelo jeito, boa parte dos brasileiro nem isso consegue ler. Mas, eis que surge uma voz salvadora e diz: "Mas nunca se leu tanto como hoje. Se lê a todo instante nas redes sociais, nos aplicativos de mensagem..." (pelo jeito vamos ter que dividir Os Miseráveis em 1 milhão de twitters para ver se essa geração o consegue o ler). E outra coisa, não é querendo jogar água no chá de ninguém não, mas lê 120 caracteres (parece que o twitter permite mais caracteres, não tenho certeza, não uso mesmo...) mil vez por dia não treina o cérebro para ler um livro, por menor que seja, dá tédio. Não dá para passar da terceira página. Não desenvolve a maturidade necessária para ser um leitor. Lembre-se que leitor é aquele que leu pelo menos um livro nos últimos três meses.
Não pense que a classe de não leitores engloba os descamisados sem instruções nos rincões do nosso país. Não. Boa parte dos acadêmicos universitários terminam a graduação sem tocar num livro, pasmem!. Ai o caldo entorna. Como é que alguém passa quatro, cinco, seis anos (tem uma galera que está chegando a doze ou mesmo quinze, só para terminara a graduação) sem pegar em um livro ou apenas nos livros técnicos obrigatórios para sua formação e mesmo assim, apenas nas partes mínimas necessárias para fazer as provas ou apresentar o seminário? É para assustar uma coisa dessas, ou não?!
Minha esposa é chefe interina numa biblioteca de uma universidade pública, logo eu sou frequentador dessa biblioteca. Tem bastante livros técnicos. Como o curso principal é Direito, então, está abarrotada de centenas de títulos defasados há tempos. Isso por si só, já afastam os alunos. Mas, se o aluno estiver interessado numa obra de literatura nacional ou estrangeira, algum clássico? Não encontrará um exemplar nem para se fazer um chá! Tem uma dezena de livros que foram doados e que por um acaso estão lá, É de doer o coração (foi lá que encontrei o livro A Barragem da autora sousense Ignês Mariz, que abordei recentemente, e pela ficha o último empréstimo dele foi em 2008). É sério. A quantidade de livro de literatura dá para encher uma caixa de sapato tamanho 36.
Tentando escapar dessa cadeia hereditária, estou lendo uma biografia de Stephen King escrita por Lisa Rogak, e o trecho que abre esse texto encontra-se nela. O homem lia ( e lê) não o tempo todo, mas em todo tempo. E como é isso? Não é ler as 24 horas do dia, mas ler no tempo que o dia permite. Folgas, filas, esperas, ônibus, descanso e por ai vai. O trecho que eu trouxe mostra ele lendo na fila do restaurante, com três livros diferentes, provavelmente, lidos simultaneamente. Isso numa época que não tinha zapzap, Facebook, Youtube, Netflix e seus similares... É fácil defender a ideia de que hoje fazer isso é mais difícil pois a quantidade de distração é enorme. Concordo. A necessidade de saber o que está acontecendo na casa do BBB é quase que cancerígena. Gera uma ansiedade que tem até quem tome remédio tarja preta quando a conexão da internet cai. Já um livro parece que não tem muita urgência que alguém o leia. Se hoje ou daqui a um ano, ele estará lá no mesmo canto a espera.
Voltando a falar dos universitários onde a minha digníssima trabalha. Em paralelo a biblioteca setorial a instituição tem contrato com uma biblioteca virtual que disponibiliza 1000 acessos por mês para os alunos. Os livros desatualizados da biblioteca física estão disponibilizados on-line fresquinhos, fresquinhos. Mensalmente o número de acesso é inferior à 5% do contrato, ou seja, menos de 50 alunos acessam o sistema em um universo de 1.000, isso apenas de direito.
Como um futuro advogado lê tão pouco? A leitura é porta pra interpretação de texto, desenvolvimento de vocabulário, do pensamento. Mas, aparentemente, boa parte dos universitários estão desprezando esses benefícios. Já os estudantes de administração, falo isso porque sou formado nessa delícia, se brincar não precisa nem ler os livros indicados nas disciplinas. Os professores resumem tudo e jogam no slide, que vem sendo requentado desde quando ele(a) iniciou a carreira de docente há quase trinta anos. Agora, que profissional é esse? Que visão de mundo essa criatura tem e terá enquanto profissional? Se perguntar a esse ser defecante (expressão usada pelo professor Clóvis de Barros Filho) o que é administrar ele vai repetir a boa e velha decoreba dos tempo de Taylor e Fayol: "administração é a ciência de planejar, dirigir, controla e executar". Se apertar mais um pouco, o suor frio desce e as palavras somem. Podem chamar o SAMU para o coitado. Mas, aos milhares somos formados lançados no mundo dos subempregos e da frustação.
Concluindo este meu pensamento, reafirmo o que escrevi mais acima, porque quando se fala que o brasileiro não lê imaginamos logo na população de retirantes, pés no chão, ou uma multidão de boias frias que faz da sua vida um eterno cortar de cana. Não. O "futuro" do brasil também não lê. Quem não lê não pensar, e quem não pensa só serve para ser massa de manobra, e isso vemos todos os dias.
Pronto, falei!
Adendo 1:
Na cidade de Sousa, temos a biblioteca do BNB, da Câmara Municipal, e não sei como anda a biblioteca municipal (se está aberta ou fechada), e temos a biblioteca do IFPB. Suponho que as três grandes escolas particulares da cidade também tenha suas bibliotecas, que embora privadas, atendam às demandas de seus alunos: Colégio Ação, Colégio Monteiro Lobato e Colégio Nossa Senhora Auxiliadora. Suponho que as escolas públicas da cidade também tenha um acervo mínimo à disposição de seus estudantes, bem, é o que eu quero acreditar. Fui estudante integral de escola pública e bem, não me lembro de biblioteca por lá. Se tinha, não era divulgado, era meio que uma sociedade secreta entre a poeira, as traças e o mofo.
Adendo 2:
O que salvou a lavoura foi a professora Azuíla, de português, que um dia levou para a sala de aula várias caixas cheias de livros. Isso foi na quinta série. Que Deus a tenha num bom lugar. Só por ter me apresentado o livro A Porta Mágica, de Haroldo Maranhão, ela devia ser beatificada. Primeiramente ela pediu que escolhêssemos um livro e que a cada semana trocássemos com um colega por um livro que ainda não tínhamos lido. A Porta Mágica foi o primeiro livro de literatura que li na vida. Depois eu li Matin Seco de Fernando Sabino, o primeiro a lê-lo foi meu colega Edvan Nazário. Depois eu Acúçar Amargo, de Luiz Puntel. Mas, o que me abriu o gosto pela leitura foi a minha primeira Bíblia, que ganhei do irmão Ozias. E as lições da Escola Dominical doadas pelo irmão Lauro. Obrigado a vocês pela chance que me deram de me apaixonar pelos livros.