Will

CRISE DE EXISTÊNCIA

 

 

São onze da noite.

 

Will me olha de forma instigadora. Eu tento entender mas não tenho tempo. Não há mais tempo. Um intervalo nos desliga.

 

Não nos conhecemos, nunca nos vimos, mas me deu o recado que devo levar.

 

 

Pego a chave do carro e abro a porta. Saio entre gritos que não cessam, enquanto ouço a música de Natal mais conhecida de todos os tempos.

 

Me aposso de todos os tempos que deixei, de todos os sons que flutuam, e sento na areia iluminada da praia do Posto 3.

 

Penetro no conteúdo do contêiner que navega sobre o cargueiro iraniano e descubro que não falo mandarim. Ele sai da baía e não sei seu destino.

 

Volto a nado. Ou nada.

 

Nas águas frias de um sal mariscado meus pés ficam cinzentos. Penso em fazer o relógio girar do avesso, e inverter o destino.

 

 

O meu destino, a barraca em frente.

Peço um hambúrguer e um guardanapo para secar a água salgada que o navio espirrou nos meus olhos.

 

Não sei o que faço aqui, não sei como cheguei,

mas a madrugada é oca.

E fria.

E luminosa,

pelo menos por aqui.

 

Uma se oferece, uma me pede,

outra me olha de longe.

Todos precisamos resolver nossas fomes.

 

Passa o primeiro ônibus da manhã e de dentro uma jovem de bela sonolência sequestra meu olhar.

 

Com certeza Will já dorme e não sabe de mim.

 

Pago a conta, com desejo de bom dia ao gari, e bocejo vagarosamente fitando o sinal que vai abrir.

 

Um novo,

talvez,

me espera depois do túnel.

 

 

Quem sabe, com um café.