Gosto peculiar
Somos uma pequena parcela da população, é verdade. A maioria de nós é a terceira idade ou algum jovem, escolhido a dedo, por esse tipo de gosto: acordar cedo.
Credo, mas para quê? Sei lá. Os senhores diriam que é para varrer calçadas, passear com os cachorros, correr no parque, ler o jornal. No meu caso já é porque acho que aproveito melhor o dia. Mesmo em tempo de quarentena? Sim. Isso porque não é nada motivacional acordar com as seis badaladas do relógio da igreja para, talvez, terminar a leitura ou tomar um bom banho pra seguir na igual faxina dos últimos dias.
Gosto do período matutino, minha gente. De manhã, tudo é mais fresquinho: o pão, a temperatura, as ideias loucas. Numa dessas conversas triviais, descobri que sou a única do meu ciclo de convivência.
É ironia do destino, eu acho; logo eu, que adoro ouvir os primeiros cantos dos galos e dos pássaros, se deixar acordo na metade do dia, incansável e irritada até: "poxa, perdi uma parcela do dia!"
E olha que muitas vezes nem é o relógio que me acorda, é a galinha gritando porque o cachorro está correndo atrás, outras vezes é a dor da cólica ou poucas das vezes é a preocupação de perder a hora.
De manhã a disposição é diferente, o sol é diferente, a magia é diferente; nesse tempo presente tem sido a salvação de quem quer ver a cara da rua: "amiga, saí pra buscar esse pãozinho porque não estou aguentando mais ficar em casa!"
Eu sei, entendo, de manhãzinha, antes das nove, não há muito o que se fazer, o que assistir, aonde ir; é satisfação pessoal, mesmo. Eu tenho gostos peculiares. Quais? Você não entenderia... Nem eu às vezes entendo!
Texto escrito no auge da pandemia, em 29/03/2020